Opinião

Enquanto o mundo discute soluções para o futuro, Brasil se debate com o passado

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12 de março de 2018, 16h09

*Artigo originalmente publicado na edição desta segunda-feira (12/3) do jornal O Globo, com o título "Vamos mudar de assunto?"

Tem hora em que o Brasil parece estar parado, tentando se desvencilhar de problemas do século passado, como a segurança pública, que já deveria há muito tempo ser problema resolvido. Ou como a corrupção, que agora nos impede de olhar para outro que não seja o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como se ele fosse o maior ladrão da história deste país. Não é. Embora Lula não seja inocente, há outros ex-presidentes que o deixam no chinelo quando se trata do usufruto ilegal do alheio coletivo.

Mas não tem jeito, é sobre isso que falamos todos os dias. Na corrida eleitoral que se aproxima, estrategistas e analistas dizem qual o caminho a seguir. Todos, sem exceção, reiteram que vencerá quem se mostrar verdadeiramente novo. Quem abolir o figurino do político tradicional e trouxer “rajadas de ar fresco” para a política.

Claro que o brasileiro está mesmo de saco cheio do perfil do político tradicional. Liga-o a imagens de tipos como Eduardo Cunha e José Dirceu. Olha para o político veterano e vê a “lava jato”. Estes analistas, estrategistas e marqueteiros pintam o novo como saída única, mas não cessam de falar e demonstrar medo do velho. Por isso o assunto é Lula, Temer, corrupção e segurança pública.

Ninguém fala de inovação. Não se ouve um pio sobre novas tecnologias. Nada sobre pesquisas. Enquanto o resto do mundo debate alternativas para o futuro da humanidade, no Brasil nos debatemos com o passado. Estamos atolados num tempo que se recusa a passar. O que o Brasil precisa imediatamente é mudar de assunto. Para ajudar nesta reflexão, segue uma lista de temas que poderiam contribuir para mudar o foco da nação brasileira:

1) Passa da hora de o Brasil se debruçar e discutir seriamente uma política nacional para os combustíveis alternativos não fósseis. E esta é a melhor janela que temos. No momento em que a Petrobras bate recordes na exploração de petróleo, com os poços do pré-sal produzindo muito e a custos bem abaixo do que os inicialmente projetados, por que não debater em todos os foros possíveis energias eólica e solar? Na Europa, algumas cidades já estabeleceram data limite para a circulação de carros movidos a gasolina e óleo diesel.

2) O envelhecimento da população no Brasil só é olhado do ponto de vista econômico. Na discussão da reforma da Previdência, o que se ouviu foi que a população brasileira está vivendo mais e vai consumir por mais tempo dinheiro recolhido ao INSS. É grave, sem dúvida, e trata-se de questão urgente para ser resolvida. Também é verdade que ele vai gastar mais em hospital e remédios. Mas quando falamos sobre a qualidade de vida dos velhos? Sobre a felicidade e a solidão dos idosos? Nenhum grupo de trabalho foi montado no governo ou no Congresso para discutir o assunto.

3) Em cinco anos, de 2013 até o final de 2018, a receita do trabalho feminino no mundo terá crescido 40%, de 13 trilhões para 18 trilhões de dólares. Ainda assim, as mulheres brasileiras receberão ao final deste ano em média 25% a menos do que os homens para fazer o mesmo trabalho. E quem discute isso no Brasil? As mulheres e quase só as mulheres. Se não fossem elas, o tema não frequentaria sequer as páginas dos jornais. As mulheres provocam o assunto sempre, mas todos deveríamos nos envolver com a questão.

4) Transportes. É incrível como patinamos nesta área. Perdemos bilhões de reais e dezenas de milhares de vidas a cada ano porque nosso transporte está baseado em rodovias. Rodovias caindo aos pedaços. Na África, pasmem, já corre um trem de alta velocidade ligando Tanger a Casablanca a 320 quilômetros por hora. E no Brasil, que não leva isto a sério, nós temos uma empresa estatal para tratar de um trem bala que nunca saiu do papel.

5) A inteligência artificial está no dia a dia das pessoas. Está presente quando o cidadão faz compras pelo seu telefone, quando escolhe um filme na Netflix ou compra um livro na Amazon, por exemplo. Você pode não saber o que quer ler depois, mas a Amazon sabe e vai te orientar. A inteligência artificial, dependendo do volume de interações digitais que uma pessoa faz ao longo do dia, pode saber melhor que esta mesma pessoa o que ela gostaria de fazer a seguir. Segundo a revista Forbes, até 2030 a inteligência artificial vai movimentar US$ 15,7 trilhões na economia global.

Está na hora de a gente olhar para essas coisas, não acha?

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