Opinião

TJ-SP abre caminho para a recuperação judicial de produtor rural

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23 de maio de 2018, 16h35

O Tribunal de Justiça de São Paulo avançou e mostrou, recentemente, que encara o produtor rural como empresário de fato, apto a fazer recuperação judicial, mesmo sem registro há dois anos na Junta Comercial. É preciso, primeiramente, salientar que a recuperação judicial no agronegócio, setor que responde por 30% do PIB brasileiro, ganhou uma nova forma de ser vista por um tribunal estadual.

A decisão do TJ paulista, publicada no dia 11 no Diário Oficial, trata do Agravo de Instrumento 2251128-51.2017.8.26.0000. A corte reconheceu que 14 produtores rurais podem participar de recuperação judicial. Vale ressaltar que, nos últimos 13 anos, tempo de vigência da Lei de Recuperação de Empresas, 5.359 empresas da indústria, comércio e prestação de serviços ajuizaram pedido de recuperação judicial. Mas o cenário não inclui o produtor rural, pessoa física, responsável pelo mencionado percentual de 30% do PIB do Brasil. Este estava até agora alijado no contexto. E tudo isso pelo questionável fundamento de não possuir registro na Junta Comercial há pelo menos dois anos — não importando que fosse empresário há bem mais tempo.

A responsabilidade sempre foi atribuída a uma formalidade burocrática para justificar que produtor rural não seria empresário, mesmo com a reconhecida importância deste para a produção do país. O pior é que, para manter a alegação, a culpa foi atirada também no próprio produtor rural — que, em tese, teria juros mais baixos para plantar. Isso no país com os juros mais altos do mundo.

Vale lembrar que o financiamento da safra faz com que 40% da produção agrícola atual não consiga pagar sequer o serviço da dívida. Seria como trabalhar 24 horas, sabendo que o custo exige 25 horas de trabalho por dia. Pronto, não fecha a conta. Mas, ignorando os fatos, é possível continuar nesse cenário injusto para o produtor rural.

É importante mencionar que o Senado Federal aprovou, recentemente, o Projeto de Lei 285/2011, que permite o requerimento da recuperação judicial sem apresentação de certidões negativas de débitos tributários. Isso até é um ponto importante para devedores que são microempresa e empresa de pequeno porte. No entanto, o que isso muda para o produtor rural no caso em questão? O projeto de lei não abrangeu esse problema específico de produtores rurais sem registro na Junta Comercial há dois anos. Eles continuaram a ser ignorados, assim como em outras propostas legislativas.

O Tribunal de Justiça de São Paulo precisou tomar essa decisão para apontar novos caminhos possíveis. De agora em diante, há esperança de que magistrados de outros tribunais estaduais tenham maturidade para encarar esse problema de frente. Produtor rural é empresário sem nenhuma dúvida. Por isso, deve submeter-se aos mesmos procedimentos que qualquer empresário — com todos os ônus e bônus. O conceito de empresário nos casos de produtores rurais deve ser ampliado, e não restrito.

Há oito anos, o TJ-SP negou esse direito a fazendeiros de Palmital (SP). Com essa nova e mais madura posição, a corte puxou a locomotiva do progresso. Os produtores rurais, finalmente, foram equiparados a empresas industriais — muitas vezes as mesmas que, por estarem em recuperação judicial, causaram a crise financeira para eles.

A mudança é fundamental para a recuperação judicial dentro do setor de agronegócios. Desde 2013, com o voto da ministra Nancy Andrighi, no REsp 1.193.115/MT, o assunto não encontrou nos tribunais estaduais um desfecho de tamanha relevância. Por acaso do destino, o voto condutor baseou-se também na tese intermediária defendida pelo ministro Sidnei Beneti, no mesmo REsp. O entendimento foi o de que havia necessidade de registro do produtor rural na Junta Comercial. Contudo, esse registro poderia ser feito até um dia antes do ajuizamento do pedido de recuperação judicial.

A expectativa, de agora em diante, é que todos os tribunais estaduais do país passem a adotar a tese do TJ de São Paulo. Afinal, o produtor rural precisa de um sistema legal para reestruturar suas dívidas. E, mais do que isso, seguir em frente.

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