Imparcialidade necessária

Clamor público não pode orientar decisões da Justiça, afirma Dias Toffoli

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16 de março de 2018, 11h09

O ministro Dias Toffoli, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, afirmou a uma plateia formada por juízes criminais que "o clamor público definitivamente não deve ser o azimute a orientar uma decisão judicial".

Wilson Dias/Agência Brasil
Segundo Dias Toffoli, "clamor público definitivamente não deve ser o azimute a orientar uma decisão judicial".
Wilson Dias/Agência Brasil

O discurso, aplaudido pelos presentes, foi proferido durante a abertura do 2º Fórum Nacional de Juízes Criminais (Fonajuc), que este ano acontece no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, com o tema “Valorização da Magistratura e Efetividade da Justiça Criminal”.

Ao cobrar a imparcialidade dos juízes, o ministro lembrou que o objetivo do processo penal é verificar os fatos e a responsabilidade, respeitando as garantias individuais dos acusados.

O ministro também disse que o clamor social não pode orientar uma decisão judicial e lembrou que hoje, em muitos casos, os juízes criminais se tornaram o centro das atenções, por isso se espera deles uma firme atuação para concretizar esse ideal de Justiça.

A valorização da magistratura também foi abordada por Toffoli. De acordo com o jornal O Globo, o ministro criticou a articulação entre polícia, Ministério Público e Judiciário nos processos penais, além do que dita a Constituição Federal. Segundo ele, quando isso ocorre, é o Judiciário que diminui de tamanho.

"Num sistema acusatório, compete precipuamente à polícia investigar, ao Ministério Público acusar e ao juiz julgar com independência e imparcialidade. Quando essas três nobres funções, em vez de permanecerem constitucionalmente separadas, se amalgamam, o Poder Judiciário é que se diminui, se desveste de sua principal função, a tutela dos direitos e garantias fundamentais", disse.

"Se você quer aplicar a lei, é chamado de fascista"
Outro ministro do STF que participou da abertura do Fonajuc foi Alexandre de Moraes. Ele criticou expressamente linha de pensamento no Judiciário em favor do réu: “se você é molenga, é amado pela mídia e é progressista”. Por outro lado, Moraes declarou que, “se você quer aplicar a lei, você é, no mínimo, chamado de fascista”.

Para o ministro, essa postura ainda é reflexo dos “traumas” acumulados ao longo dos períodos em que o país viveu sob ditaduras. Segundo ele, após 30 anos de vigência da atual Constituição Federal, é preciso reorganizar o sistema de Justiça para enfrentar com prioridade o crime organizado.

Wilson Dias/Agência Brasil
"Há uma necessidade de mudança de mentalidade. Se não houver, infelizmente, podemos ter alguns picos de melhora, mas vamos voltar pra UTI", afirmou Moraes.
Wilson Dias/Agência Brasil

“Nenhuma das garantias constitucionais impede a aplicação da lei. Não há nada em relação a isso [na Constituição]. O Brasil virou uma bagunça”, reclamou, ao comparar o país com nações como Inglaterra e os Estados Unidos.

Nos dois países, segundo o ministro, qualquer manifestação popular tem de ser solicitada com alguns dias de antecedência e não pode incluir trajetos que passem nas proximidades de escolas e hospitais. “No Brasil pode quebrar tudo. Isso porque a legislação não é aplicada, fomos nos tornando ineficientes na aplicação.”

Em breve comentário sobre o assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (Psol), ocorrido na noite de quarta-feira (14/3), crime classificado por ele como “bárbaro”, Moraes argumentou que não adianta mudar a legislação para aumentar as penas.

“Há uma necessidade de mudança de mentalidade. Se não houver, infelizmente, podemos ter alguns picos de melhora, mas vamos voltar pra UTI. Precisamos da valorização da Justiça Criminal”, observou, ao enumerar os mais de 100 mil roubos e 60 mil assassinatos que ocorrem no país por ano.

O ministro reclamou da forma como o Poder Judiciário se organiza no país para processar e julgar os mais diversos crimes. “Em São Paulo, temos o maior fórum criminal da América Latina. São 32 varas e 64 juízes, mas os 64 juízes não se comunicam, não trocam informações, não usam inteligência para verificar atuações de quadrilhas organizadas”, criticou.

Para o magistrado, é preciso estabelecer prioridades. “Todo dia, estão julgando roubos de celular, mas quantas quadrilhas de receptação são presas? Milhares de microtraficantes são presos todos os dias, mas quantos médios e grandes são presos por ano?”, questionou.

Moraes afirmou ainda que vai apresentar uma proposta para mudar o atual sistema de progressão penal, que, segundo ele, favorece a impunidade contra “quadrilheiros pesados”. Ele citou casos de assaltantes de bancos, que podem ser condenados por crime de roubo qualificado e mudar de regime fechado para o semiaberto em cerca de 11 meses.

O ministro disse também que é necessário conceder ao juiz a autoridade para quebrar o sigilo das comunicações de aplicativos de celular, principal meio utilizado atualmente pelo crime organizado. "É o momento ideal se dar um avanço nisso." Com informações da Agência Brasil.

* Texto atualizado às 18h20 do dia 16/3/2018 para acréscimo de informações.

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