Trabalho infantil

Estado é responsável por jovens aliciados pelo tráfico, defende Siro Darlan em votos

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20 de julho de 2018, 9h09

Usar crianças e adolescentes para o tráfico de drogas é uma das “piores formas de trabalho infantil”, conforme estabelece a Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho. E os países que assinaram essa norma — como o Brasil — se comprometeram a erradicar essa forma de atividade.

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Para Darlan, Estado deveria assegurar que jovens não caíssem no tráfico de drogas.
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Com esse entendimento, o desembargador Siro Darlan, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, tem votado para não punir adolescentes por ato infracional análogo ao tráfico de drogas. A seu ver, a culpa por esses casos é do Estado, que não tem combatido eficazmente o aliciamento de jovens para a prática criminosa.

Darlan, que é presidente da 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ, vem reiterando sua interpretação em seguidos processos envolvendo adolescentes que chegam ao tribunal. No entanto, o magistrado tem ficado vencido nesses casos.

Em seus votos, Siro Darlan aponta que, em favelas do Rio de Janeiro dominadas por traficantes, os adolescentes são cooptados pelas facções “justamente em razão da omissão do poder público na implementação de políticas públicas que previnam a inserção do adolescente na criminalidade”.

Só que o Estado brasileiro se comprometeu, por meio da Convenção 182 da OIT (promulgada pelo Decreto 3.597/2000), a erradicar o trabalho infantil no país, destaca o magistrado. Especialmente as suas “piores formas”, como o uso de jovens para a prática de crimes, caso do tráfico de drogas.

Além disso, aponta Darlan, o Brasil é signatário de tratados internacionais que proíbem que jovens participem de conflitos armados, sejam internos ou externos. E o atual cenário do Rio assemelha-se ao de uma guerra, como vem sendo dito por autoridades, ressalta.

Princípio da culpabilidade
De acordo com o princípio da culpabilidade, é preciso que a pessoa tenha culpa para que o ato praticado seja um crime e que ele possa gerar uma punição. Na visão de Siro Darlan, o Estado tem “coculpabilidade” por “certas infrações penais cometidas por indivíduos abandonados à própria sorte, indivíduos aos quais foram negados os direitos mais fundamentais, como saúde, educação, que, por derradeiro, causam afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana”.

A repressão estatal ao tráfico não diminuiu nem a venda nem o uso de drogas, aponta o magistrado. Nessa situação, opina, adolescentes são cada vez mais recrutados para trabalhar para facções, o que aumenta os índices de criminalidade e sabota o desenvolvimento de milhares de jovens, que vêm na atividade “uma opção atraente de ‘trabalho’”.

“Entendo que sim, pois diante da essencialidade da prestação dos serviços públicos à coletividade, tais como a saúde, educação e segurança, o Estado está sujeito a causar danos aos administrados, decorrentes de condutas omissivas ou comissiva capazes de caracterizar sua culpabilidade no fato de não cumprir com seu mister e possibilitar que jovens, principalmente das comunidade carentes sejam facilmente aliciados pelo tráfico de drogas por ausência de políticas públicas efetivas que possibilitem dar maior efetividade ao princípio da proteção integral de crianças e adolescentes em nosso país”, analisa.

Assim, a conduta de um adolescente que pratica tráfico de drogas é criminosa, avalia Darlan. Afinal, uma infração penal é conduta típica, antijurídica e culpável. E, no caso, o Estado é igualmente responsável pelos atos do jovem.

Por isso, nesses casos, o magistrado tem votado para afastar a aplicação de medidas socioeducativas, como internação, e absolver o adolescente.

Clique aqui para ler a íntegra de um dos votos.

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