Sete décadas

Precisamos tomar partido porque vivemos dias sombrios, diz Ricardo Lewandowski

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7 de maio de 2018, 21h58

Spacca
O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, foi homenageado na noite desta segunda-feira (7/5) em jantar com acadêmicos, advogados e desembargadores, em São Paulo. Ele completará 70 anos na próxima sexta-feira (11/5).

Além dos abraços e brindes, o evento acabou sendo um espaço de análise sobre os tempos atuais. “Em breve comemorarei 70 anos de idade. É uma idade repleta de experiências e, nesse sentido, quero dizer que sou daquela geração que nasceu no pós-guerra. Uma geração que o mundo não era um dado, mas era algo a ser construído”, afirmou Lewandowski.

“Um planeta destruído pela guerra, que tinha saído dos mais terríveis genocídios que a humanidade jamais tinha visto. Era um momento em que as pessoas, sobretudo jovens, tinham que tomar uma posição em relação às coisas do mundo. Não era possível, como muitos fazem hoje, ficar em cima do muro”, declarou.

O ministro afirmou que as pessoas não podem se comportar como meros consumidores. “Nós precisamos voltar a ser cidadãos, a tomar parte na política, a defender o Estado Democrático de Direito, as garantias fundamentais que estão na Constituição, sejamos nós advogados, juízes, jornalistas ou profissionais de outras áreas. Precisamos tomar partido porque hoje vivemos dias sombrios, difíceis. Temos que tomar partido nesta luta”.

Carlos Moura/SCO/STF
Lewandowski foi homenageado com jantar em São Paulo, nesta segunda (7/5).

“Este é o momento em que é preciso que sigamos sem nenhum temor as bandeiras do Estado Democrático de Direito que generosamente foi construído pelos constituintes de 1988. Não há nenhuma possibilidade de recuo”, declarou o aniversariante.

O jantar em São Paulo reuniu mais de cem convidados. Entre os que compareceram estavam o presidente do Tribunal Regional Eleitoral, Carlos Eduardo Cauduro Padim; o ex-presidente do TJ-SP Paulo Dimas Mascaretti; o ex-presidente do STJ, ministro Cesar Asfor Rocha; o professor e ex-governador Cláudio Lembo; advogados eméritos como Arnoldo Wald, José Rogério Cruz e Tucci, Alberto Toron, Heleno Torres, Ricardo Tosto, Celso Mori, Técio Lins e Silva, Sérgio Renault, Pierpaolo Bottini, José Antonio Fichtner e Gamil Föppel; o diretor da Faculdade de Direito da USP, Floriano Azevedo Marques, e outros grandes nomes do Direito.

O primeiro a discursar foi o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, também com análise sombria: “Estamos vivendo um período em que a ruptura constitucional pode acontecer. E não pense que a ruptura institucional deve ser atribuída apenas às Forças Armadas ou à classe política. Há outras instituições que podem provocar a ruptura institucional. Eu temo muito, ministro, com o coração na mão, com a amizade e sinceridade que sempre pautaram o nosso relacionamento, eu temo muito pela ruptura provocada pelo Poder Judiciário", disse Mariz sob aplausos.

Em seguida, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Manoel Pereira Calças, relembrou a trajetória do ministro Lewandowski ressaltando suas decisões ao longo da carreira. “Diversos acordos de sua lavra tornaram-se jurisprudência consolidada, como a questão das cotas e a proibição do nepotismo”, comentou o presidente.

“Não posso deixar de enfatizar a honra que eu tenho de ser seu colega nas Arcadas de São Francisco. Participamos da mesma congregação, e é algo que me deixa extremamente feliz por poder, ao seu lado, tentar transmitir às futuras gerações os direitos constitucionais, as garantias e liberdades, como o direito ao contraditório e à ampla defesa, para que, no futuro, outros Lewandowskis venham tanto para as arcadas quanto para a Suprema Corte”, concluiu Pereira Calças.

Perfil
Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, Enrique Ricardo Lewandowski é formado em Ciências Políticas e Sociais e Ciências Jurídicas e Sociais. É mestre, doutor e livre-docente em Direito do Estado pela Faculdade de Direito da USP.

Foi conselheiro da seção paulista da Ordem dos Advogados e secretário de Governo e de assuntos jurídicos de São Bernardo do Campo. Em 1990, ingressou na magistratura e logo foi promovido a desembargador do Tribunal de Justiça paulista. Lá integrou as seções de Direito Privado, Direito Público e o Órgão Especial. Também foi vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (1993 a 1995).

Foi nomeado em 2006 para ocupar cadeira no Supremo, onde relatou em inúmeros processos, como cotas raciais no ensino público, proibição do nepotismo e reconhecimento da competência do Judiciário para determinar reformas em presídios. No CNJ, costurou a implantação pelo país das audiências de custódia — iniciativa que garante ao preso em flagrante o direito de ser ouvido por um juiz em até 24 horas.

Compareceram à homenagem também os advogados Marco Aurélio de Carvalho; o presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa Fábio Tofic Simantob; José Luís de Oliveira Lima, Cecília Mello, Orestes Fernando Quércia, Daniel Bialski, Eduardo Carnelós, Jarbas Machioni, Manoel Carlos de Almeida, Davi Tangerino, Carlos Teixeira Leite Filho, Joel Thomaz Bastos, Mario de Oliveira Filho, Patrícia Rios, Alessandro Acayaba Toledo, Roberta Rangel, André Ramos de Tavares, Fernando Fernandes, Luciana Lóssio, Rogério Taffarello, os desembargadores Paulo Alcides Amaral, José Franco de Godoi, Luís Fernando Camargo de Barros Vidal; o diretor da FGV, Sidney Gonzales; e os familiares do ministro: sua mulher Yara de Abreu e os filhos Ricardo e Enrique.

Leia declarações da comunidade jurídica sobre o ministro Lewandowski:

Celso de Mello, decano do STF
“Fico extremamente feliz em associar-me à justa comemoração do aniversário do eminente ministro Ricardo Lewandowski, que associa à sua condição de magistrado da mais Alta Corte de nosso país À honrosíssima posição de professor titular de minha alma mater, a histórica e veneranda Faculdade de Direito do Largo de São Francisco!

O eminente ministro Lewandowski, juiz brilhante e doutrinador respeitado, autor de importantíssimos votos e construtor de relevantíssimos precedentes no Supremo Tribunal Federal, é a melhor e a mais conspícua demonstração de como foi sábio o Congresso Nacional ao promulgar Emenda à Constituição elevando o limite etário da aposentadoria compulsória [para 75 anos]! Receba o ministro Ricardo Lewandowski os meus cumprimentos e os melhores votos de plena felicidade pessoal, profissional e familiar!”

Claudio Lamachia, presidente do Conselho Federal da OAB
“O ministro Ricardo Lewandowski merece nossas homenagens e reconhecimento pela sua história e compromisso com o Estado Democrático de Direito. Magistrado com alma de advogado, foi conselheiro da OAB SP e ingressou na magistratura através do quinto constitucional, pela classe dos advogados.”

Nabor Bulhões, advogado
“Trata-se de notável humanista, professor e jurista que, como ministro da Suprema Corte, parece nunca ter feito da vida, do patrimônio e da liberdade de seus jurisdicionados a sua rotina. Mas não só. Em tempos de crescente populismo judicial e de preocupante publicidade opressiva sobre os tribunais, ele não tem abdicado de um dos maiores predicados de um verdadeiro Juiz— sempre decidir as causas sob sua jurisdição com respeito aos direitos fundamentais e, acima de tudo, com a coragem de suas convicções.”

José Luís Oliveira Lima, advogado
“O ministro Ricardo Lewandowski é um magistrado na verdadeira acepção da palavra, com M maiúsculo. Culto, sereno e corajoso nos momentos importantes que um julgador tem que se posicionar perante a sociedade. Deixou saudades em São Paulo quando assumiu o STF, mas foi na Corte maior que seus votos se tornaram ainda mais referência no meio jurídico.”

Fernando Scaff, advogado
“Muito antes de ser ministro, o professor Lewandowski já se destacava na defesa intransigente dos direitos humanos em todas suas dimensões, e levou tal preocupação humanitária para o STF, o que engrandece aquela corte e dela aproxima as legítimas reivindicações acadêmicas.”

Sérgio Bermudes, advogado
“Destaca-se o ministro Ricardo Lewandowski pela consistência dos seus votos, que mostram a sua cultura, o seu compromisso com a jurisdição, a sobranceria das suas atitudes, de quem não corteja a volátil opinião pública mas exerce a sua função de juiz: julgar." 

Eduardo Ferrão, advogado
Lamento muito não poder comparecer à justa homenagem ao ministro Lewandowski, de quem o Brasil e os jurisdicionados têm muito a se orgulhar. A altivez, a dignidade, a independência e a coragem de Sua Excelência, ao tempo em que incomodam aos abutres das liberdades e das franquias constitucionais, mantêm  acesa a chama da trincheira de resistência ao arbítrio e à prepotência. Como diriam meus conterrâneos lá da fronteira Brasil/Uruguai, no seu simples linguajar dos pampas, “esse é um Juiz de verdade!”.

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