Liberdade de expressão

Leia o voto do ministro Marco Aurélio sobre denúncia contra Bolsonaro

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28 de agosto de 2018, 20h27

Não houve ato discriminatório, apenas manifestações protegidas pela liberdade de expressão. Esse foi um dos entendimentos do ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio ao votar pelo não recebimento da denúncia de racismo contra  o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL-RJ). O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.

Fábio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil
Falas de Bolsonaro sobre quilombolas foram infelizes, mas não criminosas, diz Marco Aurélio.

Em seu voto, o ministro Marco Aurélio, relator do inquérito, afirmou que as falas de Bolsonaro não constituem discriminação. "Consoante se depreende do discurso proferido pelo acusado em relação a comunidades quilombolas, as afirmações, embora a consubstanciar entendimento de diferenciação e até de superioridade, mostram-se desprovidas das finalidades de repressão", disse.

Marco Aurélio destacou que o discurso do presidenciável configura manifestação política que não extrapola os limites da liberdade de expressão. “A utilização da palavra arroba foi "infeliz', mas não criminosa. As declarações feitas quanto à entrada de venezuelanos no Brasil situam-se no âmbito da crítica à política adotada pelo governo", afirmou.

O ministro Marco Aurélio afirmou ainda que não há conteúdo preconceituoso ou discriminatório na afirmação do candidato, não sendo possível afirmar que a fala decorre da condição subjetiva do quilombola.

“O discurso proferido pelo acusado em relação a comunidades quilombolas, as afirmações, embora a consubstanciar entendimento de diferenciação e até de superioridade, mostram-se desprovidas da finalidade de repressão, dominação, supressão ou eliminação, razão pela qual, tendo em vista não se investirem de caráter discriminatório, são insuscetíveis a caracterizarem o crime previsto no artigo 20,

Segundo o ministro, as falas referidas na acusação de Bolsonaro estão vinculadas ao contexto de demarcação e proveito econômico das terras, sendo descabido confundir o interesse na extinção ou diminuição de reservas indígenas ou quilombolas com a supressão e eliminação dessas minorias.

“O contexto vinculado à política de demarcação de terras, além de não se inserir no conteúdo proibitivo da norma, configura manifestação política que não extrapola os limites da liberdade de expressão, garantido no artigo 5o, inciso IV, da Constituição Federal”, disse.

No voto, o ministro destacou que a utilização do vocábulo “arroba” não configura ato de desumanização dos quilombolas, no que se teria a comparação a animais, mas sim forma de expressão. “Expressão infeliz, evocada a fim de enfatizar estar um cidadão específico do grupo acima do peso tido como adequado”, destacou.

Quanto à incitação a comportamento xenofóbico, o ministro afirmou que surgiram insubsistentes as premissas lançadas pela acusação. “O delito é de perigo abstrato, cuja tipicidade há de ser materializada teleologicamente, ou seja, embora não se exija que do discurso dito incitador sobrevenha a efetiva prática de atos discriminatórios, revela-se imprescindível a aptidão material do teor das falas a desencadeá-los”, disse.

Para o ministro, as afirmações lançadas pelo denunciado situam-se no âmbito da crítica à política de imigração adotada pelo Governo, não configurando conteúdo discriminatório ou passível de incitar pensamentos e condutas xenofóbicas pelo público presente.

“O próprio acusado, na palestra, diz não fazer distinção quanto à origem estrangeira do imigrante. A crítica também se revela inserida na liberdade de manifestação de pensamento, insuscetível de configurar crime. A época é própria à veiculação de ideias. Em Direito Penal, condutas passíveis de censura no plano moral são indiferentes e insuficientes a legitimarem a incidência da norma incriminadora”, reiterou.

No voto, o ministro explicou, também, que uma vez existente o nexo de causalidade entre o que veiculado e o mandato, existe a imunidade parlamentar. “Declarações, ainda que ocorridas fora das dependências do Congresso Nacional e eventualmente sujeitas a censura moral, quando retratam o exercício do cargo eletivo, a atuação do congressista, estão cobertas pela imunidade prevista da Constituição Federal”, disse.

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