Opinião

Restrições à mineração na área de fronteira devem ser flexibilizadas

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9 de dezembro de 2018, 8h10

Passada a definição do pleito eleitoral presidencial, pela qual o mercado tanto esperou, a composição da nova equipe de governo do novo presidente eleito Jair Bolsonaro começa a se desenhar.

De um lado, o governo contará com membros de pensamento econômico liberal, entre eles o futuro ministro Paulo Guedes, que cumulará no Ministério da Economia as atuais pastas da Fazenda, Planejamento, Desenvolvimento e Gestão e Indústria Comércio Exterior e Serviços.

Do outro lado, o histórico do atual presidente eleito, a escolha do vice-presidente, bem como a indicação de determinados cargos já sinalizam uma presença marcante de membros da chamada “ala militar”, cujo pensamento tende a se alinhar com uma visão mais nacionalista e estatizante do Estado.

Essas diferentes visões de mundo, muitas vezes diametralmente opostas, encontram-se destinadas a se enfrentar em diversas arenas. A questão da mineração por estrangeiros em área de fronteira provavelmente será uma delas.

Nascida de preocupações relacionadas à soberania e segurança nacional e promulgada durante o regime militar, a Lei 6.634/79 submeteu a outorga de títulos minerários localizados em faixa de fronteira (assim definida uma área interna de 150km da linha fronteiriça) à aprovação prévia do Conselho de Defesa Nacional (CDN), órgão consultivo do Presidente da República (exceto para os minerais de emprego imediato na construção civil).

A aprovação do CDN, órgão de estrutura modesta, para cada projeto individualmente, por si só já representa um entrave para o desenvolvimento de projetos minerários importantes em tais áreas, principalmente quando se observa que aproximadamente 27% do território nacional se encontra na faixa de fronteira, tal como atualmente definida. Note-se que diversos estados da federação têm hoje mais de 50% da sua área total dentro da faixa de fronteira.

Se a atual estrutura da Agência Nacional de Mineração/Ministério de Minas e Energia já resulta em longos períodos para que sejam concedidas autorizações de pesquisa e concessões de lavra (média de maturação de 15 anos para início da operação), a necessidade de assentimento pelo CDN pode duplicar tal tempo.

Ademais, a Lei 6.634/79 proíbe, em absoluto, que as atividades de mineração em faixa de fronteira sejam desenvolvidas por empresas de maioria de capital estrangeiro, não administradas por brasileiros e que não tenham mais de dois terços dos trabalhadores brasileiros.

Promulgada a Constituição Federal de 1988 e revogado o seu artigo 171 por meio de Emenda Constitucional 6/95, imaginou-se que o tratamento diferenciado a empresas brasileiras em razão da origem do seu capital não mais encontraria abrigo constitucional. Entretanto, esse acabou não sendo o entendimento da Advocacia Geral da União.

Faz-se necessário um olhar crítico sobre as razões, efeitos e conveniência da manutenção da restrição ao investimento estrangeiro em faixa de fronteira. A visão de que a faixa de fronteira estaria mais ou menos “segura” em razão da nacionalidade do capital investido se mostra um tanto quanto anacrônica diante de uma economia cada vez mais globalizada e dos princípios básicos que regem qualquer capital, seja ele nacional ou estrangeiro.

Além disso, há que serem sopesados fatores relevantes como rigidez locacional, caraterística intrínseca à mineração, o fato de que os recursos minerais são exauríveis e não-renováveis e a realidade em que vivem os estados localizados em faixa de fronteira que poderiam se beneficiar da atividade de mineração, como incentivo ao desenvolvimento socioeconômico dessas regiões.

A faixa de fronteira brasileira tem um potencial enorme para a exploração mineral, que infelizmente se encontra represado. São investimentos que poderiam gerar emprego e renda substancial para municípios, estados e União.

Não se pretende aqui defender que não há impactos negativos advindos da mineração e que a área de fronteira não é de certa forma, imprescindível para segurança nacional. Mas não se pode deixar de questionar de até que ponto a aprovação do CDN na forma requerida, bem como a proibição ao capital estrangeiro, considerando o cenário econômico atual representam, na verdade, entraves ao desenvolvimento do setor nessas áreas.

Nos termos do artigo 176 da Constituição Federal a mineração deve ser executada por brasileiros ou empresas constituídas sob as leis brasileiras e que tenha sede e administração no país. Observa-se que, do ponto de vista constitucional, não há qualquer restrição à maioria do capital estrangeiro.

Empresas constituídas no Brasil, bem como seus bens e ativos, tenham ou não capital estrangeiro, encontram-se sujeitas às regulações e jurisdição brasileira, já tendo o Estado as ferramentas necessárias para fiscalizar a sua atuação e, quando necessário, garantir a segurança nacional.

A demanda do setor para que tais regras sejam flexibilizadas não é de hoje. Atualmente, ainda tramita o Projeto de Lei do Senado 398/2014, que objetiva facilitar a operação de mineração em faixa de fronteira, eliminando também a vedação absoluta ao investimento estrangeiro.

Passados quase 40 anos da Lei 6.634/79, é preciso ponderar se a restrição absoluta a tais investimentos é realmente necessária para garantir a segurança e soberania nacional, ou se apenas cria uma reserva artificial de mercado, que vai contra o pensamento econômico liberal que, em tese, deveria nortear a atuação do próximo governo. Ao menos em parte.

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