Opinião

O quinto constitucional existe para oxigenar os tribunais

Autor

  • Rita Cortez

    é advogada presidente da Academia Carioca de Direito e ex-presidente nacional do IAB (Instituto dos Advogados Brasileiros).

17 de julho de 2018, 17h11

O fato de um dos atores do imbróglio jurídico relacionado ao habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ser egresso do quinto constitucional, na vaga reservada à advocacia, foi o suficiente para realimentar a sanha pelo fim do instituto, que está completando 84 anos de existência. Como se a guerra de decisões contrárias, que assombrou a comunidade jurídica em pleno domingo, não fosse fruto da ausência de um posicionamento definitivo acerca da execução provisória da pena e do princípio constitucional da presunção de inocência – temas que ainda dividem os ministros do Supremo Tribunal Federal.

O chamado quinto constitucional na composição dos tribunais nasceu com a Constituição de 1934, como elemento imprescindível ao fortalecimento do próprio sistema judiciário. Passadas oito décadas, apesar de ter sofrido algumas alterações, o instituto continua garantindo o ingresso de profissionais com experiências distintas da vivência dos magistrados de carreira, mas com o mesmo objetivo de realizar justiça.

Num momento de desvalorização dos princípios inseridos na Constituição denominada cidadã por reconhecer que o povo é detentor de direitos fundamentais, é preciso ter atenção ao renascimento de uma forte campanha contra o quinto constitucional.

Advogados e advogadas são instrumentos de acesso à Justiça. O Estado tem o dever de garantir os direitos das pessoas, sendo advogados e advogadas essenciais nessa tarefa. Quando ocupamos vagas destinadas ao quinto, levamos na nossa bagagem não só a nossa experiência profissional, mas, principalmente, o espírito de se fazer justiça. A participação da advocacia e de membros do Ministério Público nos tribunais inferiores e superiores, portanto, é oxigenação indispensável à manutenção do Estado Democrático de Direito.

Magistrados de carreira não são escolhidos pela vontade popular, mas por meio de concurso de provas e títulos, sendo que alguns sequer tiveram contato com o exercício pleno e efetivo da advocacia, limitando sua atuação a conhecimentos teóricos, muitas vezes sem experiência de vida pessoal e profissional, maturidade, cultura humanística e vocação para o exercício do cargo. Nos tribunais superiores, a escolha não segue qualquer critério objetivo, dependendo simplesmente da vontade do presidente da República e da aprovação do Senado Federal.

A morosidade na prestação jurisdicional não pode ser atribuída exclusivamente aos que ocupam as vagas reservadas ao quinto constitucional. O Brasil possui uma proporção de juízes por habitante muito inferior à média internacional. Temos um Estado ocioso, divorciado e descomprometido com a rotina dos serviços públicos, que só existem por conta da pressão dos que reivindicam resultados, porém nem sempre satisfatórios. Justiça acessível e célere é compromisso social assegurado na Constituição, que deve ser observado por todos que ocupam vagas no Poder Judiciário.

Exemplos de judicatura egressa do quinto que enobrecem a advocacia não faltam. Citamos Evandro Lins e Silva, Sepúlveda Pertence, Cesar Asfor Rocha, João Otávio de Noronha e Maria Thereza de Assis Moura, entre outros.

Não somos contrários ao debate democrático acerca do quinto constitucional, para que se aperfeiçoe. Inaceitável é a crítica à honra e à dignidade dos que participam de um processo eleitoral nos conselhos da Ordem dos Advogados do Brasil, como também é inadmissível aceitar que queiram transformar esse importante instrumento de democratização e aprimoramento do Poder Judiciário em ferramenta incômoda e desnecessária à atividade judiciária brasileira.

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