Opinião

Sem transparência, sistema score de crédito viola direitos do consumidor

Autores

  • Marcelo Dias Freitas Oliveira

    é advogado empresarial parecerista pós-graduado em Advocacia Cível especialista em Políticas Públicas e Controle Externo e em Direito Tributário e sócio do escritório Batalha & Oliveira.

  • Marcos Batalha Júnior

    é sócio do Batalha e Oliveira Sociedade de Advogados especialista em Direito Empresarial e Direito e Processo do Trabalho e head do Departamento Jurídico das Empresas do Grupo Polynt-Reichhold na América do Sul.

8 de dezembro de 2018, 8h40

A situação é corriqueira, o consumidor, seja ele pessoa física ou jurídica, procura linhas de crédito ou serviços financeiros e acaba descobrindo que está “negativado”. Ao perquirir, percebe que essa negativação ocorreu por força de uma fraude, um erro, ou similar, e, procurando ou não a empresa que detém o cadastro dessa informação, necessita acionar o Poder Judiciário.

Segundo o Serasa, o consumidor brasileiro sofre uma tentativa de fraude a cada 16,5 segundos[1]. Em complementação, informa o SPC (Serviço de Proteção ao Crédito), que cerca de 59,4 milhões de pessoas estão “negativadas” atualmente[2].

Paralelamente, com intuito de proteger o mercado, ou as empresas e instituições de crédito, o próprio Serasa criou ferramenta para demonstrar qual consumidor tem mais chances de não pagar as suas dívidas, chamado “score”, ou placar, traduzindo-se para o português.

Tal ferramenta se mostra extremamente interessante, tanto para as pessoas, quanto para as empresas. As jurídicas facilmente veriam qual cliente poderia não efetuar o pagamento e, assim, poderiam calcular o risco de oferecer-lhe produtos e/ou serviços, aumentando seu preço, nada mais justo, inicialmente.

O consumidor, na outra mão, tem grande interesse, pois o seu comportamento demonstraria a sua saúde financeira e, portanto, faria com que o crédito ficasse mais acessível para si.

Mas há um grande problema nesta equação. Não se engane, é uma equação, da qual não temos acesso. Estranhamente, quando se acessa o site do serviço, a mais clara informação é de que se calcula “pelo relacionamento com as empresas”[3], que nada tem de claro. Ou seja, o próprio consumidor não tem acesso às informações que formam seu cadastro de bom ou mau pagador.

Em busca de soluções face ao quadro atual de fraudes e negativações que se agrava, como noticiado acima, nos casos de fraude e/ou erro praticado por terceiros, o consumidor vitimado busca o Judiciário para ter seu nome retirado da “lista negra” dos cadastros de proteção ao crédito. Ocorre que, quando retirado do cadastro da Serasa por meio de decisão judicial, principalmente em pedido liminar (antecipação de tutela) o “score” não retorna ao estado anterior, ou seja, a pontuação continua baixa, como se o consumidor estivesse em situação devedora.

Na prática, o consumidor continua com as restrições extremamente similares de quando negativado, mesmo com decisão judicial a seu favor, o que é flagrante desrespeito às normas de defesa do consumidor e afrontam as garantias constitucionais.

Fato é que, na verdade, o “score” virou uma arma contra aqueles que pretendem se autodefender, auxiliando somente empresas a não contratar com potenciais caloteiros. Entretanto, muitos desses ditos “caloteiros” nem sequer contraíram as dívidas que fizeram seu score baixar, diminuindo seu acesso ao crédito, serviços e produtos.

Veja-se que as pessoa jurídicas podem sofrer ainda mais com a diminuição do score, que pode vir a se tornar um instrumento de medição para contratações de seus serviços ou compra de seus produtos, por receio de que não consigam entregar o prometido, podendo se estender até mesmo para o exame de contratações e licitações com o Poder Público.

Com efeito, pode ocorrer a perversa consequência de, a partir de agora, as empresas utilizarem os mecanismos para baixar o “placar” do consumidor, impondo-lhe outras penalidades que não a negativação, elidindo ações e condenações por danos morais.

Infelizmente, ainda em defesa, as empresas e o próprio Serasa poderiam alegar que outras informações “sigilosas” fizeram o placar baixar. A falta de transparência do serviço é um complicador da situação, já tão delicada do consumidor brasileiro.

Uma possível alternativa seria incluir no pedido, em ação que objetiva o cancelamento de “negativações” feitas indevidamente, que o “Score” do consumidor autor da demanda retorne ao “status quo ante”, para evitar este tipo de abusividade. Assim, o fato é que os consumidores e os operadores do Direito precisam se adequar à nova realidade, buscar a defesa de seus interesses, exigindo um necessário aumento da transparência do serviço de “Placar” dessas empresas.


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