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Fazer negócios no Brasil está melhor, mas ainda é ruim, diz Banco Mundial

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4 de dezembro de 2018, 6h19

O ambiente de negócios no Brasil melhorou, mas ainda é difícil. Pelo menos de acordo com o relatório Doing Business, publicado todo ano pelo Banco Mundial desde 2003. De acordo com a edição deste ano, divulgada no fim de outubro com previsões para 2019, o Brasil saiu da 125ª posição para a 109ª. O estudo analisa 190 países.

Embora o Brasil vá bem em alguns critérios, perde na comparação com o resto da América Latina em quase tudo o que é essencial. Por exemplo, uma empresa de São Paulo gasta 1.958 horas por ano para pagar seus impostos. Na América Latina, a média é de 330 horas. Entre os dez países mais desenvolvidos da OCDE, gastam-se em média 159 horas por ano com impostos.

Começar um negócio também não é tarefa simples. Um empresário em São Paulo ou no Rio de Janeiro (as duas cidades avaliadas pelo Banco Mundial) tem de enfrentar 11 “procedimentos burocráticos” para registrar uma empresa. Na América Latina são 8,2, em média. Na OCDE, cinco.

Não à toa são duas das áreas em que o Brasil está pior que a maioria dos demais países. Por causa das complicações tributárias, o país está em 184º no ranking geral. No quesito “começar um negócio”, está em 140º.

Mas nem tudo são trevas. O país vem melhorando, por exemplo, no cumprimento de seus contratos, segundo o relatório do Banco Mundial. No ranking da categoria, está em 48º lugar, à frente de todos os seus vizinhos e atrás apenas de economias mais desenvolvidas.

Esse é um critério complicado, segundo a explicação do Banco Mundial. Nenhum país é considerado o cenário ideal para se fazer valer contratos. Mas o custo de litígios contratuais no Brasil é de 20,7%, em média, do valor do contrato. Entre os maiores da OCDE, o custo é de 21,2%. Na média da América Latina, 31,4%.

E o Judiciário brasileiro vai bem na comparação geral. O país levou nota 12,5 nesse critério, enquanto a América Latina ficou com 8 e a OCDE, 11,5. A régua vai até 18 e mede critérios como a estrutura das cortes, a paridade de armas entre representante e representado, distribuição automática de processos e a existência de meios alternativos de resolução de conflitos.

Para dentro
O otimismo com o Judiciário brasileiro não tem muito apoio na comunidade jurídica local, aparentemente. Estudo produzido pelo Centro de Estudos em Direito Econômico e Social (Cedes) em 2016 comparou a realidade jurídica do Brasil com a do Chile e a da Argentina. No Brasil, os entrevistados, “advogados corporativos”, apontaram o Judiciário como moroso e ineficiente, além de caro e imprevisível — clique aqui e aqui para ler.

Também reclamaram da quantidade de processos. No Brasil, uma empresa do setor financeiro respondia a 5,8 mil vezes mais processos que uma na Argentina e 23,5 mil vezes que uma no Chile. No caso brasileiro, é uma ação judicial para cada 50 clientes; no Chile, é uma ação para cada 21 mil clientes. No mercado de bens de consumo, o cenário é parecido.

Entre as principais reclamações dos advogados ouvidos pela pesquisa, a banalização das ações de dano moral ajuizadas por clientes impulsionada pela “gratuidade indiscriminada da Justiça”, que estimula “aventuras jurídicas, face à ausência de qualquer consequência ao autor”, afirma o professor João Grandino Rodas, coordenador do Cedes e um dos responsáveis pela pesquisa, em sua coluna na ConJur. O levantamento foi coordenado pela professora Maria Tereza Sadek.

Outra área em que o Brasil não é competitivo é a que o Banco Mundial chama de “lidar com licença para construção”. O país está em 175º entre os 190 países analisados. Isso acontece porque uma empresa brasileira tem de dedicar 404 horas a 20 procedimentos burocráticos para conseguir uma licença, contra 199 horas para 15 procedimentos na América Latina e 153 horas em 12,7 procedimentos na medida da OCDE.

Mas há que se ressalvar que o Banco Mundial é fundamentalmente uma organização mantida pelas grandes economias do mundo. Foi criado em 1944 na mesma ocasião em que foi criado o FMI e não por acaso costuma avaliar economias nacionais de acordo com critérios estabelecidos pelos membros da OCDE.

Em novembro de 2017, por exemplo, o Banco Mundial sugeriu a privatização das universidades públicas como forma de economizar dinheiro público e “otimizar” o investimento em educação. Mas relatório da Capes de fevereiro de 2018 mostrou que 99% da pesquisa científica do Brasil é produzida por universidades públicas. A explicação, do professor Peter Schulz, secretário de Comunicação da Unesp, é que instituições públicas de ensino superior têm obrigação constitucional de investir em pesquisa, deixando as faculdades privadas para se dedicar apenas ao ensino – regra que a maioria dos países da OCDE não tem, diz ele.

Soluções
Na análise do Banco Mundial, o Brasil vai bem. O país, segundo a entidade, apresentou os maiores crescimentos da América Latina em áreas importantes para estimular o surgimento de novos negócios. Entre elas, a desburocratização tributária para micro e pequenas empresas e o incentivo a crédito mais barato. E acompanhou o movimento mundial de investimento em reformas legislativas para melhorar o ambiente interno de negócios.

São soluções apontadas também em estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI) para tornar a economia brasileira mais produtiva. Em pesquisa sobre reformas estruturais para o Brasil, Nina Biljanovska e Damiano Sandri sugerem que o Brasil dê prioridade a uma reforma bancária por meio de leis que reduzam a interferência estatal no mercado de crédito.

“Seriam reformas relativamente fáceis de legislar e que podem gerar ganhos significativos de produtividade”, conclui o estudo. “Além de reformar o setor bancário”, continua a pesquisa, “reformas devem fortalecer a proteção legal a indivíduos e suas propriedades, além de incluir medidas para reduzir a corrupção”. O estudo foi divulgado no dia 8 de outubro deste ano.

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