Conduta incompatível

Desembargador pode ser afastado em caso de crime comum grave, diz STJ

Autor

25 de fevereiro de 2018, 14h59

Ainda que não se tratando de crime funcional, um magistrado deve ser afastado caso o crime comum seja grave para o exercício da função. Com base nesse entendimento a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça recebeu denúncia e determinou o afastamento cautelar de um desembargador do Paraná até o julgamento da ação penal, ainda sem data prevista.

Por unanimidade, o colegiado recebeu denúncia contra o magistrado por crime de lesão corporal contra a mãe e uma irmã, em 2014. O afastamento não inclui interrupção do recebimento de salário e benefícios.

A denúncia do Ministério Público Federal foi formulada com base na Lei Maria da Penha. Conforme a ação, houve um bate-boca quando os irmãos tratavam sobre os cuidados a serem dispensados aos pais. De repente, segundo o MP-PR, o magistrado teria atingido a mãe, de mais de 80 anos.

O relator do caso, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, votou pelo recebimento da denúncia por entender que há indícios razoáveis de autoria e prova de materialidade do crime. Para ele, a denúncia demonstra a existência de “lastro probatório mínimo”, suficiente para indicar “a possível prática do crime de lesão corporal”. No entanto, considerou que o afastamento seria medida “desarrazoada e desproporcional” pelo crime não ter sido cometido no exercício da função. Além disso, a pena máxima prevista em caso de lesão corporal não resultaria na perda do cargo de desembargador.

Para os ministros que votaram pelo afastamento, a conduta imputada ao magistrado é grave, incompatível com o exercício da atividade, o que justifica a medida. O ministro Jorge Mussi abriu a divergência ao votar a favor do afastamento do desembargador, mas para a decisão foi necessário o voto da presidente do STJ, ministra Laurita Vaz, já que a medida exige o quórum qualificado de dois terços dos membros do colegiado — no caso, dez votos.

Ao acompanhar a divergência, o ministro Og Fernandes afirmou que “o que estabelece a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) sobre o decoro e comportamento é um ônus, parecendo-me haver incompatibilidade do exercício da função com o tipo penal.” A ministra Nancy Andrighi ponderou que “para o bem da Justiça como instituição e a lisura total do julgamento, é necessário o afastamento.”

Com posição contrária, o ministro Raul Araújo julgou precipitado o afastamento. “As irmãs estavam munidas de gravador. A pessoa pode ter sido provocada a tal ponto que ela perde o bom senso numa fração de segundos. Não vejo razões para considerarmos de já incompatível com a magistratura o comportamento, que não sabemos em detalhes como se deu. Será que foi provocado até a última resistência?”

Durante a decisão, os ministros lembraram que este mesmo magistrado já responde a outra denúncia, aceita pela Corte Especial em novembro de 2017, desta vez pela agressão a uma dona de casa. Segundo o MPF, em meio a uma discussão em que o desembargador foi acusado pela mulher de jogar entulho no terreno dela, foi agredida por ele. Um policial aposentado interveio e deu voz de prisão ao magistrado. Este também deu voz de prisão ao policial. O afastamento não foi determinado na época por não ter alcançado o quórum necessário.

O ministro Mauro Campbell lembrou esta outra ação recebida pelo STJ, como também o fez o ministro Humberto Martins: “aparentemente, o grau de tolerância do magistrado é zero”. “Agride a vizinha com a pá, a irmã com socos. Isso foge aos padrões éticos de conduta do magistrado, que tem que ter temperança, prudência, sensibilidade e sobretudo sentimento ético”.

APn 835

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!