Transações da Petrobras

Marco Aurélio susta norma que permite cessão de direitos sobre campos de petróleo

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19 de dezembro de 2018, 15h16

A Constituição estabelece que apenas lei, submetida ao Congresso Nacional, pode disciplinar licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações para sociedades de economia mista. Assim, o Decreto 9.355/2018, que regulamentou a cessão, pela Petrobras, de direitos de exploração, desenvolvimento e produção em campos de petróleo, é inconstitucional. Com esse entendimento, o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, aceitou, nesta quarta-feira (19/12), pedido do PT e concedeu liminar para suspender o Decreto 9.355/2018.

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Somente lei federal pode permitir a cessão de direitos sobre campos de petróleo, entendeu ministro Marco Aurélio.

Editada pelo presidente Michel Temer (MDB), a norma foi questionada pelo PT na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.942. O partido argumentou que o decreto viola os princípios da legalidade e da separação dos poderes. A Procuradoria-Geral da República manifestou apoio à concessão da liminar por entender que a cessão de direitos sobre os campos de petróleo sem licitação afeta a exigência constitucional deste procedimento para contratação de produtos e serviços por entidades estatais.

Por sua vez, a Advocacia-Geral da União sustentou que o Decreto 9.355/2018 apenas uniformizou a cessão de direitos sobre campos de petróleo, sem alterar regras previstas em outras leis.

Poderes extrapolados
Marco Aurélio concluiu que o Executivo federal extrapolou seu poder de regulamentar as Leis 9.478/1997 (Lei do Petróleo) e 12.351/2010 (Lei do Pré-Sal). O ministro apontou que o artigo 22, inciso XXVII, e o artigo 173, parágrafo 1º, inciso III, da Constituição, determinam que compete privativamente à União legislar, por intermédio do Congresso Nacional, sobre normas de licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações para sociedades de economia mista. E para o vice-decano do STF, a cessão de direitos é uma modalidade de contratação.

“Criou-se, com o ato atacado [Decreto 9.355/2018], verdadeiro microssistema licitatório ordinariamente veiculado por lei, apesar de a utilização do vocábulo ‘licitação’ ter sido substituída, sob o ângulo redacional, pela singela expressão ‘procedimento especial’. (…) A conclusão é única: o Chefe do Executivo federal disciplinou matéria constitucionalmente reservada a lei em sentido formal”, avaliou.

De acordo com o magistrado, o fato de não haver regras em leis sobre a cessão de direitos pela Petrobras não implica dar “carta branca” ao presidente da República. “Descabe cogitar de delegação legislativa em branco quando em jogo matéria sujeita à reserva legal, sob pena de permitir-se graves inovações na ordem jurídica, ao arrepio do devido processo legislativo”.

O Decreto 9.355/2018 permitiu a dispensa de licitação para as contratações de bens e serviços por consórcios operados pela Petrobras, uma vez que essas entidades estão sujeitas ao regime das empresas privadas, destacou Marco Aurélio. Contudo, ressaltou, isso viola o artigo 37, inciso XXI, da Constituição. O dispositivo reserva a lei a criação de caso de dispensa de licitação, inclusive no âmbito da Administração Pública indireta. Esse assunto foi regulado pela Lei das Estatais (Lei 13.303/2016). A norma fixa regras para sociedades de economia mista integrantes de consórcios. E são essas normas que a Petrobras deve seguir para a cessão de direitos sobre campos de petróleo, entendeu o ministro.

Além disso, o membro do Supremo reforçou a necessidade de se seguir as regras em um estado de crise.

“Na quadra vivenciada, reconhecidamente marcada por escândalos e desvios éticos nos mais diversos âmbitos da vida pública e empresarial do país, cumpre observar a envergadura das instituições pátrias, a eficácia da ordem jurídica, a independência e a harmonia entre os Poderes. Paga-se um preço por viver-se num Estado de Direito. É módico e está, por isso mesmo, ao alcance de todos: o respeito irrestrito às regras estabelecidas”.

Clique aqui para ler a íntegra da decisão.

ADI 5.942

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