Trânsito em julgado

Cármen "tarda a pautar" ações sobre execução antecipada, diz Marco Aurélio

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20 de março de 2018, 11h58

A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, “tarda a pautar” as ações que discutem se a execução da pena de prisão antes do trânsito em julgado é constitucional. Quem afirma é o ministro Marco Aurélio, relator das duas ações, que pedem a declaração de constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal. O dispositivo proíbe a prisão antes do esgotamento da jurisdição, exceto em casos de flagrante ou aplicação de medida cautelar.

Nelson Jr./SCO/STF
"A ministra Cármen Lúcia tem uma bandeira que é popular. Mas não cabe observar bandeira por ser popular, cabe observar a Constituição", diz Marco Aurélio.
Nelson Jr./SCO/STF

“Decididamente, não dá para continuar como está”, comenta o ministro, em entrevista exclusiva à ConJur. A situação atual da corte, diz ele, “produz insegurança jurídica”. “Se dentro do Supremo divergimos, porque há ministro que julga em definitivo habeas sozinho, e outros que não, a distribuição ganha sabor lotérico."

Em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, Cármen Lúcia disse não ver motivos para pautar os processos. As ações discutem a questão de maneira abstrata, apenas por sua constitucionalidade. Na entrevista, a ministra insinuou que o mais correto seria o ministro Luiz Edson Fachin, relator de um Habeas Corpus preventivo contra a prisão antecipada, levar o caso em mesa, justificando-se pela urgência do assunto.

De acordo com a ministra, o Plenário do Supremo já se pronunciou três vezes a favor da prisão antecipada. Uma em fevereiro de 2016, quando foi firmada a tese, no já famoso Habeas Corpus 126.292. Outra no Plenário Virtual, quando o STF usou de um agravo em recurso extraordinário para reafirmar a tese – uma manobra, na visão do vice-decano. E outra nas ADCs, quando a corte negou o pedido de cautelar e reafirmou o entendimento.

José Cruz/ Agência Brasil
"Não há motivos" para pautar processos que tratam de execução da pena antes do trânsito em julgado da condenação, disse Cármen Lúcia, à Globo.
José Cruz/ Agência Brasil

Para Cármen Lúcia, pautar o mérito das ações agora seria “apequenar o tribunal”. Na opinião dela, levar o caso ao Plenário seria ceder a pressões que ela diz sofrer para virar o placar a favor de aguardar o trânsito em julgado, como manda o inciso LVII do artigo 5º da Constituição. “Apequenar o tribunal é negar jurisdição”, responde Marco Aurélio, à ConJur.

Segundo o ministro, nenhum desses pronunciamentos vinculam o tribunal. O primeiro, porque foi uma decisão em processo subjetivo, sem discussão de teses, mas resolução de um caso concreto. O caso do Plenário Virtual, porque afirmação de tese em repercussão geral não vincula o tribunal (“uma coisa é a discussão de ideias; outra é apertar um botão”, diz). E a cautelar nas ADCs por ter sido um julgamento “precário e efêmero”.

Ótica única
“Há de vir um pronunciamento nas declaratórias para esse pronunciamento ter efeito vinculante”, afirma Marco Aurélio. A rejeição de pedido de medida cautelar não produz “efeitos positivos”, explica o vice-decano do STF. “Julgando em definitivo os processos, aí, sim, e a maioria sempre vence, se terá uma decisão. E eu, por exemplo, se a decisão for de mandar prender, vou passar a observá-la.”

Marco Aurélio não é o único que pensa assim. O ministro Fachin vem dizendo que não pretende chamar o HC de Lula em mesa, sem que ele esteja incluído em pauta. O ministro Gilmar Mendes disse na segunda-feira (19/3), durante debate em São Paulo, que é importante que o Supremo rediscuta a matéria, mesmo que seja num processo subjetivo. O ministro Celso de Mello, decano e um dos que têm concedido liminares para impedir a execução antecipada, chegou a convocar reunião com os colegas para discutir uma saída para o problema, já que também é a favor de julgar a matéria.

Para o vice-decano, o episódio demonstra problemas com a gestão da pauta de julgamentos. Hoje o Supremo tem cerca de 700 processos prontos para ser julgados pelo Plenário, e cabe ao presidente decidir quais serão discutidos em cada sessão de julgamento. O problema é que isso também transforma o processo de pautar julgamentos num ato de vontade.

O ministro Dias Toffoli, próximo presidente do Supremo, já disse, em evento na FGV Direito SP, que pretende mudar o sistema da pauta de julgamentos. No debate, ele contou já ter convocado os ministros Luiz Fux, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso, que presidirão a corte depois dele, para discutir soluções duradouras para a pauta.

“Essa problemática da pauta precisa ser repensada”, diz Marco Aurélio, que presidiu o Supremo entre 2001 e 2003. “Temos que chegar a uma solução que não seja a ótica única, mas com a participação de todos. Não podemos é continuar como está, principalmente com uma resistência dessa”, diz o ministro. “Não há império. Todos os integrantes, inclusive o presidente, têm, acima, o colegiado.”

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