Opinião

O controle externo das contas da OAB e a derrota da democracia brasileira

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22 de novembro de 2018, 16h06

* Este artigo foi produzido como parte da campanha da eleição da OAB-SP.

O plenário do Tribunal de Contas da União determinou, por unanimidade, que, a partir de 2021, fiscalizará as finanças da OAB. Embora não duvidemos da boa intenção de que reveste tal decisão, cuja relatoria se encarregou o ilustre ministro Bruno Dantas, é fundamental compreender seu perverso significado simbólico e político e a profunda derrota que impõe à democracia brasileira.

À primeira vista, o tema parece ser simples. Aos entusiastas da decisão do Tribunal de Contas da União, bastaria o argumento da transparência: a OAB deve prestar contas à semelhança dos demais conselhos profissionais. Aos contrários à decisão, por sua vez, bastaria invocar o entendimento do Supremo Tribunal no sentido de que a OAB não se submete ao controle do TCU.

Ambas posições, porém, negligenciam o verdadeiro significado da submissão da OAB ao controle do TCU. Para sabê-lo, é preciso recuar um pouco no tempo.

Em 1976 – durante a ditadura militar, portanto –, o então Procurador-Geral da República formulou uma representação para obrigar à OAB a prestar contas ao TCU. O professor Caio Mario da Silva Pereira, à época presidente da OAB, resistiu, de maneira altiva, contra tal medida.

Dois anos mais tarde, já sob a presidência do notável Raymundo Faoro e no contexto das negociações com a sociedade civil destinadas à redemocratização do país, a questão foi resolvida definitivamente por meio do parecer do consultor-geral da República afirmando a independência da OAB perante todo e qualquer órgão governamental.

Diante desta breve incursão histórica, assalta-nos, de imediato, a pergunta: por que os militares queriam o controle das contas da OAB e, por outro lado, por que os notáveis presidentes da OAB à época se opuseram, de maneira tão enfática, contra tal pretensão?

A resposta é óbvia: todo e qualquer controle externo sobre a OAB, ainda que travestido sob a bandeira incontestável da transparência, implica um atentado inadmissível contra a sua plena liberdade de atuação.

Ao contrário do que afirma o TCU, a OAB é realmente uma exceção e não deve ser equiparada aos demais conselhos profissionais. A sua elevada missão de defesa das liberdades e do Estado Democrático de Direito, prevista na Constituição, não pode ser de modo algum ameaçada.

A Ordem não pode estar vinculada, direta ou indiretamente, a qualquer governo. Pois se esse mesmo governo violar a Constituição Federal, a democracia ou os direitos humanos a Ordem tem que se voltar juridicamente contra ele.

Resulta que a decisão do TCU, para além de ilegal, constitui uma afronta gravíssima à democracia brasileira, na medida em que se cerceia uma das mais importantes e estratégicas instituições de defesa da cidadania. A um só tempo, pois, violou-se a Constituição Federal de 1988 e se profanou a memória de Raymundo Faoro.

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