Retrospectiva 2017

De royalties a créditos de Pis/Cofins, o que decidiu o Carf no último ano

Autor

  • Fábio Pallaretti Calcini

    é doutor e mestre em Direito do Estado pela PUC-SP pós-doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra (Portugal) ex-membro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) professor da FGV-Direito SP e Ibet e sócio tributarista da Brasil Salomão e Matthes Advocacia.

3 de janeiro de 2018, 11h00

Da mesma forma que fizemos no final do ano de 2016[1], pretendemos apresentar uma retrospectiva dos principais julgamentos proferidos pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) por meio de sua Câmara Superior (CSRF) no ano de 2017, sem qualquer pretensão de esgotar os temas, bem como realizar crítica a respeito das decisões.

Nesse sentido, a 1ª Turma Câmara Superior proferiu decisões em diversas matérias de sua competência a seguir descritas:

  • Indedutibilidade da base de cálculo do IRPJ e CSLL das contribuições lançadas de ofício, pois, segundo regime de competência, restringe-se aos valores constantes da escrituração comercial (Carf, CSRF, AC. 9101002.996);
  • No tocante à dedutibilidade do PLR, basta que exista acordo formal entre empregador e empregados fixando as regras para pagamento da remuneração, de tal sorte que a ausência da representação sindical na negociação não é suficiente para impedir a dedutibilidade da despesa, para efeitos de apuração do lucro real, quando a mesma representação sindical posteriormente não impõe óbice para o arquivamento do instrumento de acordo celebrado. (Carf, CSRF, AC. 9101003.144);
  • Ainda quanto ao PLR, esta dedutibilidade se submete à regra geral do artigo 299 do Decreto 3000/99, que exige a identificação de sua necessidade, registro como despesa conforme o regime de competência e comprovação de sua efetividade (Carf, CSRF, AC. 9101003.082);
  • Os valores pagos pela controlada à controladora no exterior a título de remuneração pelo licenciamento de direitos sobre programas de computador, ainda de forma indireta, são indedutíveis, bem como os royalties pagos a quaisquer sócios, pessoas físicas ou jurídicas, ou ainda a dirigentes de empresas e a seus parentes ou dependentes, além do fato de que a disposição expressa no Anexo I da IN RFB 1.700, de 2017, determina que as regras de indedutibilidade de royalties, previstas no artigo 71, caput, alínea ‘a’, e parágrafo único, alíneas ‘c’ a ‘g’, da Lei 4.506, de 1964, são aplicáveis apenas ao IRPJ, e não à CSLL. (Carf, CSRF, AC. 9101003.063);
  • Valores significativos do lucro pagos a título de remuneração das debêntures entre empresas ligadas, configura liberalidade, não caracterizando despesa necessária, o que a torna indedutivel (Carf, CSRF, ac. 9101002.973);
  • Os recursos aplicados na formação da lavoura canavieira, integrados ao ativo imobilizado, estão sujeitos à exaustão e não à depreciação, de tal sorte que as agroindústrias não se beneficiam da depreciação acelerada incentivada (Carf, CSRF, AC. 9101003.017);
  • Com relação à agroindústria do setor de abate de aves e suínos, esta descaracteriza a atividade rural, por não se tipificar como avicultura e suinocultura, regidas pelo inciso IV, do artigo 2º, da Lei 8.023/1990, não se aplicando a depreciação acelerada incentivada, pois, o inciso V, do artigo 2º, da Lei 8.023/1990, exige a transformação de produtos agrícolas e pecuários apenas se ajusta ao conceito de atividade rural se a produção ocorrer na área rural explorada, embora seja irrelevante a utilização de equipamentos de alta tecnologia (Carf, CSRF, AC 9101003.226);
  • Com relação à dedutibilidade dos royalties, não houve a revogação do artigo 74 da Lei 3.470/58 pelo artigo 71 da Lei 4.506/64, de tal sorte que se mantem o limite para dedução para tais despesas no limite de 4%, nos termos da Portaria MF 436/58, mesmo para as beneficiários residentes no país (Carf, CSRF, AC. 9101002.572);
  • Possibilidade de tributação no caso de rateio de despesas, quando se constata mero acordo informal celebrado entre controladora e controlada que não se mostra eficaz para lastrear a escrituração e houve efetiva prestação de serviço pela controlada, embora remunerada com ingressos advindos do exterior na forma de recuperação de custos, prevista no artigo 392, inciso II do RIR/99 (Carf, CSRF, AC 9101002.741);
  • Validade da adoção de método de aferição indireta de rateio de despesas quando o contribuinte não fornece à fiscalização os documentos necessários para ser aferido o cumprimento do critério de rateio convencionado (Carf, CSRF, AC. 9101003.003);
  • Os ingressos oriundos da constituição de usufruto oneroso de participações societárias devem ser tributáveis ao longo do período de usufruto ( Carf, CSRF, AC. 9101003.003);
  • Os acordos e convenções internacionais celebrados pelo Governo da República Federativa do Brasil para evitar dupla tributação da renda abrangem a CSLL. Efeitos retroativos da Lei 13.202, de 8.12.2015, expressamente interpretativa (Carf, CSRF, AC. 9101002.598);
  • A dedutibilidade das despesas com o Programa de Alimentação do Trabalhador é regulada pelo o artigo 1º, parágrafo 2º, do Decreto 5/91, diante da impossibilidade de seu afastamento, na via administrativa (Carf, CSRF, AC. 9101002.598);
  • Reconhecimento da não tributação do Probahia e Fundopem, por configurarem subvenção para investimento, seja do ponto de vista da intenção do legislador, como também pelo fato de no caso concreto as ações do ente subvencionado promoveram incrementos no ativo em montante proporcional ao valor do benefício (Carf, CSRF, AC. 9101002.566);
  • Tributação do imóvel rural quanto ao ganho de capital no caso de reforma agrária sendo que o cálculo do ganho de capital deve tomar como valor de venda o constante da escritura de compra e venda, não havendo na legislação do IRPJ e da CSLL qualquer dispositivo que autorize o deságio das TDAs (Carf, CSRF, AC. 9101002.483);
  • Configura planejamento tributário abusivo a economia tributária decorrente da transferência para outra pessoa jurídica do mesmo grupo econômico, de parte das atividades que vinham sendo exercidas pelo sujeito passivo, quando houver comprovação de que a outra pessoa jurídica não possuía as condições materiais necessárias para efetivamente desenvolver as atividades que, por contrato, lhe foram transferidas (Carf, CSRF, AC. 9101002.880).

É natural que outros temas relevantes também foram julgados, mas, em geral, mantiveram posicionamento já firmado durante o ano de 2016 como o caso do ágio, limitação dos prejuízos, preço de transferência, entre outros.

Por outro lado, a Segunda Turma da Câmara Superior, enfrentou alguns temas previdenciários, assim decidindo:

  • Configura salário-de-contribuição os valores pagos com habitualidade aos empregados a título de aluguel de seus veículos, decorrentes da relação laboral com a empresa, quando as despesas incorridas na sua utilização não são comprovadas (Carf, CSRF, AC. 9202006.034), como também aqueles automóveis cedidos com habitualidade para gerentes decorrente da relação laboral (CARF, CSRF, AC. 9202006.133);
  • Os prêmios com pagamento em pecúnia, ainda que não habituais, por não serem eventuais gerando tributação (CARF, CSRF, AC. 9202006.133);
  • Quanto ao PLR e a periodicidade, vedou-se o pagamento de qualquer antecipação em periodicidade inferior a um semestre civil, ou mais de duas vezes no mesmo ano civil (CARF, CSRF, AC. 9202005.719);
  • Ainda no tocante ao PLR, com relação regras e metas para percepção, os instrumentos decorrentes de negociação deverão conter regras claras e objetivas quanto à fixação dos direitos substantivos de participação nos lucros ou resultados, sendo necessário, assim, a existência de mecanismos de aferição do resultado do esforço inteiramente presentes no acordo já em sua celebração, para que possam ser conhecidos e escrutinados pelos envolvidos na negociação (Carf, CSRF, AC. 9202005.707);
  • Não incide contribuição previdenciária sobre valor pago à título de seguro de vida em grupo, independentemente da existência ou não de convenção ou acordo coletivo de trabalho (Carf, CSRF, AC. 9202005.318);
  • Diante do fato de que o pagamento do bônus de contratação se deu de forma a retribuir os trabalhos prestados na empresa contratante, com expressa determinação contratual de que o mesmo substitui e engloba todas as vantagens que o empregado poderia auferir no exercício de suas funções junto ao contratante, além de exigir-lhe tempo mínimo de permanência na empresa, é de se reconhecer a natureza salarial da verba, devendo compor a base de cálculo das contribuições previdenciárias lançadas (Carf, CSRF, AC. 9202005.156);
  • Os pagamentos efetuados a funcionários, executivos e demais prestadores de serviço da empresa, por meio de opção de compra de ações (“stock options”), caracterizam-se como remuneração, constituindo-se, assim, em fato gerador das contribuições previdenciárias (Carf, CSRF, AC. 9202005.470).

Da mesma forma, também se posicionou em outros assuntos da seguinte maneira:

  • ITR: a. Incabível a manutenção do arbitramento com base no SIPT, quando o VTN é apurado adotando-se o valor médio das DITR do município, sem levar-se em conta a aptidão agrícola do imóvel (Carf, CSRF. AC. 9202005.781); b. cabe a a dedução de áreas de preservação permanente da base de cálculo do ITR, a partir do exercício de 2001, quando houver apresentação do Ato Declaratório Ambiental (ADA) até o início da ação fiscal e desde que comprovada a existência da área deduzida, além de não ser possível a glosa de área de reserva legal, por falta daquele ato, quando consta a respectiva averbação na matrícula do imóvel e, nos casos de ser mero possuidor, haver comprovação pelo contribuinte da celebração de Termo de Responsabilidade com o Poder Público antes da ocorrência do fato gerador (Carf, CSRF, AC. 9202005.773);
  • IRPF: quanto ao ganho de capital na cessão para terceiros de precatório judicial, há incidência do IRPF, sendo o custo de aquisição igual a zero (Carf, CSRF, AC. 9202005.322).
  • Por fim, a Terceira Turma da Câmara Superior julgou diversos assuntos, em especial, quanto ao PIS/Cofins no regime não cumulativo reconheceu diversos créditos, entre eles:
  • Frete entre estabelecimentos da mesma empresa de produtos acabados e matérias-primas destinadas ao processo produtivo (Carf, CSRF, AC. 9303005.156);
  • Os materiais de segurança ou proteção individual, tais como: avental, bota, botina, capacete, creme protetor, máscaras, meia, protetor auricular, protetor facial e botas sete léguas; materiais de uso geral (arruela, mangueira, rodinho, chave allen, chave boca, chave fenda, lâmpadas, parafuso allen, parafuso bucha, parafuso sextavado, porca inox, retentor, rolamento, tubo galvanizado e tubo PVC) (Carf, CSRF, AC. 9303005.527);
  • Serviço de limpeza e passagem (remoção de minério para permitir a passagem de veículos extratores de caulim); serviço de locação de equipamentos para a extração do minério; serviço de decapeamento (retirada de vegetação e solo); serviço de lavra (extração do minério da natureza); e, finalmente, e) Óleo diesel (utilizado nos caminhões para transporte de caulim) (Carf, CSRF, AC. 9303005.623);
  • Combustíveis e lubrificantes utilizados nos veículos da empresa no transporte de matéria prima dos frigoríficos para a indústria e desta, após a industrialização para seus compradores e portos onde serão exportados (Carf, CSRF, AC. 9303004.622);
  • Aquisição de gás para empilhadeira (embalagens tambores) para transporte e armazenagem de alimentos (Carf, CSRF, AC. 9303004.896);
  • Embalagens de acondicionamento utilizadas para a preservação das características dos produtos durante o seu transporte (Carf, CSRF, AC. 9303005.670);
  • Equipamentos de proteção individual (EPIs) (Carf, CSRF, AC. 9303005.601); produtos químicos utilizados na assepsia e higienização dos tanques de transportes do leite caminhões, silos e equipamentos industriais (Carf, CSRF, AC. 9303005.641);
  • Possibilidade de crédito da fase agrícola para agroindústria de cana-de-açúcar, entre eles aquisições de serviços de análise de calcário e fertilizantes, serviços de carregamento, análise de solo e adubos, transportes de adubo/gesso, transportes de bagaço, transportes de barro/argila, transportes de calcário/fertilizante, transportes de combustível, transportes de sementes, transportes de equipamentos/materiais agrícola e industrial, transporte de fuligem/cascalho/pedras/terra/tocos, transporte de materiais diversos, transporte de mudas de cana, transporte de resíduos industriais, transporte de torta de filtro, transporte de vinhaças, serviços de carregamento e serviços de movimentação de mercadoria, bem como os serviços de manutenção em roçadeiras, manutenção em ferramentas e manutenção de rádios amadores, e a aquisição de graxas e de materiais de limpeza de equipamentos e máquinas (Carf, CSRF, AC. 9303004.918);
  • Bens e serviços, inclusive combustíveis e lubrificantes, utilizados como insumo na produção da empresa atividade de extração mineral, incluindo a etapa de remoção de rejeitos/resíduos, bem como despesas com aluguel de máquinas e equipamentos, utilizados na atividade da empresa atividade de extração mineral, incluindo a etapa de remoção de rejeitos/resíduos (Carf, CSRF, AC. 9303005.288).

De outra parte negou créditos no regime não cumulativo, como por exemplo:

  • Frete nas aquisições com alíquota zero, suspensão (Carf, CSRF, AC. 9303005.156); insumos da agroindústria canavieira na fase agrícola para produção de cana-de-açúcar (Carf, CSRF, AC. 9303005.532);
  • Despesas e custos decorrentes de serviços de apoio administrativo, serviços gerais, gastos com pessoal e diversos, remuneração e participação nos resultados pagos a inativos da diretoria (Carf, CSRF, AC. 9303005.528);
  • As despesas com o frete contratado para promover a transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica não geram créditos (Carf, CSRF, AC. 9303005.527);
  • Fornecimento de jantar, serviço especializado de vigilância, serviço de transporte de funcionários, serviço de alteamento, serviço de melhoria das estradas (Carf, CSRF, AC. 9303005.623);
  • Venda de seguro de garantia estendida pois prévio ao processo produtivo (Carf, CSRF, AC. 9303004.136);
  • Peças para a manutenção de máquinas e equipamentos (Carf, CSRF, AC. 9303004.687);
  • Alimentação, laudo técnico, assistência médica, combustível de empilhadeira, despesas com importação, despesas com transporte, despesas com veículos, indumentária e material de trabalho, laboratório, material de expediente, material de segurança, pedágio, resíduos industriais e sistema de tratamento de água (Carf, CSRF, AC 9303005.669);
  • Gastos com aquisições de produtos químicos utilizados no tratamento de resíduos industriais (Carf, CSRF, AC. 9303005.641).

Ademais com relação à noção de receita e hipótese de exclusão da base de cálculo para PIS/Cofins, decidiu:

  • Veículo de propaganda não pode excluir da base de cálculo do PIS, valores recebidos de anunciantes valores das faturas /notas fiscais de serviços por se tratar custos e despesas (Carf, CSRF, AC. 9303005.504);
  • Os créditos incentivados de ICMS, concedidos pelos estados a setores econômicos ou regiões em que haja interesse especial, não se encartam no conceito e natureza de “receita” para fins de incidência das contribuições destinadas ao PIS e à Cofins, pois não constituem entrada de recursos que refletem aumento de riqueza em seu patrimônio (Carf, CSRF, AC. 9303004.674);
  • A base de cálculo do PIS e da Cofins é a totalidade da receita operacional, não se permitindo a exclusão de valores repassados a terceiros, em virtude da subcontratação de serviços (Carf, CSRF, AC. 9303005.276).

Enfim, quanto ao IOF, firmou posicionamento no sentido de que a disponibilização e/ou a transferência de créditos financeiros a outras pessoas jurídicas, ainda que realizadas, sem contratos escritos, mediante a escrituração contábil dos valores cedidos e/ ou transferidos, constitui operação de mútuo (Carf, CSRF, AC. 9303005.582).

Sem pretensão de esgotamento, são algumas das decisões relevantes de 2017 do CARF que merecem destaque.

Autores

  • é advogado tributarista, sócio do Brasil Salomão e Matthes Advocacia. É doutor e mestre em Direito do Estado pela PUC-SP, pós-doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra (Portugal) e ex–membro do Carf.

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