Seleção do júri

Juiz dos EUA impõe "ordem de silêncio" até julgamento de Claudia Sobral

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18 de fevereiro de 2018, 10h12

O juiz Andrew Logan, que vai presidir o julgamento da ex-brasileira Claudia Sobral (Claudia Hoerig nos EUA), no fórum criminal do Condado de Trumbull, em Ohio, emitiu uma “ordem de silêncio” sobre o caso. Claudia é acusada de homicídio qualificado. Supostamente, em 2007 ela matou com dois tiros seu então marido Kark Hoerig e fugiu para o Brasil, onde nacesu. Em 17 de janeiro deste ano ela foi extraditada para os EUA, depois de ter a cidadania brasileira cassada pelo Ministério da Justiça. Na audiência preliminar, ela se declarou “não culpada”.

Chamada de gag order (ordem da mordaça) nos EUA, essa medida proíbe os advogados, promotores, servidores da corte e qualquer autoridade pública de prestar informações ou fazer comentários sobre o caso. Proíbe ainda discutir “méritos, defesas, fatos ou qualquer outra matéria relacionada à ação criminal, fora das audiências ou dos autos do processo”.

A “ordem de silêncio” tem dois objetivos fundamentais. Um deles é o de conter a publicidade do caso, que tende a voltar a opinião pública contra o réu (ou ré, no caso). Isso prejudica a defesa e dificulta a realização de um julgamento justo e imparcial, por criar preconceitos.

Outro motivo, tão ou mais importante, é facilitar a seleção do júri. No início do processo de seleção do júri, o juiz pergunta a todos os candidatos a jurados se alguém tem conhecimento dos fatos que serão examinados no julgamento. Quem tiver é eliminado.

A razão é a de que as pessoas que conhecem os fatos provavelmente já fizeram um pré-julgamento sobre a culpa ou inocência do réu. Nesse caso, torna-se muito difícil para a defesa – e, às vezes, também da acusação – convencer um jurado que já entra no julgamento com uma opinião formada.

Ao contrário, as pessoas que nunca ouviram falar sobre o caso, irão deliberar sobre culpa ou inocência do réu apenas com base nos fatos, provas e testemunhos que forem apresentados durante o julgamento. A pessoa que entrou no julgamento já com uma opinião formada, só poderá dar atenção (ou importância) ao que confirmar seu pré-julgamento.

Nos EUA, a seleção do júri é feita em conjunto pelo juiz, promotor e advogado de defesa. Os candidatos a jurados formam um grupo, chamado de pool ou painel, de pelos menos três vezes o número de jurados a serem escolhidos – normalmente, de seis a 23 jurados. A quantidade mais comum é a de 12 jurados, em casos criminais. No julgamento de Claudia, em Ohio, deverão ser 12 jurados.

Em casos de alta repercussão pública, chamados de high profile cases, o pool deve ser muito maior, porque é difícil encontrar pessoas que ignorem totalmente fatos que estão todos os dias na televisão e nos jornais.

No julgamento de O.J. Simpson, uma celebridade do futebol americano, da televisão e do cinema, foi necessário formar um pool inicial de 304 candidatos. E isso só foi suficiente porque o promotor e o advogado de defesa fizeram algumas concessões. Do contrário, não haveria julgamento. No final, tiveram de excluir jurados já escolhidos. Alguns deles disfarçaram seus preconceitos, porque não queriam perder o julgamento.

Depois de intimados para compor o pool de candidatos, os escolhidos preenchem um questionário. E, no momento da seleção, respondem a perguntas do juiz, do promotor e do advogado. O objetivo comum é, acima de tudo, eliminar candidatos com opinião formada (por conhecer os fatos e já ter feito um pré-julgamento) ou com algum tipo de preconceito. O interrogatório dos candidatos é chamado de voir dire (falar a verdade).

O advogado de defesa e o promotor podem eliminar um certo número de candidatos por “recusa motivada” (challenge for cause) ou por “recusa imotivada” (peremptory challenge). A recusa motivada geralmente se baseia na percepção de preconceito real ou implícito – e precisa ser justificada para o juiz, que toma a decisão de excluir ou não o candidato.

A recusa imotivada não se baseia em nada além de uma percepção de que pode haver um preconceito, devido a uma ou outra circunstância, ou dá a impressão de que o candidato vai favorecer a outra parte – e não precisa ser justificada. Mas não pode ser usada para excluir candidatos com base em raça ou classe social.

Como o número de candidatos que formam o pool, o número de candidatos que podem ser eliminados varia de estado para estado e depende da natureza do caso (contravenção penal, crime, crime que acarreta pena de prisão perpétua ou pena de morte).

Apesar de esse processo de seleção do júri ser considerado ideal para a Justiça, por afastar pré-julgamentos, entrar no julgamento no escuro pode ser muito frustrante para os jurados.

Um exemplo típico foi o julgamento de George Zimmerman, o vigilante que matou um jovem estudante negro desarmado. O advogado de defesa fez um trabalho mais convincente do que os promotores, que incluiu dramatização da cena de uma suposta luta entre os dois, o que resultou na absolvição do réu. Depois do julgamento, vários jurados se declararam arrependidos, após tomar conhecimento dos fatos e da revolta pública fora do tribunal.

Em outro exemplo, um júri deliberou que uma mulher negra que deu um tiro de advertência para impedir que seu ex-marido a agredisse, dentro de sua casa, era culpada. O promotor convenceu os jurados que a mulher cometeu um crime porque o tiro ricocheteou na parede e poderia ter atingido seus filhos.

Como o crime foi qualificado como assalto à mão armada, o juiz teve de aplicar a pena mínima de 20 anos de prisão. Os jurados, arrependidos, pensavam que ela iria pegar uma pena pequena por colocar os filhos em risco e não uma pena tão alta. Só souberam depois do julgamento. O próprio juiz lamentou a condenação na sentença. Se ela tivesse atirado na cabeça do ex-marido, para matar, teria ficado em liberdade.

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