Boa-fé

Cobrança de benefícios da desaposentação pelo INSS é ilegal, dizem especialistas

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21 de julho de 2018, 7h16

Quem teve o direito a receber os benefícios da chamada desaposentação reconhecido por decisão judicial não deve devolver o dinheiro. O alerta vem sendo feito por especialistas em Direito Previdenciário depois que o INSS começou a intimar aposentados a devolver o benefício com base na decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou a prática inconstitucional.

Desaposentação foi o nome dado à prática de, depois de aposentado, voltar a trabalhar e a contribuir com a Previdência para conseguir um benefício melhor com uma "segunda aposentadoria". Em outubro de 2016, o Supremo declarou que esse direito não está previsto em lei e por isso não pode ser exercido. Portanto, aumentar o valor do benefício com uma nova aposentadoria seria inconstitucional enquanto o Congresso não regulamentasse o direito.

Quase dois anos depois, STF ainda tem embargos de declaração para julgar contra o acórdão. Entre as questões pendentes, se os benefícios recebidos "a mais" com base em decisões judiciais que reconheceram o direito à desaposentação têm ou não que ser devolvidos.

Antes que a corte defina a questão, no entanto, a Procuradoria do INSS vem intimando aposentados a devolver os valores recebidos anos atrás com base na tese da desaposentação. Especialistas no assunto, entretanto, alertam que quem for intimado deve procurar um advogado e contestar a cobrança: antes da decisão do Supremo, o Superior Tribunal de Justiça havia reconhecido a existência do direito à desaposentação e a jurisprudência da corte diz que verbas alimentares recebidas de boa-fé não devem ser devolvidas.

De acordo com advogados, cobrar a diferença referente à desaposentação é ilegal, já que a aposentadoria é verba alimentar e muitas vezes o único sustento da família. E foram recebidas de boa-fé, com base em decisões judiciais.

Clara ilegalidade
Para a diretora do Instituto dos Advogados Previdenciários (Iape), Sara Tavares Quental, o INSS se antecipou. “O STF analisou a situação, mas ainda não decidiu sobre a devolução de dos valores já pagos”, afirma.

Segundo a especialista em Direito Previdenciário Martina Trombeta, é clara a ilegalidade da ação. “É uma restituição familiar, um direito patrimonial do aposentado, que não pode devolver o valor recebido. Essa ação quebra a proteção social”, avalia. Ela conta que alguns aposentados já foram notificados e o melhor a fazer é procurar um advogado. “Estamos orientando advogados a ficar atentos no caso de descontos, que ocorrem como atos de oficio."

Luiz Fernando de Quevedo, sócio do escritório Giamundo Neto Advogados, afirmou que o INSS vem causando insegurança e instabilidade na sociedade. Segundo ele, o acórdão do Supremo não deixou claro como a questão vai ser resolvida, e por isso o melhor a fazer é esperar o julgamento dos embargos de declaração.

Na opinião do especialista Thiago Fernandes, do Fernandes Advogados Associados, a ação do INSS é inconstitucional. “A eventual devolução deve ser resolvida no próprio processo judicial de origem. É absurdo esse entendimento o INSS de que, não sendo possível a cobrança judicial, partir para a cobrança administrativa e inscrição na Dívida Ativa”, explicou.

Enchendo o cofre
Em nota, a Advocacia-Geral da União informou que só está intimando os que conseguiram a desaposentação por meio de liminares. Os direitos que foram reconhecidos em decisão judicial transitada em julgado serão questionados em ação rescisória, informou o órgão.

A AGU diz não saber quantas ações a nova ofensiva envolve e nem quanto dinheiro conseguirá arrecadar.

De acordo com a Portaria Conjunta da Procuradoria do INSS 02, de janeiro deste ano, é permitida a cobrança de valores recebidos em tutela antecipada nos próprios autos.

“A cobrança dos valores pagos a título de benefício previdenciário concedido por decisão judicial provisória que é posteriormente revogada ou reformada, ou por decisão transitada em julgado que venha a ser rescindida, deverá ser processada, preferencialmente nos próprios autos do processo judicial em que proferida a decisão provisória que é posteriormente revogada ou reformada ou nos autos do processo da ação rescisória, quando se tratar de desconstituição de decisão com trânsito em julgado”, informou a portaria.

Clique aqui para ler o acórdão do STF. 

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