Opinião

O uso de ciência dados na estratégica jurídica das empresas

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23 de novembro de 2018, 5h00

O uso da Jurimetria e de robôs de automação na área do Direito tem gerado nos advogados uma reflexão: qual é o papel do profissional da advocacia mediante o uso da ciência de dados na estratégia jurídica das empresas? Esse questionamento é resultado de dois sentimentos observados nos advogados desde que é feita a aplicação real do uso da Jurimetria e de robôs de automação na área jurídica.

Um desses sentimentos é oculto. Refere-se ao temor despertado pela possibilidade de as novas tecnologias substituírem o trabalho dos advogados. O custo menor para desempenhar a mesma função, com uma qualidade maior, estaria no centro desse temor. De fato, a pesquisa jurídica e toda atividade sob responsabilidade do advogado que seja intensa em sua rotina podem ser substituídas por tecnologias que geram economia e são mais efetivas. Os advogados já entenderam esse movimento de substituição e para onde ele aponta: para os novos papéis a desempenhar.

O uso da tecnologia focada na ciência de dados e na inteligência artificial já deixa claro que o advogado e os demais tomadores de decisão da área do Direito podem mudar o modo de operação braçal e rotineiro para o campo do conhecimento baseado em dados. Já existem muitos conceitos e cases de aplicações reais de dados na estratégia jurídica das empresas. Isso desperta os advogados para novas possibilidades profissionais de atuação, que utilizam as novas tecnologias para complementar as funções advocatícias.

Um experimento nesse sentido foi feito durante o Fórum Lawtech, em outubro de 2018, sob minha condução e do especialista em Big Data, machine learning e inteligência artificial, Bruno Moreno. O objetivo era colocar em prática muitos dos conceitos discutidos em relação à ciência de dados e o seu uso no meio jurídico. Os participantes foram conduzidos à criação de uma segmentação de trabalho para um escritório de advocacia ou departamento jurídico a partir do levantamento de dados públicos. Uma segmentação era relacionada a acordos e outra, à defesa.

A intenção era indicar para a empresa, com alto nível de assertividade, em quais processos era melhor realizar um acordo com a parte reclamante. Ao fazer isso, cada departamento ou escritório pode definir suas próprias regras, considerando a probabilidade de ganho (alta ou baixa), a previsão da data de encerramento do processo, os pedidos e outros parâmetros.

Algo que ficou muito claro para todos os participantes é que essas regras e parâmetros são inevitavelmente qualificadas por um advogado. É ele quem determina — seja diretamente ou pela definição dos parâmetros inseridos por ele — se em um processo deve-se realmente fazer um acordo. Ele pode basear essa decisão na análise preditiva que levanta qual é o possível ganho de uma causa para a empresa ou para o respectivo cliente.

Um exemplo nesse sentido são os casos de overbooking. Empresas que lidam com essa questão podem buscar nos dados um direcionamento sobre a probabilidade de haver um ganho de causa ou ser mais econômico fazer um acordo. Muitas companhias, nesses casos, optam pelo acordo para não perder clientes e entender que o NPS® (Net Promoter Score, metodologia criada para avaliar a satisfação dos clientes) tem um peso maior do que ganhar o processo.

Uma análise preditiva pode apontar para esse caminho, em que a preservação da imagem e da reputação pode ser mais vantajoso para a empresa do que vencer o processo judicial. Esse é apenas um exemplo. Cada empresa é que define sua estratégia. A Jurimetria apresenta os dados que podem auxiliar na decisão sobre qual caminho seguir.

Parte do objetivo dessa junção é apoiar e complementar as limitações que existem na cognição humana por meio da tecnologia e deixar para os advogados as tarefas decisórias, que dependem de áreas em que a cognição humana se sai muito bem. Caso fosse preciso fazer uma divisão entre as competências da tecnologia e do advogado que está no centro da estratégia jurídica das empresas, seria:

– Tecnologias Advogado
– Atenção Criatividade
– Cálculo Abstração
– Memória Consequencialização

Nesse cenário, cabe às soluções sempre sugerir ou recomendar ações com base nos dados coletados. Aos advogados pertence a decisão de seguir ou não a recomendação e buscar outros caminhos, sempre com o apoio e suporte da tecnologia. Em outros setores, como a área médica, a relação entre profissionais da medicina e tecnologia já funciona dessa forma. E, de maneira semelhante, o advogado, agora, tem o papel estratégico de:

– Supervisionar e treinar as máquinas para que investiguem recomendações cada vez mais assertivas;
– Validar o sistema matemático que resulta na recomendação;
– Avaliar se as teses que se apresentam são aplicáveis ou não.

O resultado dessa interação são recomendações cada vez mais assertivas e um advogado livre para trabalhar nas questões mais fundamentais da prática advocatícia, como as relações interpessoais com clientes que as máquinas não são capazes de fazer.

O advogado que assimilar a cultura de ser guiado por dados e se tornar data driven tem maior chance de alcançar o êxito profissional. Nesse percurso, ter o suporte de uma empresa que seja referência em tecnologia e não uma simples desenvolvedora de software é essencial. Somente uma empresa conhecedora do ecossistema da Justiça terá o envolvimento necessário para realmente colaborar para que o escritório de advocacia e o departamento jurídico encontrem a melhor solução para o cliente.

 

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  • Brave

    é responsável pelo Laboratório de Ciência de Dados da Unidade da Justiça, da Softplan, conduzindo a elaboração de estudos e análises e desenvolvendo soluções baseadas em analytics, aprendizado de máquina, computação cognitiva e inteligência artificial.

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