Opinião

Combate à corrupção não justifica regalias ao Judiciário e ao MP

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15 de janeiro de 2018, 16h14

No início de 2018, como nos demais anos, esperamos que possamos cumprir nossas metas pessoais. Este começo de ano, porém, guarda também outras expectativas. O Brasil é um Estado Democrático de Direito e vem tentando nos últimos anos, a duras penas, concretizar este modelo de Estado previsto na Constituição de 1988, em que todos tenham acesso ao mínimo existencial e possam viver com dignidade.

Não vem sendo tarefa fácil, sobretudo nos últimos anos. Para além da brutal e recessiva crise econômica que atravessamos e que afeta diretamente a classe média e os mais pobres o que assistimos é desanimador e desalentador, incutindo em muitos a convicção de que tudo está perdido de que não há mais esperanças. Em menos de dez anos os pedidos de visto de brasileiros para viver em Portugal saltaram de 300 para 3 mil e talvez não pare por aí.

Com efeito, este sentimento é por demais compreensível. A corrupção, como autêntica Hidra de Lerna, que não tem partido nem ideologia, grassa em todos os níveis da República atingindo e comprometendo gravemente não apenas o desenvolvimento econômico do país, estados e municípios, mas principalmente os índices sociais, condenando várias gerações a não ter presente nem futuro dignos.

No campo das instituições, a despeito dos poucos avanços conquistados ainda nos deparamos com sua patente fragilidade. A harmonia entre os poderes se revela mera ficção e ocorre apenas pontualmente, quando interesse é comum (o deles), nem sempre público. O Executivo, detentor da distribuição dos recursos, costuma exercer sobre os demais um poder de império, subjugando-os desavergonhada e costumeiramente. Carlos Marun, e outros mais, que o digam.

Serviços públicos de qualidade e para todos? Infraestrutura que dote o país de condições para crescer ? Esqueçam. O que acontece nos estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Rio Grande do Norte são casos pontuais ou antecipação do que virá ? O Legislativo se desmancha por completo aos nossos olhos. São tantos exemplos que não dá para relacionar por aqui. Aliás, a noção de democracia representativa nunca esteve tão em baixa no Brasil como nestes anos recentes. Para que servem os políticos mesmo?

Neste cenário, o Poder Judiciário e o Ministério Público se apresentaram como guardiões da legalidade e institucionalmente devem ser. O combate à corrupção teve neles a atuação que a sociedade espera, mas algumas ressalvas devem ser feitas. A sanha punitiva de ambos regeu e rege a tônica das ações e mudou as suas feições. Entre as dez medidas contra a corrupção, que milhões assinaram sem saber, havia a previsão do fim do Habeas Corpus (que nem na ditadura militar aconteceu) e a utilização de provas ilícitas como válidas. As delações premiadas, conduções coercitivas, interceptações telefônicas ilegais, vazamentos de gravações etc, são alguns exemplos do que foi defendido para combater a corrupção, sem a mínima preocupação com as garantias consagradas do cidadão para a sua defesa, que foram subvertidas e transformadas em obstáculos e empecilhos ao “combate” à corrupção.

E os penduricalhos? Numa entrevista ao repórter Fausto Macedo, o presidente da Associação dos Juízes Federais, Roberto Veloso, defendeu o auxílio-moradia pago livre de impostos aos seus pares e procuradores e quando indagado se não havia uma preocupação moral nos casos em que o servidor o recebe tendo casa própria na cidade em que vive, soltou um: “Não estamos com essa preocupação. Não é uma pauta nossa”.

Isso sem falar na decantada morosidade, que nunca se resolve e que vai minando a confiança do cidadão comum, que entra na justiça mas não sabe quando sairá dela. Em 2018 se celebra a passagem de 1968, ano emblemático para o mundo e para o Brasil, que também passava naquele tempo por um período de fortes convulsões sociais, econômicas e políticas que, segundo Zuenir Ventura, se projetaram para além do seu término em dezembro, num ano que não terminou.

Este ano guarda estas mesmas expectativas. Também é um ano que pode não terminar, mas como isso acontecerá é que depende de cada um. É ano de eleições e não há mudanças sociais verdadeiras sem a política. E não há política sem políticos. Todos e cada um de nós tem sua parcela de responsabilidade pelo que está acontecendo no país, nos estados e nos municípios. Pode até parecer uma velha cantilena( e é, porém necessária), mas apenas o voto pode mudar isso.

Não o mesmo voto. Um voto novo. Não em salvadores messiânicos, mas em pessoas que se mostrem comprometidas com o interesse da sociedade. Elas existem. Muitas pessoas, inclusive eu, não querem viver em Portugal ou seja lá qualquer outro lugar. O Brasil é nosso país, nosso lar, nosso lugar e é nossa responsabilidade sua construção.

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