Tese da exclusividade

"Se eu fosse advogado, não fecharia delação com a polícia", diz De Grandis

Autor

27 de junho de 2018, 9h27

O procurador da República Rodrigo De Grandis avalia que delegados de polícia não são competentes para conduzir acordos de delação premiada por conta própria, sem apoio do Ministério Público, por conhecerem pouco sobre a Lei do Crime Organizado (12.850/2013).

Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter reconhecido a legalidade dessa prática no dia 20 de junho, Grandis afirmou nesta segunda-feira (25/6) que “a autoridade policial não poderia realizar essa negociação isoladamente por uma questão muito simples: não é parte na relação processual relacionada a uma ação penal, não pede pena, não pede regime carcerário, não exerce titularidade de pretensão punitiva como exerce o Ministério Público”.

MPBA
De Grandis nega corporativismo, mas diz que nem polícia nem Judiciário podem interferir em delações premiadas.
MP-BA

O integrante do MPF participou de uma reunião da Comissão de Estudos sobre Corrupção, Crimes Econômicos, Financeiros e Tributários do Instituto dos Advogados de São Paulo.

A conversa com os advogados Miguel Pereira Neto e Rogério Taffarello tratou da Orientação Conjunta 1/2018, expedida pelo MPF na tentativa de fixar diretrizes para a condução de acordos de delação premiada em instâncias locais.

De Grandis falou como um dos colaboradores do manual, reconhecendo lacunas e manifestando opiniões sobre a aplicação do instituto. “Se cada membro do MPF adotar um procedimento diverso para realizar a colaboração premiada, o instituto perde em credibilidade e em segurança jurídica”, afirmou o procurador.

Como a orientação foi elaborada antes do julgamento do STF sobre os órgãos policiais, o texto define que é exclusividade do Ministério Público celebrar acordos com delatores.

De Grandis entende que esse entendimento é o correto, negando interesses próprios da classe. “Aqui não há qualquer tipo de corporativismo, mas a distinção em que tange à particularidade e às minucias das cláusulas é gritante”.

Isso porque, segundo o procurador, a falta de poderes para estabelecer penas faz a polícia fechar acordos genéricos. “É extremamente temerário um advogado assinar o acordo exclusivamente com a polícia. Certamente, se eu fosse advogado, não assinaria.” “Em quais circunstâncias ficariam o seu cliente durante essa situação de indefinição?”, indagou diante da plateia de advogados.

Para Miguel Pereira Neto, alguns pontos da Orientação Conjunta afrontam as prerrogativas da defesa e da advocacia. O presidente da comissão cita como exemplo o fato do MPF assumir a possibilidade de exigir a substituição do advogado do colaborador, bem como a exclusividade em realizar colaborações, contra o que definido pelo STF.

Interferência do juiz
De Grandis avalia que até o poder do juiz é limitado: para ele, a sentença deve se ater às cláusulas combinadas, só podendo alterar o trato caso a medida beneficie o delator. “Se existir a possibilidade de mudança por parte do juiz que profere a sentença, isso vai diminuir o grau de segurança jurídica que motiva o acordo de delação premiada.”

“A única solução possível para a preservação da identidade, do espírito e da essência do acordo de delação premiada, enquanto instrumento de negociação processual, é que o juiz ao proferir a sentença, se quiser mudar o que foi estabelecido de colaboração, só poderá fazê-lo em benefício do colaborador”, declarou.

Manual para advogados
O presidente da comissão de estudos sobre corrupção, Miguel Pereira Neto, afirmou que o Iasp estuda enviar à Ordem dos Advogados do Brasil proposta de um “manual” para os advogados que se defrontam com a necessidade de realizar uma delação premiada — nos mesmos moldes da orientação aos membros do MP.

“Tudo se transformou nessa nova fase do processo penal que estamos vivendo. Vemos hoje uma situação não tão nova, mas passível de ajustes. Desde o recebimento dos honorários pelos advogados, até questões como o fato do advogado ter que substituir o seu patrono, por exemplo, que está em uma das cláusulas da orientação do Ministério Público”, disse Pereira Neto.

O presidente da Comissão afirma que alertou a OAB em virtude da necessidade de se manifestar em questões relevantes, inclusive sobre o aumento de medidas contra escritórios e violações às garantias processuais.  

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!