Decisões políticas

Estudo culpa televisão por queda de popularidade da Suprema Corte dos EUA

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4 de julho de 2018, 11h11

Publicado pelo jornal Political Communication, o estudo “Cobertura da Mídia e a Aprovação Pública da Suprema Corte dos EUA” conclui que a instituição perdeu apoio popular nas últimas décadas por culpa da televisão. De acordo com o estudo, o noticiário e os debates na televisão frequentemente retratam as decisões da corte como políticas ou insinceras.

Chris Adams
Ao analisar a popularidade da Suprema Corte dos EUA, estudo concluiu que “quem conhece a corte gosta dela, quem acompanha a cobertura televisiva da corte não gosta dela”.

As emissoras de televisão fariam isso por interpretar as decisões em linguagem esportiva ou de guerra, diz o estudo, mencionando vencedores e perdedores e discutindo táticas e estratégicas jurídicas. Como exemplo, cita as expressões “ganhou a batalha”, “ataque”, “o lado perdedor”, “acontecimento inesperado” e “caiu como uma bomba”.

Os autores, o professor de Ciência Política da Universidade Estadual do Colorado Matthew Hitt e a professora de Comunicação de Massa da Universidade Estadual de Louisiana Kathleen Searles se vangloriam de terem sido “os primeiros a encontrar prova de culpabilidade no misterioso declínio do apoio público à corte na era moderna”.

E chegam a uma conclusão inusitada: “Quem conhece a corte gosta dela, quem acompanha a cobertura televisiva da corte não gosta dela”.

Os autores do estudo culpam apenas a televisão, sem fazer referências a jornais, revistas, rádios e sites, por uma simples razão: eles estudaram apenas o noticiário da TV. Analisaram transcrições de um grande número de programas noticiosos da ABC, NBC, CBS, CNN, MSNBC e Fox News e os compararam com decisões da Suprema Corte.

Na verdade, o noticiário e os comentários dos programas de TV refletem apenas o que acontece na Suprema Corte, em linguagem tipicamente usada por jornalistas dos EUA. As notícias da corte são apresentadas como políticas porque é isso que elas são.

Afinal, praticamente todos os casos com algum interesse político são decididos por 5 votos a 4, de acordo com a linha ideológica dos ministros da corte: são cinco conservadores-republicanos e quatro liberais-democratas. Ocorreram exceções apenas quando o ministro Anthony Kennedy, um conservador, votou com os liberais.

Exemplos
Assim como o Judiciário interpreta as leis, a imprensa interpreta a notícia. Sempre foi assim — não é um fenômeno das últimas décadas. Eis alguns exemplos.

No final de junho, a corte decidiu por 5 votos conservadores contra 4 liberais que o decreto presidencial que baniu a entrada no país de cidadãos de vários países muçulmanos é constitucional, apesar de a Constituição proibir discriminação religiosa. Na interpretação da imprensa, o presidente Trump foi o grande vencedor, porque a corte lhe permitiu barrar mais muçulmanos de entrar no país e assim cumprir sua promessa de campanha.

No início de junho, também por 5 votos a 4, apoiou um confeiteiro do Colorado que se negou a fazer um bolo de casamento para um casal gay. Para a imprensa, o confeiteiro “ganhou uma longa batalha judicial” — uma expressão mais do que costumeira.

Também no final de junho, a corte acabou com a contribuição sindical obrigatória, mais uma vez por 5 votos a 4. No final de maio e também por 5 a 4, a corte decidiu que contratos de trabalho podem proibir ações coletivas e estabelecer que qualquer disputa trabalhista deve ser decida por arbitragem. As duas decisões foram interpretadas pela imprensa como um “ataque” aos trabalhadores.

Todos esses votos vencedores, como tantos outros, se alinham com bandeiras políticas do Partido Republicano — e os votos perdedores com a ideologia do Partido Democrata. A leitura dos votos mostra que não é difícil encontrar argumentos jurídicos para justificar qualquer uma das posições.

Assim, não seria necessário um estudo para constatar que a televisão — como todos os demais órgãos de imprensa — atribuem um cunho político às decisões da Suprema Corte.

Mas o estudo traz uma sugestão interessante para a Suprema Corte: criar uma assessoria de imprensa para produzir notícias sem a terminologia usual da imprensa, que, segundo os autores, faz com que a corte perca apoio popular.

O estudo não menciona, mas é óbvio que parte da incompreensão popular sobre o que seria o lado bom da corte se deve ao fato de os ministros se recusarem a colocar câmaras na sala de audiência, para transmitir ao vivo os trabalhos da Suprema Corte. Assim, a população poderia acompanhar as audiências sem qualquer interpretação da imprensa.

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