Opinião

Bom desempenho de Lula nas urnas pode eleger Bolsonaro em primeiro turno

Autor

  • Ricardo Penteado

    é membro do IDPE – Instituto de Direito Político e Eleitoral membro do Iasp – Instituto dos Advogados de São Paulo e advogado especialista em Direito Eleitoral

11 de março de 2018, 11h00

*Texto publicado originalmente na edição deste domingo (11/3) da Folha de S.Paulo.

Existe a possibilidade de que a candidatura de Lula ajude a definir a eleição no primeiro turno com um presidente eleito por menos de 25% do eleitorado brasileiro.

Ao que tudo indica, Lula deve requerer seu registro de candidatura junto ao TSE.

É direito seu defender a sua elegibilidade e participar do pleito durante o processo judicial, podendo, segundo o artigo 16-A da Lei 9.504/97, “inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição, ficando a validade dos votos a ele atribuídos condicionada ao deferimento de seu registro por instância superior”.

Ocorre que, a despeito dos votos que obtenha, a participação de Lula termina no primeiro turno e ele não conseguirá chegar ao segundo sem um registro definitivo.

É o que diz a Constituição: “Será considerado eleito presidente o candidato que, registrado por partido político, obtiver a maioria absoluta dos votos, não computados os em branco e os nulos” e “se nenhum candidato alcançar maioria absoluta na primeira votação, far-se-á nova eleição …, concorrendo os dois candidatos mais votados e considerando-se eleito aquele que obtiver a maioria dos votos válidos”.

Assim, se depois do primeiro turno Lula não estiver registrado, seus votos serão considerados nulos e, como manda a Constituição, não serão computados para a proclamação do eleito ou dos concorrentes no segundo turno.

O inusitado disso é que quanto mais sucesso Lula venha a fazer junto ao eleitorado, menos votos precisam ter os demais candidatos para uma eventual definição do eleito no primeiro turno.

A conta é fácil: se a eleição se define apenas com votos válidos, desprezados os nulos e brancos, quanto mais votado venha a ser Lula maior será o número dos votos nulos e menor será a base de cálculo para a definição do vencedor no primeiro turno, dentre os candidatos registrados.

Considerando os números da eleição de 2014, tem-se o seguinte: o eleitorado brasileiro era composto de 142.822.046 eleitores. Compareceram 115.122.883, dos quais 104.023.802 apresentaram votos válidos e 11.099.081 apresentaram votos nulos ou em branco.

Assim, em 2014 a eleição teria se definido no primeiro turno se um candidato obtivesse 52.011.902 votos, correspondentes a pouco mais que 50% dos válidos ou a 36% do eleitorado brasileiro.

No último Datafolha, o petista tinha a preferência, num dos cenários, de 36% dos votos válidos; na segunda colocação estava Jair Bolsonaro (18%), à frente de Geraldo Alckmin (7%), Ciro Gomes (7%) e de Alvaro Dias (4%), dentre outros.

Aplicado esse percentual do petista ao último pleito, a pesquisa revela que Lula obteria 37.448.569 de votos, de modo que o número de válidos cairia de 104.023.802 para 66.349.996. Nesse caso, o candidato que obtivesse 33.287.618 de votos seria eleito no primeiro turno.

Teríamos, portanto, um presidente eleito com minguados 33,2 milhões de votos ou 23,3% de todo o eleitorado brasileiro.

Constata-se um paradoxo: quanto melhor venha a ser o desempenho do candidato de esquerda, maior será a chance do candidato de direita — considerados os dois primeiros colocados no Datafolha.

Resta uma incômoda indagação: que legitimidade terá um presidente eleito por apenas 23,3% do eleitorado, num país que se encontra tão desorganizado e dividido na sua política interna?

Em suma, o preço da candidatura de Lula transcende a autoafirmação de seus valiosos direitos — essa conta pode onerar a todos os brasileiros.

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    é membro do IDPE – Instituto de Direito Político e Eleitoral, membro do Iasp – Instituto dos Advogados de São Paulo e advogado especialista em Direito Eleitoral

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