Direito à informação

Blogueiro pode fazer críticas duras a agente público por suspeitas reais

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8 de julho de 2018, 7h09

Críticas duras e contundentes não podem ser consideradas ofensivas ou difamatórias se originadas de denúncias, suspeitas e/ou fatos reais que envolvem o agente público no pleno exercício de seu trabalho. Assim entendeu a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao derrubar sentença que havia condenado um jornalista a pagar R$ 20 mil, a título de danos morais, por ter criticado duramente o reitor de uma universidade federal em seu blog.

O blogueiro publicou texto pedindo o impeachment do responsável pela instituição de ensino por improbidade administrativa, dando a entender que ele utilizou dinheiro público para promoção pessoal.

A publicação chegou a compará-lo à figura do tirânico imperador romano Calígula (12 a 41 depois de Cristo), ‘‘famoso por seu ego e por seu desprezo às leis”. Também afirmou que o edital de um concurso público estava ‘‘cheio de furos’’, com ‘‘erros propositais para provocar o seu cancelamento’’, levando a crer que o reitor cometera o crime de prevaricação – retardar ou deixar de praticar ato de ofício para satisfazer interesse pessoal do servidor público.

Em outro texto, o jornalista deu a entender que estátuas desaparecidas de um casarão foram furtadas pelo administrador da universidade, já que saíram ‘‘pela porta da frente’’. 

O reitor queria excluir as publicações do blog e ser indenizado por danos morais. Já o jornalista disse que não poderia deixar de expor notícias sobre a instituição nem tecer comentários críticos sobre seus problemas.

Disse ainda que o reitor é pessoa pública, alvo das mais variadas criticas e demandado em diversos processos que apura, em tese, atos de improbidade administrativa. Argumentou ainda que as notícias não têm cunho sensacionalista e são todas fundamentadas em casos de suspeita de irregularidades.

O pedido do autor foi parcialmente aceito em primeiro grau. A juíza Michele Soares Wouters, da 2ª Vara Cível de Pelotas, entendeu que a crítica ácida extrapolou os limites da apuração jornalística, devendo o réu ser responsabilizado por sua conduta.

O relator no TJ-RS, desembargador Eduardo Kraemer, também entendeu considerou as publicações abusivas, atentando contra os direitos de personalidade. ‘‘Verifico que, no caso em concreto, restou demonstrada a conduta ilícita por parte do réu, na medida em que, da análise das matérias publicadas, tenho que restou extrapolado o direito da liberdade de imprensa’’, anotou no acórdão.

Informações reais
Venceu, no entanto, voto divergente do desembargador Eugênio Facchini Neto. Ele entendeu que, embora as críticas tecidas pelo jornalista possam ser consideradas fortes, não ultrapassaram a civilidade nem configuraram abuso de direito, devendo prevalecer a liberdade de imprensa, o direito de informar e o direito à informação.

Conforme Facchini, o réu não ‘‘criou’’ notícias para macular a imagem do autor, pois o reitor foi realmente acusado de improbidade administrativa e condenado por utilizar verbas públicas, da universidade, para publicação de anúncios com evidente caráter de promoção pessoal.

‘‘Com efeito, toda e qualquer manifestação de poder estatal pode ser livremente debatida por qualquer um, especialmente pela imprensa, inclusive de forma fortemente crítica. Quem quer que ocupe um cargo público está exposto a ter suas decisões e condutas debatidas, comentadas e eventualmente criticadas. A democracia sempre ganha com o debate livre e aberto sobre temas que a todos interessam, especialmente quando se trata de exercício de poder público’’, escreveu.

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Processo 022/1.08.0023742-1

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