Interesse público

2018 será o último ano das "velhas" empresas estatais?

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18 de janeiro de 2018, 7h05

Spacca
O ano de 2018 começou e encontram-se em curso os últimos seis meses para que as empresas estatais brasileiras (federais, estaduais e municipais) terminem de se adaptar ao novo Estatuto das Empresas Estatais, consubstanciado pela Lei 13.303/16.

O prazo fatal para a eficácia plena da nova legislação é o dia 30 de junho, tal como tive a oportunidade de registrar no texto Lei das Estatais e seu período de transição: estudo de caso em MG, publicado na ConJur em 27 de outubro de 2016.

O Estatuto das Empresas Estatais foi regulamentado em nível federal pelo Decreto 8.945/16. No âmbito dos estados, a iniciativa de regulamentação também foi intensa. Vários foram os decretos editados com a finalidade de estabelecer parâmetros de transição e aplicabilidade das disposições da Lei 13.303/16, a ver:

Alagoas: Decreto 52.555, de 14/3/2017
Bahia: Decreto 17.302, de 27/12/2016
Ceará: Decreto 32.112, de 23/12/2016
Distrito Federal: Decreto 37.967, de 20/1/2017
Mato Grosso: Decreto 793, de 28/12/2016
Minas Gerais: Decreto 47.105, de 16/12/2016, e Decreto 47.154, de 20/2/2017
Paraíba: Decreto 37.337, de 12/4/2017
Paraná: Decreto 6.263, de 20/2/2017
Pernambuco: Decreto 43.984, de 27/12/2016
Rio de Janeiro: Decreto 45.877, de 29/12/2016
Rio Grande do Norte: Decreto 26.633, de 9/2/2017
Rio Grande do Sul: Decreto 53.433, de 17/2/2017
São Paulo: Decreto 62.349, de 26/12/2016
Santa Catarina: Decreto 1.007, de 20/12/2016
Sergipe: Decreto 30.623, de 27/4/2017

O Estatuto das Empresas Estatais versa, basicamente, sobre dois grandes temas, prescrevendo, do ponto de vista eminentemente jurídico, novas interseções entre o público e o privado no regime jurídicos dessas entidades. Eis os grandes temas:

  • governança corporativa (artigo 5º ao 27);
  • licitações e contratos (artigo 28 ao 90).

Com efeito, existe consenso doutrinário e jurisprudencial sobre a hibridez do regime jurídico das empresas estatais. Dito regime mescla — como de resto acontece com menor ou maior intensidade em toda a administração pública1 — elementos, institutos e conceitos de Direito Público e de Direito Privado, com maior relevo privatista em face da natureza empresarial das entidades.

Com o advento da Lei 13.303/16, o que se verifica, nesse contexto, é a “publicização” dos aspectos de governança corporativa em contrapartida à “privatização” do ambiente contratual2.

No quesito “governança corporativa”, os objetivos políticos e jurídicos subjacentes à nova legislação — amplificados em boa parte pelos efeitos da operação “lava jato” — e que justificam a afirmativa dessa “publicização” são:

  • ampliação da transparência no âmbito de atuação das empresas estatais;
  • adoção de mecanismos de compliance e integridade;
  • diminuição do aparelhamento político na composição dos órgãos de direção e fiscalização;
  • estabelecimento de requisitos de elegibilidade da alta administração das companhias;
  • mitigação de riscos dos investidores nacionais e estrangeiros que adquirem ações dessas companhias.

A Lei 13.303/16, em matéria de governança corporativa, consolida recomendações do IBGC (Instituto Brasileiro de Gestão Corporativa) e iniciativas anteriores de autoregulação da Bovespa (Regulamentos do Novo Mercado, Nível 1 e 2 de Governança), a seguir diretrizes traçadas para o ambiente corporativo pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). As diretrizes:

  • definição adequada da qualidade de proprietário (transparência, profissionalismo, accountability e eficiência);
  • tratamento equitativo dos acionistas controladores e minoritários;
  • definição clara das relações travadas pelas empresas estatais com partes relacionadas;
  • transparência e divulgação de resultados e informes em conformidade com os princípios da OCDE;
  • responsabilidade dos conselhos de administração, órgãos máximos, na definição das diretrizes das empresas estatais.

Além disso, ainda no rumo da “publicização”, a Lei 13.303/16 prevê como requisitos de transparência a elaboração de uma série de documentos fidedignos de divulgação dos aspectos relevantes da gestão (por exemplo, carta anual da administração, política de transação com partes relacionadas), além de prescrever antigos e novos instrumentos e órgão de controle e de prevenção de riscos (conselho fiscal, comitê estatutário de auditoria, auditoria interna e gestão de riscos).

Relativamente às indicações para dirigentes e conselheiros das empresas estatais, a Lei 13.303/16 foi taxativa. Estabeleceu uma gama de requisitos e vedações incidentes sobre os nomes que poderão compor as diretorias e conselhos, resumidamente, reputação ilibada; notórios conhecimentos profissionais; formação acadêmica; experiência profissional; e potencial independência relativa a governos, agências reguladoras, partidos políticos ou campanhas eleitorais e à própria corporação da empresa estatal.

Tais requisitos deverão ser verificados pelo comitê estatutário de elegibilidades ou órgão equivalente, incumbido de pesquisar e sindicar o currículo e os impedimentos dos indicados.

Se a implantação prática do novo regime corporativo das empresas estatais será suficiente para alcançar os objetivos pretendidos pela Lei 13.303/16, ainda é cedo para dizer… Pode ser ou não o último ano de uma concepção mais antiquada das empresas estatais. O tempo dirá!

De toda forma, o que a sociedade brasileira vai cobrar é a transformação das empresas estatais em instrumentos de Estado — e de atuação eficiente no mercado — e não em instrumentos a serviço de governos.


1 Ver sobre o tema: FERRAZ, Luciano. Regime Jurídico das Administrações Públicas é híbrido, https://www.conjur.com.br/2016-abr-14/interesse-publico-regime-juridico-aplicavel-administracoes-publicas-hibrido.
2 Ver sobre o tema: Ferraz, Luciano. Novo Estatuto das Empresas Estatais e bilateralidade nos contratos. https://www.conjur.com.br/2016-set-15/interesse-publico-estatuto-empresas-estatais-bilateralidade-contratos.

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