Obstrução de Justiça

Fachin vota por receber denúncia contra Ciro Nogueira e Eduardo da Fonte

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7 de novembro de 2018, 10h33

O ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, votou pelo recebimento da denúncia contra o senador e presidente do PP, Ciro Nogueira (PI), o deputado federal Eduardo da Fonte (PP-PE) e o ex-deputado federal Márcio Henrique Junqueira (PP-RR).

Eles são acusados de embaraçar investigação de infração penal que envolva organização criminosa, crime previsto no artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/2013. O julgamento na 2ª Turma, no entanto, foi suspenso após pedido de vista da ministra Cármen Lúcia.

Em seu voto, Fachin analisou várias preliminares suscitadas pelos advogados de defesa, tendo negado todas. Por fim, ele entendeu haver, na denúncia por obstrução de justiça, base suficiente para autorizar a abertura da ação penal. "Como se pode concluir, os autos encontram-se instruídos com elementos de informação consistentes a fundamentar a tese acusatória".

De acordo com a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República, Ciro Nogueira e Eduardo da Fonte, por meio de Márcio Junqueira, ameaçaram, deram dinheiro, pagaram despesas pessoais, prometeram cargos públicos a José Expedido, testemunha de outros inquéritos envolvendo os três e ex-assessor parlamentar do senador. Com isso, José Expedito teria que alterar depoimentos prestados em 2016 à Polícia Federal.

Presidente do PP, Ciro Nogueira foi acusado, pela PGR, de pedir, em 2014, R$ 2 milhões ao então dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa. Em troca, segundo o Ministério Público Federal, o senador prometeu favorecer a empresa em contratos de obras pagas pelo Ministério das Cidades (controlado pelo partido à época) no Piauí.

Na denúncia, apresentada em 2016 com base na delação de Ricardo Pessoa, a PGR afirmou que Ciro Nogueira teria recebido ao menos R$ 1,8 milhão, parte em dinheiro vivo e parte por meio de um contrato fictício com um escritório de advocacia em Brasília. A 2ª Turma rejeitou a denúncia contra o parlamentar.

Em outro inquérito, Ciro Nogueira e Eduardo da Fonte, com outros dez parlamentares do PP, foram denunciados por organização criminosa. Os dois também são alvos de apurações feitas nos autos de um terceiro inquérito, que se trata de desmembramento deste.

As defesas tentaram desqualificar os depoimentos prestados por José Expedito e apontar a ausência de motivo para a denúncia diante do fato de que ele não chegou a alterar o depoimento que prestara anteriormente. Os advogados afirmaram, ainda, que não havia prova material para além dos relatos da testemunha, alguém que disseram se tratar de "figura inexplicável", já que não é delator, agente infiltrado ou sequer tenha sido também denunciado.

Fachin, no entanto, rechaçou as teses da defesa. Segundo ele, a análise aprofundada dos elementos de informação, em conjunto com as provas que serão produzidas no decorrer da instrução criminal, só ocorre no juízo de mérito da ação penal. Depois de alguns encontros entre José Expedito e Márcio Junqueira, o primeiro foi à Polícia Federal relatar ameaçar e pedir que fosse reincluído no programa de proteção à testemunha do Ministério da Justiça.

"A partir desse último episódio, os demais foram monitorados pela Polícia Federal, por meio de ação controlada, interceptações telefônicas e gravações ambientais autorizadas por esta relatoria, com base nos sólidos elementos de informação apresentados pela testemunha José Expedito e outros obtidos pela própria autoridade policial que corroboraram a veracidade das declarações, como, repito, cópias de bilhetes aéreos e a confirmação, junto ao Hotel Meliá em Campinas (SP), de que denunciado Márcio Junqueira também ali havia se hospedado no período indicado", apontou Fachin.

De acordo com ele, o resultado das diligências policiais também se mostrou apto a embasar a tese acusatória, no sentido de que Márcio Junqueira, nas abordagens, promessas e até ameaças feitas a José Expedito, atuava como preposto dos dois parlamentares.

Teses da defesa
Representando Ciro Nogueira, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, afirmou que a denúncia da PGR não citou sequer uma prova contra o senador e que o fato de a denúncia do primeiro inquérito ter sido rejeitada revela que as declarações de José Expedito são “inverídicas”. “Não se fala no nome do senador nas interceptações ambientais e telefônicas. A única menção expressa não tem a ver com obstrução da Justiça”, disse.

Ele levantou a questão do peso da palavra do delator para sustentar uma denúncia. Além disso, Kakay alegou que a denúncia não é individualizada, o que complica o trabalho da defesa. "É tudo no plural. As pessoas deixaram de ter identidade nessa sanha acusatória que vivemos", afirmou, na sustentação oral. "Não quero enfrentar apenas a questão de direito, mas a questão tática em homenagem a ele. o nome dele não é citado. são com esses fatos que vai se determinar a abertura do processo penal?".

Pierpaolo Cruz Bottini, advogado de Eduardo da Fonte, apontou que a conduta imputada ao parlamentar seria atípica e elencou uma série de razões pelas a denúncia deveria ser rejeitada. Dentre elas, como os inquéritos que poderiam ser afetados pela ação já tinham se tornado ações penais, não há embaraço de investigação.

"Seja atipicidade da indução à prática de um crime, impossível jamais cogitado; seja pela ausência da investigação em andamento, porque os dois inquéritos já tinham se transformado em ação penal; seja pela ausência de um ato de embaraço consumado, tentado ou meramente cogitado; seja pela presença de um flagrante preparado ou seja pela ausência de qualquer indício da participação direta e efetiva do parlamentar no caso, requer-se que seja rejeitada a denúncia", enumerou o advogado.

De acordo com Bottini, uma vez que o embaraço à Justiça neste caso se daria por meio de um falso testemunho, tem-se uma prática com um autor, um delito em que não é permitida coautoria. E, como Expedito tinha desde o início a orientação das autoridades, não cogitava obstruir, de fato, a Justiça. Seria, então, impunível a participação, se ela existisse, por indução por parte de Eduardo da Fonte.

O advogado Luis Henrique Machado fez a defesa de Márcio Junqueira. Ele defendeu a liberdade do ex-deputado, único deles preso preventivamente desde 24 de abril deste ano, depois de operação que também fez buscas nas residências e no gabinete do presidente nacional do PP e de Eduardo da Fonte. Em 6 de setembro deste ano, Fachin havia mantido a prisão em análise de pedido de revogação.

Clique aqui para ler o voto do ministro Luiz Edson Fachin.
Inq 4.720

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