Disseminação problemática

Facebook busca ferramentas e parcerias para combater bicho-papão das fake news

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14 de julho de 2018, 7h40

No final de junho, o ministro Luiz Fux, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, assinou um termo com Google e Facebook firmando compromisso no combate ao tipo de notícias falsas que se convencionou chamar de fake news. O movimento mostra o receio de ocorrer em 2018 no Brasil o que aconteceu em 2016 nos Estados Unidos.

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Notícias falsas se apresentam como principal desafio nas eleições e Facebook como campo de batalha. Reprodução

Lá, a última eleição presidencial foi marcada pelo compartilhamento informações falsas disfarçadas de notícias e impulsionadas pelo meios de  ampliação de alcance do Facebook. De acordo com pesquisa do site BuzzFeed, as notícias falsas tiveram mais alcance que as reais. Hoje o FBI investiga se elas foram usadas como arma para influenciar o debate eleitoral a favor de interesses estrangeiros. Além disso, o presidente eleito Donald Trump incorporou o termo fake news para desqualificar notícias das quais discorda.

Dois anos depois, com a aproximação das eleições gerais no Brasil, a preocupação é grande. O acordo entre o TSE e as empresas norte-americanas determina o compromisso de prevenir e combater a desinformação gerada por terceiros para prejudicar campanhas, além de apoiar a corte em projetos de fomento à educação digital e em iniciativas de promoção do jornalismo de qualidade.

O problema é mais grave no Facebook. Notícias falsas são tão comuns e antigas quanto as verdadeiras, mas foram os mecanismos da rede social de impulsionamento e direcionamento de posts conforme o comportamento on-line dos usuários que as transformaram em novidade. Uma simples mentira torna-se epidemia se ela consegue alcançar milhões de pessoas já dispostas a acreditar nelas.

No caso dos EUA, a maioria das fake news era ligada à venda de armas de fogo, assunto caro à campanha de Trump e controverso o suficiente para que a campanha da candidata democrata, Hilary Clinton, não tocasse nele.

Pouco depois disso, foi descoberto que o Facebook permitiu que uma consultoria política, a Cambridge Analytica, acessasse dados de comportamento de usuários da rede para fazer marketing político direcionado — com uso intenso de fake news.

Os abalos à imagem do Facebook foram tão grandes que a empresa vem passando por um período de reformulação de suas políticas de privacidade e tem se aproximado de quem possa ajudar a combater a epidemia de notícias falsas feitas sob medida para redes sociais.

Na quinta-feira (12/7), reuniu alguns jornalistas em sua sede no Brasil, em São Paulo, para contar estes planos.

Checagem de fatos 
No momento a principal ferramenta é a pareceria com as agências de checagem de fatos — que, no rastro das fake news, se chamam de agências de fact checking. Em cada país, o Facebook escolhe agências que estejam de acordo com critérios estabelecidos pelo Poynter Institute, escola de jornalismo dos EUA. Alguns deles: transparência quanto ao financiamento e metodologia, apartidarismo e disposição a admitir erros.

No Brasil foram escolhidas Aos Fatos, Agência Lupa e a agência France Press. Todas trabalham sem nenhuma ligação formal ao Facebook. Analisam as notícias e dão o veredito se são falsas ou exageradas. Caso seja esse o entendimento, o Facebook impede que este conteúdo seja impulsionado por patrocínio e diminui em 80% o alcance orgânico.

Além disso, após essa classificação, o Facebook mostra uma mensagem ao usuário que quiser compartilhar o conteúdo afirmando que aquela notícia foi identificada como falsa ou exagerada por uma das agências. Um link para o site da agência leva a pessoa a um texto que explica o contexto da notícia e o motivo de ela ter sido classificada daquela forma.

O advogado Diogo Rais, especialista em Direito Eleitoral e estudioso do fenômeno das notícias mentirosas, acha que é um bom caminho o trabalho em conjunto entre Facebook e agência. 

"É um problema complexo pois é tratado com expectativa muito alta. A ideia de que tudo é fake news cria um desafio de impossível solução", afirma. "O importante é entender que as fake news não têm uma forma: amarela, redonda, quadrada ou azul. Ela é conteúdo, e por isso vai variar de acordo com seu conteúdo. E os desafios para cada conteúdo são diferentes. Para o Direito é um desafio, para a Ética é outro e para atuação tecnológica é outro", analisa Rais, em entrevista à ConJur.

Perfil do veículo 
Nos Estados Unidos, uma nova ferramenta vem sendo testada pelo Facebook. A rede social mostra ao leitor um pequeno perfil com a história do veículo, outras reportagens publicadas pelo repórter e em quais cidades e países essas reportagem está sendo compartilhada.

Bicho-papão 
As notícias falsas se tornaram um bicho-papão para o Estado brasileiro. Em 2017, o Tribunal Superior Eleitoral convocou o Ministério da Defesa e as Forças Armadas para monitorar redes sociais em busca de notícias falsas durante as eleições de 2018. 

Já no início deste ano o tema virou assunto legislativo. O Conselho de Comunicação Social do Senado passou a discutir um anteprojeto de lei que criminaliza a criação e disseminação de fake news.

No âmbito penal, o projeto estipula até dois anos de prisão caso a mentira não tenha maiores consequências. A pena aumenta em até dois terços se a criação a notícia falsa tem como objetivo obter vantagem para o autor ou para terceiro.

O ministro Luis Felipe Salomão, do TSE, já afirmou que combater e conter a proliferação de notícias falsas na internet é o grande desafio da corte no próximo ano. 

Questão partidária 
O debate chegou aos partidos. Dez siglas assinaram um termo de compromisso prometendo não divulgar durante o ano eleitoral fake news. 

Todas se comprometem a "manter o ambiente de higidez informacional, de sorte a reprovar qualquer prática ou expediente referente à utilização de conteúdo falso no próximo pleito, atuando como agentes colaboradores contra a disseminação de 'fake news' nas eleições 2018". O documento não fixa punições caso algum partido descumpra a cláusula. Assinaram DEM, PCdoB, PSDB, PDT, PRB, PSC, PSD, PSL, Psol e Rede.

Intervenção do Judiciário 
A questão já começou a ser enfrentada nos tribunais. No começo do mês passado, o ministro Sérgio Banhos, do Tribunal Superior Eleitoral, mandou o Facebook retirar de suas páginas cinco postagens consideradas ofensivas à ex-senadora Marina Silva, pré-candidata do Rede à Presidência da República. O ministro também determinou que a rede social disponibilize os dados de acesso dos autores da página "Partido Anti-PT" ao Rede.

"A intervenção da Justiça Eleitoral, até pela importância das mídias sociais nestas eleições de 2018, deve ser firme, mas cirúrgica", afirma Banhos, na liminar. "O uso da internet como arma de manipulação do processo eleitoral dá vez à utilização se limites das chamadas 'fake news'", disse o ministro. 

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