Liberdade de cátedra

Universidades têm autonomia para dar "curso do golpe", diz juíza

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31 de dezembro de 2018, 11h43

A Constituição elegeu como um dos valores da República a liberdade de ensino, que assegura o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, como sinaliza o artigo 206, inciso II. Assim, como as universidades gozam de autonomia científica, prevista no artigo 207, não podem ser impedidas de promover determinado curso, mesmo que desagrade a setores da sociedade.

Com este entendimento, a 1ª Vara Federal de Porto Alegre julgou improcedente Ação Popular que pretendia impedir a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) de ministrar o curso denominado ‘‘O golpe de 2016 e a nova onda conservadora do Brasil’’, que vem sendo ministrado desde março pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.

O advogado Fernando Rodrigues Lopes, autor da ação, alega que o título atribuído ao curso não é razoável e não atende aos princípios da legalidade e moralidade administrativa a que se sujeita a universidade. Após defender a legalidade do processo de impeachment da presidente Dilma Roussef, em agosto de 2016, disse que o curso não só afronta a lei como beneficia a narrativa de um partido político – o PT.

A juíza federal Marciane Bonzanini, que havia rejeitado a suspensão do curso em caráter liminar, em abril, manteve o teor de sua decisão para embasar a sentença de mérito, julgando improcedente a ação. Cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 4ª. Região.

Para a julgadora, o propósito de tolher o conteúdo da manifestação docente realizada em âmbito universitário não pode ser considerado como lícito à luz dos princípios constitucionais e legais atinentes à educação nacional. É que as normas de nível hierárquico superior determinam a gestão democrática e o pluralismo das ideias e de concepções pedagógicas, e não o banimento, a priori, de quaisquer manifestações.

Citando parecer do Ministério Público Federal, a julgadora observou que a universidade, enquanto espaço destinado à formação de valores e narrativas ‘‘não necessariamente unívocos, mas fatalmente dialéticos’’, pode muito bem abrigar curso sobre esta temática, considerando as diversas narrativas sobre o impeachment.

Assim, segundo Marilene Bonzanini, o Poder Judiciário, em nenhuma hipótese, pode analisar o mérito sobre o teor de cursos oferecido pela UFRGS ou por qualquer outra instituição de ensino. Especialmente em face da autonomia didático-científica das universidades, conforme preceitua o artigo 207, caput, da Constituição da República, princípio este intrinsecamente interligado ao da liberdade de ensino.

‘‘Nesse sentido, não compete a este Juízo analisar os critérios a partir dos quais o IFCH/UFRGS concebeu e ofereceu aos estudantes de graduação e pós-graduação o curso denominado ‘O golpe de 2016 e a nova onda conservadora do Brasil’, a menos que estivessem sendo feridos direitos fundamentais. Não é, sequer ao longe, o caso do curso impugnado na inicial. Ao contrário, a intervenção judicial pretendida é que feriria os preceitos constitucionais, base de um sistema democrático’’, anotou na sentença.

Clique aqui para ler a íntegra da sentença.

Processo 5009227-87.2018.4.04.7100/RS

 

 

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