Liberdades Constitucionais

Juiz nega liminar para proibir jogo no qual Bolsonaro combate comunismo

Autor

6 de dezembro de 2018, 20h29

Os videogames merecem ser compreendidos como obra intelectual, produto da livre manifestação de pensamento de seus criadores, protegidos pela Constituição Federal no âmbito das liberdades de expressão e de criação. Com esse entendimento, o juiz André Gomes Alves, da 14ª Vara Cível de Brasília,  negou pedido de liminar para proibir a circulação do jogo eletrônico Bolsomito 2k18.

A ação civil pública com pedido de tutela de urgência foi ajuizada pelo Ministério Público do Distrito Federal cotra a desenvolvedora Valve para que ela parasse de comercializar o jogo e fornecesse dados cadastrais e financeiros do desenvolvedor do aplicativo BS Studios.

De acordo com o MP-DF, o jogo "viola o direito da personalidade Presidente eleito da República Federativa do Brasil, pelo que gera danos em ricochete a todos os brasileiros e expõe o país de forma negativa no cenário internacional". Argumenta também que o jogo "viola direito da personalidade de mulheres, LGBTs, negros, integrantes de movimentos sociais, parlamentares federais e estaduais e fomenta ódio em relação às minorias".

Ao julgar o caso, o juiz citou jurisprudência da Justiça Federal de Minas Gerais sobre proibição da comercialização de jogos. No caso apresentado, o relator havia afirmado que os jogos eletrônicos merecem a proteção do artigo 5º, inciso IX, da Constituição, "a indicar que tais são qualificadas manifestações do pensamento de seus criadores, não comportando a censura deliberada de seu conteúdo", escreveu Alves.

"Tratando-se de uma garantia essencial ao Estado Democrático, a intervenção judicial nessa dimensão jurídica deve ser sempre comedida, ressalvada a hipótese de tutela dos próprios mecanismos de liberdade de expressão", disse. "Nesse cenário o controle judicial de conteúdo é extraordinário, como também o é a revisão de tempo e  espaço de qualquer publicação intelectual, sob pena de esvaziamento da norma constitucional", concluiu.

Para André Gomes Alves, não há elementos suficientes para acolher o pedido do MP, uma vez que a perícia nos autos não ajuda a compreender o que se passa no aplicativo. De acordo com a sua decisão, o jogo tem aparência de ser uma "espécie de sátira" para "fazer troça com a política local".

"Do pouco que há nos autos, o jogo parece ser obsceno, descuidado, de extremo mau gosto e com pouca ou nenhuma agudez de argumento. Ocorre que o exagero, a distorção, a desarmonia e o ridículo são elementos próprios da comédia, geralmente da comédia ruim, como já indicava Aristóteles em sua poética", disse.

A decisão foi divulgada pelo portal Observatório do Marco Civil da Internet, do advogado Omar Kaminski, que considera o entendimento acertado na altura do processo. "A quebra de sigilo dos dados cadastrais foi negada e prevaleceu a liberdade de expressão, direito constitucional assegurado também no Marco Civil, que considera um direito fundamental na disciplina do uso da internet no Brasil, juntamente com a privacidade e a neutralidade de rede", comentou Kaminski.

Clique aqui para ler a decisão.
ACP 0735711-26.2018.8.07.0001

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!