Opinião

O ambiente dos negócios e o novo Código Comercial

Autor

  • Carlos Henrique Abrão

    é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo doutor em Direito Comercial pela USP com especialização em Paris professor pesquisador convidado da Universidade de Heidelberg e autor de obras e artigos.

25 de dezembro de 2018, 8h25

Não passou despercebida, embora no apagar das luzes do atual Parlamento, a aprovação do relatório preliminar do Senador Pedro Chaves disciplinando o novo Código Comercial, cuja previsão de aprovação será missão dos novos integrantes do Congresso Nacional, os quais assumirão seus mandatos em janeiro de 2019.

Entretanto, não seremos uma voz que clama no deserto, porque se nos calarmos as próprias pedras gritarão, haja vista que, embora o novo texto seja digno de elogios em alguns aspectos de aprimoramento pelo Senado, existem pecados capitais, os quais não empolgam no ritmo de discussão ampla no ano de 2019.

Os Livros III, IV e V, que tratam do agronegócio, direito comercial marítimo e processo empresarial, ressentem-se de vários pontos negativos de limitação da responsabilidade, prejudicando a vida do produtor rural e ainda não demonstrando boa vontade em relação ao tema do seguro, criando desnecessariamente um entrechoque de interesses entre leis esparsas e extravagantes.

O ambiente de negócios no Brasil, como a operação "lava jato" demonstrou e os dados estatísticos revelaram, é um dos piores do planeta. Nossas estradas ficam atrás daquelas da Mongólia; em três anos, 13 mil indústrias fecharam; não há concorrência, mas mero monopólio ou duopólio.

Significa dizer que, antes de um inócuo Código Comercial, precisamos trabalhar em um Código de Ética Empresarial, na mudança de relacionamento entre os poderes público e privado e na repaginação das agências reguladoras. Tanto assim que as concessionárias de transporte aéreo Oi e Avianca, com dívidas bilionárias, expõem consumidores a situação de risco de solução de continuidade dos serviços, quando muito mais simples e fácil seria determinar a quebra da empresa e permitir a continuação do negócio da falência com a mudança do controlador, sem sucessão de qualquer espécie.

Os países avançados buscam microssistemas funcionais, e as maiores economias do planeta — a norte-americana e a chinesa — não se pautam por códigos legais, tanto assim que a informalidade predomina e a maioria dos contratos de parceria, participação, delegação, fornecimento e distribuição estão hospedados na própria infraestrutura e na lógica do mercado.

Os avanços trazidos pelo projeto provisoriamente aprovado pelo Senado são insignificantes diante das vicissitudes e entrechoques nos campos societário e de responsabilidade empresarial, penhora de faturamento e criação de novas sociedades, inclusive profissional, estando a economia há mais de uma década engasgada, com seguidos Produtos Internos Brutos negativos. Enquanto isso, nosso legislador parece dormir em berço esplêndido, quando necessitaríamos ao menos duas reformas estruturantes: a tributária e a previdenciária.

Consequentemente, os dividendos a serem colhidos serão absolutamente inexpressivos ou nulos, e cuja codificação vai na contramão da História, das economias desenvolvidas e do liberalismo. Mais grave ainda, desconhece a economicidade e adota princípios gerais desconexos e que irão fragmentar ainda mais a jurisprudência.

É extremamente ilógico sustentar que o Código Civil mais atrapalhou do que beneficiou o moderno Direito Empresarial do Século XXI. Mas a aprovação pelo Congresso do atual projeto representaria enorme retrocesso e colidiria com os objetivos do atual governo de abertura de mercado, livre concorrência, fim dos monopólios e oligopólios e quebra dos duopólios, já que necessitamos juros bancários que não sejam pornográficos e o barateamento das aberturas de capital das companhias.

Comparativamente, as Bolsas de Valores do Brasil, Estados Unidos e China apresentam forte assimetria na listagem das empresas e no volume dos negócios. Daí porque, se não olharmos para grandes reformas consubstanciando a macroeconomia do amanhã, o nosso Parlamento estará dando um tiro no pé e aprovando leis que em nada modificarão o cenário sombrio de uma crise que se alastra acarretando 13 milhões de desempregados, concentração bancária, benefícios fiscais e isenções – ingredientes estes que jamais poderão colaborar com a construção do Direito Empresarial amparado em tecnologias do Século XXI.

A situação atual das companhias aéreas, por si só, com a edição de Medida Provisória liberando 100% do mercado para as empresas estrangeiras, bem demonstra quão é incipiente nosso ambiente de negócios, contaminado por preços não competitivos, cuja reengenharia precisa revisitar a fundação de uma nova eticidade concorrencial no mercado empresarial brasileiro.

O ideal seria trabalharmos mediante microssistemas que favorecessem toda a estrutura. Basta uma greve de caminhoneiros no país para mostrar que a codificação e as esperanças de incrementos na economia são mera fumaça, sem brilho, fruto da teatralização para alguns levarem vantagem na chamada Lei de Gérson. E a maioria, principalmente pequenos e médios empresários, pagam a conta.

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