"Discrepância injustificável"

TRF-4 não tem critérios para aplicar penas, afirma defesa de empresário

Autor

22 de março de 2018, 14h53

Como o Tribunal Regional Federal da 4ª Região não obedece a nenhum critério na aplicação das penas aos condenados da operação "lava jato", a execução da prisão deve esperar pelo menos pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça. De acordo com o advogado Antônio Sérgio de Moraes Pitombo, as penas para os mesmos crimes chegam a dobrar a depender do caso, mesmo que os textos das decisões sejam quase idênticos.

Tamanho das penas
por corrupção na "lava jato"
Agenor Franklikn 6,67 anos
Gerson Almada
(5083351-89.2014)
5,56 anos
Gerson Almada
(5045241-84.2015
6,67 anos
Léo Pinheiro 6,67 anos
Sérgio Cunha Mendes 7,33 anos
Rogério Cunha de Oliveira 7,33 anos
Alberto Elísio Vilaça Gomes 8 anos
Dario de Queiroz Galvão Filho 5,33 anos
Erton Medeiros Fonseca 4,44 anos
Jean Alberto Luscher de Castro 5,33 anos

Os argumentos estão em Habeas Corpus impetrado pelo advogado em nome de seu cliente, o ex-vice presidente da Engevix Gérson Almada. Ele começou a cumprir a pena por sua condenação na terça-feira (20/3), com base no entendimento do Supremo Tribunal Federal de que as penas podem ser executadas depois do fim da jurisdição de segunda instância.

A prisão foi determinada pelo juiz Sergio Moro após o TRF-4 julgar os recursos do empresário. Moro havia condenado o empresário a 19 anos de prisão por corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Ao julgar os recursos, o TRF-4 aumentou a pena para 34 anos e 20 dias de prisão em regime fechado.

De acordo com Pitombo, a motivação para aplicação da pena foi reproduzida em outros três acórdãos do TRF-4 na operação "lava jato". Mas a mesma argumentação levou a penas completamente diferentes.

Enquanto um dos réus teve a pena base pelo crime de corrupção ativa fixada em 4 anos, Almada teve a sua fixada em 5 anos, e o outro, em 6 anos. "Como é possível que a exata mesma fundamentação seja fornecida para a fixação de penas tão distintas, quantitativamente, umas das outras?"

A defesa de Almada apresentou, junto ao HC, parecer do matemático da USP Sérgio Weschler que concluiu haver "uma severa heterogeneidade entre as sanções penais aplicadas". O professor identifica variação de quase 100% entre a pena mais baixa e a mais alta da "lava jato".

Fora da "lava jato"
A defesa de Almada mostra ainda que as penas aplicadas na operação "lava jato" são bem maiores do que outras definidas pelo TRF-4 e até mesmo pelos tribunais superiores. 

Reprodução
No mensalão, José Dirceu foi condenado a quase oito anos de prisão por nove atos de corrupção ativa. Gérson Almada pegou 22 anos por ter cometido o mesmo crime quatro vezes, aponta Moraes Pitombo.

Um dos exemplos citados é a Ação Penal 470, o processo do mensalão, julgado pelo Supremo Tribunal Federal entre 2012 e 2013. O ex-ministro José Dirceu foi quem recebeu a maior pena por corrupção ativa, 7 anos e 11 meses de prisão, por cometer o crime nove vezes. Já no caso de Gérson Almada, o TRF-4 o condenou pelo cometimento de quatro delitos de corrupção ativa a 22 anos e 2 meses de prisão.

"Que sua pena seja mais que três vezes mais alta que a maior pena pelo crime de corrupção aplicada naqueles autos desafia não apenas a lógica, mas as mais basilares garantias constitucionais", diz Pitombo.

A desigualdade entre os dois processos, aponta o advogado, aconteceu também no crime de lavagem de dinheiro. Na AP 470, o empresário Marcos Valério recebeu a pena mais alta por ter praticado o delito 48 vezes: 6 anos e 2 meses de prisão. Almada, por sua vez, foi condenado a 8 anos e 4 meses por 31 atos.

Cartas na mesa
Pitombo utiliza ainda condenações do próprio TRF-4 para mostrar a diferença dada ao caso da "lava jato". O tratamento desigual, em sua opinião, está relacionado à pressão social. "Nunca antes houve, no Brasil, caso criminal acompanhado tão de perto, em seus detalhes, pela sociedade", afirma.

Almada é acusado de ter pagado mais de R$ 15,2 milhões em propina a ex-diretores da Petrobras para viabilizar a contratação de obras em ao menos quatro refinarias da estatal.

No Habeas Corpus, impetrado no STJ, Pitombo afirma que não pretende discutir a decisão do Supremo que permite a execução provisória da pena. O objetivo é mostrar que a condenação de seu cliente não pode ser executada antes de os recursos aos tribunais superiores apontando esse descompasso sejam analisados. 

O advogado diz não saber por que o tribunal age dessa forma, mas especula que a corte venha cedendo à pressão social — motivação não prevista em lei. "Os tribunais, em resposta às demandas criadas pela histeria social, flexibilizarem os parâmetros por eles próprios construídos, com o intento de impressionar os espectadores da persecução penal com penas que se aproximam à prisão perpétua", diz o advogado.

"Dolo intenso"
Para apoiar seus argumentos, a defesa de Almada anexou ao HC parecer do professor e ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr. No trabalho, ele afirma que os critérios adotados pelo TRF-4 contrariam a legislação. Um dos exemplos citados por Reale Jr. é o aumento de pena devido ao suposto "dolo intenso" de Almada.

"O dolo constitui dado integrante da ação delituosa e sua intensidade, maior ou menor, não pode ser uma razão em função da qual se reprova mais ou menos, não constituindo um referencial para se aquilatar a reprovabilidade", afirmou Reale Jr.

Clique aqui para ler o HC.
HC 441.408

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!