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Dalton Miranda: Ativismo judicial pela solução de dúvida jurídica

28 de novembro de 2018, 5h47

Por Dalton Cesar Cordeiro de Miranda

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Inúmeros são os artigos — e não o deixarão de ser — reportando o protagonismo exercido pelo Supremo Tribunal Federal, seja na modalidade plenária, seja por atos monocráticos, prática esta bastante questionável.

Aliás, em algumas oportunidades teve a corte uma atuação que foi além de um ativismo voluntarioso, freado pelo próprio tribunal, como o verificado quando do julgamento da matéria referente à constitucionalidade do ensino domiciliar, em que a relatoria do tema pretendia de modo extravagante não só legislar sobre a matéria levada a exame do Pleno como também dizer aos legisladores como a questão deveria ser formalizada.

Em defesa desse protagonismo o próprio Supremo utiliza como argumento, mais das vezes, o fato de que há flagrante lentidão ou inércia por parte do Poder Legislativo em dar solução aos inúmeros pleitos sociais que estão a reclamar normatização.

Agora, é preciso reconhecer que protagonizar também tem seu lado positivo, como, aliás, aconteceu quando do julgamento de matéria com repercussão geral reconhecida, referente à extensão, observação e aplicação dos efeitos da imunidade tributária prevista no artigo 150, VI, "d", da Constituição Federal, também para os livros digitais.

E tal se deu sob o fundamento de que a “interpretação das imunidades tributárias deve se projetar no futuro e levar em conta os novos fenômenos sociais, culturais e tecnológicos”, isto com a finalidade de evitar o “esvaziamento das normas imunizantes por mero lapso temporal, além de se propiciar a constante atualização do alcance de seus preceitos”, apresentando uma interpretação evolutiva para o conceito de livro (RE 330.817, ministro relator Dias Toffoli).

Outra mensagem ainda empregada com a finalidade de dar embasamento a esse protagonismo reside na fundamentação de que “[o] Direito, a Constituição e o Supremo não podem ficar alheios às transformações, sob pena de assistirem passivamente a inocuidade das normas constitucionais ante o avanço dos fatos” (RE 595.676, ministro relator Marco Aurélio).

Tome-se boa nota, por relevante, que o exercício de tal protagonismo deu-se de modo positivo e de exaustiva maturação, contrário àquele realizado de rompante, em resposta à pressão de natureza política ou em atendimento a algum clamor das "ruas", pois, como já reportado acima, julgou-se matéria afeta ao rito da repercussão geral, ou seja, observando-se determinados requisitos antes de sua definição, tais como: os ritos processuais e regimentais; análise preliminar submetida a exame em plenário virtual; sistematização interna e externa de informações; tudo isso com a finalidade de “garantir a racionalidade dos trabalhos e a segurança dos jurisdicionados, destinatários maiores da mudança que” se operou com a solução da dúvida jurídica levada ao tribunal quanto à imunidade tributária frente ao novo conceito de “livros”.

A importância dessa antecipação protagonizada pela corte, realizada após a devida e aprofundada discussão do tema enfrentado, ficou ainda mais evidente quando se tem noticia de que na esfera do Poder Legislativo está em curso e em aprovação o Projeto de Lei do Senado 114/2010, tendo por escopo alterar a Lei 10.753/2003 para acrescentar na definição de livro os textos convertidos em formato digital, magnético ou ótico, inclusive os impressos em braille, com isenção para o material importado e imunidade “a novos produtos definidos como livros ou equiparados a livros”.

Como justificativa ao PLS 114/2010, propõe-se a necessidade de se considerar o avanço nas tecnologias de leitura eletrônicas perpetuadas e renovadas desde o século XX, bem como a necessidade de o país não ficar preso a um conceito defasado de “livro”.

Não obstante a lentidão com que a matéria legislativa tramita, a aprovação em definitivo desse projeto, e sua posterior conversão em lei, é de ser destacada não só porque se alinham os entendimentos dos poderes Judiciário e Legislativo, mas, também, porque se dá a devida segurança jurídica aos empreendedores e utilizadores desse novo conceito ampliado e evoluído de “livro”.