Violação de prerrogativas

Advogado foi algemado e agredido no exercício da função em MT, diz Abracrim

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7 de julho de 2018, 16h36

A Associação dos Advogados Criminalistas do Brasil em Mato Grosso (Abracrim-MT) afirma que um advogado foi “brutalmente agredido e algemado” durante o exercício da função na madrugada deste sábado (7/7), em Cuiabá, ao atender ao chamado de um cliente, também advogado, que havia sido detido.

Segundo a entidade, as prisões foram feitas por policiais do Grupo de Operações Especiais (GOE) que usavam balaclavas, impossibilitando qualquer reconhecimento ou identificação.

Divulgação/Abracrim-MT
Segundo a Abracrim, há 18 vídeos que comprovam a conduta "agressiva e inadequada" dos policiais ao prender advogado em exercício.
Divulgação/Abracrim-MT

Dyego Nunes da Silva Souza é acusado por dirigir embriagado e ter atropelado um homem, fugindo sem prestar socorro. Após depoimentos de testemunhas, policiais chegaram até a casa dele e alegam ter encontrado o carro da forma como descrito nos depoimentos, com o para-brisa quebrado e a lateral danificada. Diante da situação, seu advogado, o criminalista Luciano Carvalho do Nascimento, foi chamado até a residência.

A polícia diz que o criminalista não apresentou o registro na Ordem dos Advogados do Brasil, dificultou o trabalho dos policiais, incitou um cachorro da raça pitbull contra os agentes e tentou impedir que o veículo fosse levado para perícia. O GOE então foi chamado para efetuar a prisão em flagrante do suspeito de ter participado do atropelamento, e levou também o criminalista que respondeu um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) por "resistência a prisão de seu cliente".

Segundo a Abracrim, Nascimento foi “brutalmente agredido, algemado e levado na viatura preso até o Cisc Verdão”. A associação afirma que os policiais não possuíam visíveis “qualquer identificação funcional, portando a todo momento bataclavas, e impossibilitando qualquer reconhecimento e identificação civil”.

Em nota, a entidade repudiou o tratamento dos policiais e disse que o advogado foi preso no exercício de sua profissão, sem a presença de um representante da OAB, em “total desrespeito às prerrogativas da advocacia”. A Abracrim afirma que foram gravados 18 vídeos que comprovam que “a conduta do advogado foi respeitosa, mas a dos policiais — que estavam com os rostos cobertos e sem identificação — foi agressiva e inadequada”. 

“Mesmo com a chegada de uma comissão de advogados criminalistas e da presidente da Abracrim-MT, Michele Marie de Souza, os policiais continuaram agindo de forma truculenta com o nítido intuito de intimidar os presentes que estavam ali apenas para resguardar os direitos do advogado detido erroneamente. Sendo inclusive, proibidos de adentrar o interior do Cisc para acompanhar o procedimento da lavratura da prisão”, afirma a associação.

De acordo com a presidente da entidade, Nascimento foi encaminhado ao IML para exame de corpo de delito na tarde deste sábado, após esperar horas pela finalização do boletim de ocorrência, e Silva Souza passa por audiência de custódia. A Abracrim afirma que irá “tomar todas as providências legais cabíveis para assegurar a responsabilização das violações das prerrogativas diante dos órgãos competentes nas esferas administrativas, civis e criminais”.

OAB
O presidente da seccional mato-grossense da Ordem dos Advogados do Brasil, Leonardo Pio da Silva Campos, gravou um vídeo em frente à delegacia na qual Nascimento estava detido na manhã deste sábado, afirmando que a entidade tomará providências sobre o caso. Campos disse que marcou uma reunião para a próxima segunda-feira (9/7) com o governador, o secretário de Segurança Pública e o coordenador da Polícia Civil do Estado.

“A ordem não vai se calar frente a abusos que ocorreram na noite de ontem. Se policiais que têm por objetivo proteger a população dispensam tratamento a um advogado, que é um agente essencial na manutenção da justiça, imagine como a população está sendo tratada na periferia. São por essas minorias que nós não vamos generalizar, mas vamos pedir punição exemplar.”

Leia a nota da Abracrim:

A Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas do Estado de Mato Grosso – ABRACRIM/MT, vêm a público pela presente nota, expressar em defesa das prerrogativas dos advogados e seu repúdio à violência empregada em especial ao advogado, Dr. Luciano Carvalho do Nascimento, no exercício da sua profissão, pelos policiais civis do Grupo de Operações Especiais – GOE/MT, na madrugada deste sábado, encapuzados, de forma totalmente ilegal e arbitrária, sem o mínimo conhecimento jurídico das prerrogativas que circundam o profissional da advocacia, vilipendiaram o advogado criminalista Luciano, que estava a exercer o seu mister na defesa de um cliente.

Segundo se constata dos vídeos que foram gravados na ocasião, os policiais, à sorrelfa, com um modus operandi totalmente contraposto ao que dispõe a Constituição Federal e o Estatuto da OAB, não só violaram prerrogativas profissionais, impedindo o legítimo exercício do Advogado Luciano, como cometeram, indesmentivelmente, crimes violentos contra o profissional, que ficou “refém” de marginais (porquanto atuaram à margem da lei) encapuzados, sem qualquer identificação.

Com efeito, não obstante o tratamento degradante e vexatório direcionado ao advogado que, com urbanidade e respeitabilidade, apenas acompanhava a diligência policial, os agentes públicos, em flagrante inobservância ao disposto no artigo 7º, §3º, da Lei 8.906/1994, o prenderam, após terem verdadeiramente espancado o advogado Luciano, que, ante a situação, necessitou ser prontamente encaminhado ao hospital para receber tratamentos médicos. 

A toda evidência, não é essa a postura que se espera da Polícia Civil, num Estado que se diz “Democrático” e de “Direito”. O tratamento covarde, truculento é desumano “estampado” nos vídeos não é aceitável nem mesmo em relação a quem paire a pior das imputações criminais, quanto mais a um advogado, no exercício legitimo de uma profissão com status constituição, revestida pela cláusula da indispensabilidade.

Com efeito, repudia a ilegal inconstitucional revista realizada no advogado durante o seu mister, as agressões e vias de fato a que foi submetido, além do constrangimento ilegal por ser algemado e levado no camburão à delegacia de polícia.

Repudia também os policiais que recusaram a se identificar, e trataram de forma hostil os demais membros da ABRACRIM que foram acompanhar o caso na Delegacia, inclusive impedindo-os de ter livre acesso à repartição policial.

Isto porque, os supracitados eventos violam a essência do Estado Democrático de Direito, considerando-se que o art. 133 da Constituição Federal, regulado pela Lei 8.906/94, dispõe sobre as prerrogativas do advogado no exercício da sua profissão, sendo inviolável o seu corpo e o tendo livre acesso às repartições públicas, que, como cediço, é essencial à administração pública.

Dito de outra forma, estes expedientes adotados pelo sistema de justiça criminal, em razão da violação da força normativa e legitimante da Constituição, devem ser compreendidos como atos de desrespeito à advocacia e afronta ao estado democrático.

A ABRACRIM/MT, para além das prerrogativas da advocacia, sempre lutará pela defesa da estrutura do ordenamento jurídico.

Não cansaremos de repetir: a violação de qualquer das prerrogativas da advocacia provoca inegável violação ao Estado Democrático de Direito. Lutaremos sempre, pois sem advogado não há justiça!".

Veja imagens gravadas durante a prisão dos advogados:

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