Apelido notório

TJ-RS reconhece bullying e permite que Marciane troque nome para Marci

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2 de julho de 2018, 14h37

Embora a Lei dos Registros Públicos defina prenomes como definitivos, é possível a sua substituição por apelidos públicos notórios para garantir a dignidade da pessoa humana. Assim entendeu a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao permitir que uma mulher, batizada como Marciane, altere seu assento de nascimento para simplesmente Marci, como é mais conhecida no meio social e entre familiares.

Ela alegou que o prenome de nascimento lhe causava desconforto e constrangimento, pois sempre era ‘‘associado a eventos e entidades alienígenas advindas do planeta marte’’. A autora disse ter sofrido bullying na época de escola. 

A juíza Maria Cristina Rech, da Vara Adjunta da Direção do Foro da Comarca de Farroupilha, negou o pedido de alteração de registro, por entender que a mulher não comprovou que seu prenome causa constrangimento ou exposição ao ridículo, pois nenhum fato concreto foi relatado.

Para a julgadora, ficou evidenciado, apenas, que a autora não gosta do seu nome. ‘‘Mero descontentamento com o prenome não autoriza a modificação pretendida’’, escreveu na sentença. 

Direito fundamental
Já o procurador de Justiça Ricardo Vaz Seelig disse, em parecer, que o pedido merecia ser acolhido ainda que não envolvesse caso extremo de situação vexatória. Ele avaliou que, se não houvesse um real desconforto, a parte certamente não procuraria o Poder Judiciário para alterar seu assento de nascimento, com todas as repercussões que disso resulta. Se há margem a dúvida, opinou, o caso deveria ser resolvido a favor da autora, sobretudo quando ausente prejuízo a terceiros.

O relator no TJ-RS, desembargador Ricardo Moreira Lins Pastl, também reconheceu a retificação de registro civil. Para o desembargador, o cartão de visita e as testemunhas arroladas no processo atestam que a autora, desde longa data, é conhecida em seu meio social e profissional como Marci. Tanto que uma das testemunhas referiu que só soube do nome real da proponente da ação quando intimada pela Justiça.

Citando a doutrina de Carlos Alberto Bittar, Pastl disse que o direito à identidade é um direito fundamental da pessoa que inaugura a categoria dos direitos morais, exatamente porque se constitui no elo entre o indivíduo e a sociedade em geral. Também os doutrinadores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald , destacou, compreendem o nome civil como um aspecto integrante da personalidade humana, projetando sua dignidade no seio social e familiar.

‘‘Assim, reclama-se uma interpretação não exaustiva das hipóteses modificativas do nome, permitindo a sua alteração justificadamente para salvaguardar a dignidade da pessoa humana.’’ O relator considerou que, ‘‘sopesando o direito fundamental à busca da felicidade’’, deve-se permitir o uso do próprio nome sem qualquer constrangimento.

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