Reflexões trabalhistas

Nexo causal da doença com o trabalho se mede por razoável probabilidade

Autor

  • Raimundo Simão de Melo

    é consultor Jurídico advogado procurador regional do Trabalho aposentado doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e autor de livros jurídicos.

28 de dezembro de 2018, 7h00

Como mostram os fatos da vida, nem sempre há certeza absoluta sobre o nexo causal ou concausal da doença com o trabalho, mas, de outro lado, pode existir elevado grau de probabilidade sobre a configuração desse nexo com o trabalho da vítima, o que deve ser levado em conta pelos julgadores. O médico perito tem papel importante no auxílio ao juiz para reconhecer ou não o nexo causal ou concausal das doenças com as condições de trabalho relatadas pelas vítimas e decidir a questão. Por se tratar de questão complexa e porque a ciência médica não é exata, comumente os juízes divergem nas várias instâncias sobre o seu reconhecimento.

Serve de exemplo o caso a seguir descrito, no qual foi juntado Laudo Pericial fundamentado, onde o perito constatou que "a LMC (Leucemia Mielóide Crônica) é uma doença que pode ser desencadeada pela exposição laboral ao benzeno; que o benzeno é utilizado na produção de borracha e na produção de pneus; que o reclamante laborou exposto ao benzeno junto à reclamada e na admissão não apresentava a doença, que foi diagnosticada 2 anos e 4 meses depois de iniciar suas atividades junto à reclamada; que o reclamante veio a óbito em uma crise blástica (agudizada) de Leucemia Mielóide Crônica", concluindo que houve nexo causal da doença com a exposição ao benzeno.

Não obstante isso, a primeira instância entendeu que não restou provado o nexo causal da doença com as condições de trabalho, julgando improcedentes os pedidos de reparação em favor dos sucessores da vítima, o que, todavia, foi alterado pelo E. TRT da 15ª Região, cuja decisão ficou assim ementada:

EMENTA. EXPOSIÇÃO AO BENZENO PRESENTE NA INDÚSTRIA DE PNEUS. AQUISIÇÃO, PELO TRABALHADOR, DE DOENÇA QUE A LEGISLAÇÃO RECONHECE COMO DECORRENTE DA EXPOSIÇÃO AO PRODUTO QUÍMICO, A SABER, LEUCEMIA MIELÓIDE CRÔNICA. DEVER DE INDENIZAR. O benzeno é listado na Lei 8.213/91 como agente patogênico causador de doença profissional, como estabelecido no anexo I do art. 20 da Lei 8.213/91, que indica as atividades onde é empregado. No anexo II do mesmo dispositivo legal, o benzeno é apontado como agente de risco para o aparecimento de 16 doenças ocupacionais, sendo a primeira das patologias listadas a leucemia. Provado que o trabalhador laborou em condições inadequadas e submetido aos gases emanados da produção de pneus que incomodava não só aos trabalhadores, mas a população local e provado que adquiriu Leucemia Mielóide Crônica no curso do contrato de trabalho, patente o dever do empregador de reparar o dano (Proc. TRT/15 n. 0065800-37.2007.5.15.0082).

Assim, agregado a outros fatores colhidos nos autos, o juiz, valendo-se da prudência e da lógica do razoável decidirá o caso, acolhendo ou não o nexo causal ou concausal entre a doença e as condições de trabalho, como mostra a decisão a seguir ementada:

EMENTA: “Acidente do trabalho — Benefício — Conversão — Aposentadoria previdenciária em acidentária — Doença — Mal da coluna — Nexo causal — Prova. A presença do nexo causal se mede por razoável probabilidade, não por matemática certeza, mesmo porque a ciência médica não é exata. Se o fosse, as calculadoras seriam feitas para os médicos e esses estariam livres de todas as acusações e indenizações pelos erros que vivem cometendo. Vale dizer, é o possível lógico, não o absolutamente certo, que embasa a conclusão pela presença do nexo causal e concausal. Cabe converter a aposentadoria por invalidez previdenciária na homônima acidentária, ainda que calculadas ambas com um percentual de 100% do salário de benefício, para que, com que o correto enquadramento jurídico da incapacidade do segurado, possa ele gozar de todas as implicações daí advindas, mormente as indiretas, dentre estas a eventual geração de responsabilidade baseada no direito comum” (STACIVSP, 12ª Câmara, Apelação n. 690.457/5, Relator Juiz Palma Bisson, 28.8.2003).

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    é consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado, doutor e mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP e professor titular do Centro Universitário UDF e da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (SP), além de membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho. Autor de livros jurídicos, entre outros, Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador e Ações acidentárias na Justiça do Trabalho.

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