Desigualdade de direitos

Ações judiciais alegam que EUA continuam a discriminar casais gays

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27 de janeiro de 2018, 8h28

Duas ações judiciais movidas contra o Departamento de Estado dos EUA nesta semana alegam que o governo americano ainda não respeita inteiramente a decisão da Suprema Corte do país, de junho de 2015, que legalizou o casamento entre pessoas do mesmo sexo com base no princípio constitucional da igualdade de direitos.

Os dois casos são semelhantes. Cada um deles se refere a um casal formado por um cidadão americano e um estrangeiro, com dois filhos. Para conceder cidadania às crianças, o Departamento de Estado exigiu exame de DNA dos pais, para comprovar que cada uma das crianças tinha “sangue americano”.

Nos dois casos, o Departamento de Estado concedeu cidadania a um dos filhos, que recebeu passaporte americano e carta de congratulações, e negou ao outro — apesar das certidões de nascimento de ambos registrarem os nomes dos mesmos pais.

Segundo as ações, essa exigência do exame de DNA não é feita a casais heterossexuais, quando o homem é americano e a mulher é estrangeira, ou a mulher é americana e o homem, estrangeiro.

No caso do casal gay, no entanto, o filho do pai estrangeiro é considerado pelo governo como “nascido fora do casamento” — ou filho ilegítimo —, indicando que o Departamento de Estado não está reconhecendo o casamento gay.

Para ficar claro, nenhum dos bebês nasceu nos Estados Unidos. Se fosse o caso, o reconhecimento da cidadania seria automático. No entanto, a legislação do país reconhece a cidadania americana de qualquer criança nascida no estrangeiro, em que pelo menos um dos pais é cidadão americano — sem discussões, no caso de casais heterossexuais.

Em um dos casos, crianças gêmeas nasceram no Canadá. A mãe não foi registrada, porque ela apenas gerou os bebês pelo processo conhecido como “barriga de aluguel”. Os gêmeos foram registrados em nome dos pais: Andrew Dvash-Banks, cidadão americano, e Elad Dvash-Banks, cidadão israelense.

Ao pedir passaporte americano para as crianças, uma funcionária do consulado americano interrogou o casal. Ela queria saber, por exemplo, como as crianças foram concebidas — uma pergunta que, naturalmente, não faria a um casal heterossexual, diz a ação. E para confirmar que tipo de sangue jorrava nas veias das crianças, pediu o exame de DNA.

Como cada um dos pais havia fornecido esperma para a inseminação artificial, o resultado foi o esperado: Aiden Dvash-Banks carrega o DNA do pai americano, e Ethan Dvash-Banks, o do pai israelense. Nascidos com apenas quatro minutos de diferença e agora com um ano e quatro meses de vida, Aiden tem passaporte americano, e Ethan é um imigrante ilegal, que entrou nos EUA com visto de turista que já está vencido.

Além de demandar a cidadania para Ethan na Justiça, o casal já fez um requerimento de green card (residência nos EUA como imigrante) para o filho “ilegal”. Se tudo que Ethan conseguir for o green card e, com o tempo, a naturalização, a desigualdade entre os gêmeos permanecerá. Por exemplo, Aiden poderá, entre outros direitos exclusivos de cidadãos americanos, ser presidente da República. Ethan, não.

No outro caso, que também começou a tramitar na Justiça nesta semana, duas crianças nasceram na Inglaterra, filhas de um casal de lésbicas. Uma criança foi concebida, por inseminação artificial, pela cidadã americana Allison Blixt. A outra foi concebida pela cidadã italiana Stefania Zaccari.

Todos foram submetidos a exame de DNA, e o resultado final foi o mesmo: um dos filhos é cidadão americano, o outro é italiano — e assim será para sempre, na visão do Departamento de Estado dos EUA.

As duas ações foram movidas pela mesma organização sem fins lucrativos para direitos imigratórios, a Immigration Equality, e por advogados da banca Sullivan & Cromwell.

Os advogados alegam que os procedimentos do Departamento de Estado são inconstitucionais, porque violam o direito de igualdade dos casais gays, garantido pela Constituição e reafirmado pela decisão de 2015 da Suprema Corte (Obergefell vs. Hodges).

Nessa decisão, o voto vencedor declara que os casais do mesmo sexo têm direito “à constelação de benefícios que os estados vincularam ao casamento”. Isso inclui o direito de conferir cidadania, baseada nos direitos de nascimento, aos filhos dos casais gays, argumenta o diretor executivo da Immigration Equality, Aaron Morris, um dos advogados que representam os autores das ações.

Os advogados também alegam que o governo está aplicando uma regra que exige comprovação de relacionamento sanguíneo de pessoas não casadas, o que, segundo eles, não é o caso dos casais gays que são casados. Para eles, isso é uma política anti-LGBT do governo.

Por isso, também pedem a emissão de uma ordem judicial que proíba o Departamento de Estado de continuar tratando os casais homossexuais de forma diferente dos casais heterossexuais.

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