Opinião

Se não houver folga, trabalho prestado em feriado deve ser pago em dobro

Autor

  • Ricardo Calcini

    é professor advogado parecerista e consultor trabalhista. Atuação estratégica e especializada nos Tribunais (TRTs TST e STF). Coordenador trabalhista da Editora Mizuno. Membro do Comitê Técnico da Revista Síntese Trabalhista e Previdenciária. Membro e Pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo (Getrab-USP) do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.

11 de fevereiro de 2018, 5h37

Temática bastante frequente em processos trabalhistas, o trabalho prestado em feriado diz respeito ao seguinte caso prático: o funcionário que vier a trabalhar em escala de revezamento — por exemplo, 4×2 ou 5×2 — e que preste serviço no dia de feriado, lhe é devido ou não o direito à remuneração em dobro, considerando que o labor se realizará em dia normal que coincida com o feriado devido à escala de revezamento?

E, neste ponto, impende salientar que a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) não trata especificadamente da temática do feriado, uma vez que há apenas uma singela referência no artigo 70, dizendo que feriados serão objeto de legislação própria, cuja regulamentação ocorreu por meio da Lei 605/1949.

Por seu turno, a Lei 605/49 concedeu a todos os empregados urbanos, rurais ou trabalhadores avulsos o direito ao descanso semanal remunerado de 24 horas consecutivas, preferencialmente aos domingos e nos dias feriados civis e religiosos, na forma do artigo 7º, XV e XXXIV, da Constituição do Brasil.

Assim, para o Direito do Trabalho, os feriados são lapsos temporais de um dia, situados ao longo do ano-calendário, eleitos pela legislação em face de datas comemorativas cívicas ou religiosas específicas, em que o empregado pode sustar a prestação de serviços e sua disponibilidade perante o empregador.

Feita tal contextualização, e em resposta à interessante dúvida trazida em sala de aula, é correto afirmar que, para o trabalho prestado em feriado, não compensado, é devido, sim, seu pagamento de forma dobrada. Isso porque, ainda que seja um dia normal de serviço para o funcionário que labore em escala 4×2 ou 5×2, imperativa se torna a adoção do entendimento consubstanciado na Súmula 146 do Tribunal Superior do Trabalho, in verbis:

SUM-146 TRABALHO EM DOMINGOS E FERIADOS, NÃO COMPENSADO (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 93 da SBDI-I) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.
O trabalho prestado em domingos e feriados, não compensado, deve ser pago em dobro, sem prejuízo da remuneração relativa ao repouso semanal.

Note-se que o citado verbete sumular não faz distinção em relação ao regime da escala de trabalho a que estiver submetido o funcionário. Ao contrário, o entendimento jurisprudencial é bastante claro ao dispor que, via de regra, prestar serviços em domingos e feriados enseja o pagamento da remuneração em dobro, isto é, acrescido do adicional de 100%, salvo se for concedida folga compensatória.

Assim, é possível afirmar que os feriados não estão incluídos em tais regimes de compensação e, portanto, se o dia de trabalho da escala recair em feriado, o empregador deverá pagá-lo em dobro, salvo se conceder folga compensatória além daquela prevista na escala.

Essa é a razão pela qual, inclusive, se editou à época a Súmula 444 do TST e que diz respeito ao regime especial 12×36 da jornada de trabalho:

SUM-444 JORNADA DE TRABALHO. NORMA COLETIVA. LEI. ESCALA DE 12 POR 36. VALIDADE – Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 – republicada em decorrência do despacho proferido no processo TST-PA-504280/2012.2 – DEJT divulgado em 26.11.2012
É válida, em caráter excepcional, a jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis de descanso, prevista em lei ou ajustada exclusivamente mediante acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho, assegurada a remuneração em dobro dos feriados trabalhados. O empregado não tem direito ao pagamento de adicional referente ao labor prestado na décima primeira e décima segunda horas.

De mais a mais, a reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) nada contribuiu para o deslinde da presente discussão. Ao contrário, o texto da Medida Provisória 808, de 14 de novembro de 2017, apenas se limitou a dispor que “é facultado às entidades atuantes no setor de saúde estabelecer, por meio de acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação” (CLT, artigo 59, parágrafo 2º).

Assim sendo, o labor em dias de feriado não é compensado com a adoção de escalas 4×2 ou 5×2, sendo devido seu pagamento em dobro, tendo em vista que os feriados possuem característica única, por permitir ao empregado sua inserção no âmbito de sua comunidade, seja como sujeito político (feriados civis), seja como ser espiritual (feriados religiosos), sendo tais datas festivas insusceptíveis de regular compensação simples, tal como acontece com o repouso semanal remunerado.

Pensamento em sentido contrário, no caso, não se coaduna com a finalidade protetiva do arcabouço normativo celetista, cuja melhor interpretação jamais será aquela que venha a restringir os direitos conferidos aos trabalhadores. Ao revés, o objetivo da legislação é permitir que o funcionário desfrute do convívio social e familiar, servindo a remuneração qualificada para ao menos tentar compensar o trabalho exercido pelo labor em feriados.

Nesse prumo, inclusive, é a diretriz adotada pelo TRT da 2ª Região (SP), na Súmula Regional 58, que, em seu item II, preceitua, expressamente, que “os feriados laborados na escala 4×2 devem ser remunerados em dobro, por ausência de compensação”. O mesmo raciocínio, por corolário lógico, também é aplicável à escala 5×2 da jornada de trabalho.

Logo, se não for concedido o descanso do feriado ao empregado, a remuneração pelo trabalho em tal dia, ainda que em escala 4×2 ou 5×2, deverá ser paga em dobro, consoante dispõem o artigo 9º da Lei 605/49 c/c artigo 6º, parágrafo 3º, do Decreto 27.048/49 c/c Súmula 461 do STF.

Autores

  • é mestrando em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pós-graduado em Direito Processual Civil pela Escola Paulista da Magistratura do TJ-SP, especialista em Direito Social pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, instrutor de Treinamentos “In Company” e de Eventos Corporativos, professor convidado e palestrante em cursos jurídicos e de pós-graduação, assessor de desembargador e professor da EJUD no TRT-2 (SP). Membro do IBDSCJ, da ABDPC, do Ceapro, da ABDPro, da ABDConst, do IDA e do IBDD.

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