Judicialização da Saúde

TJ-SP inaugura núcleo de embasamento técnico em processos da saúde

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16 de agosto de 2018, 17h46

O Tribunal de Justiça de São Paulo formalizou, nesta quinta-feira (16/8), a instalação do Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NAT-Jus). O projeto congrega entidades ligadas à Medicina e hospitais para gerar relatórios e análises que embasem decisões judiciais quanto a casos como pedidos de medicamento ou de tratamento.

“Esse apoio é fundamental para cumprir a Constituição Federal de forma não equivocada. Ao decidir sobre um caso de saúde, o Judiciário muitas vezes invade a área do Executivo, com chance de causar dano ao erário. A presidente do STF, ministra Carmen Lúcia, demonstra preocupação com o assunto, porque as ações são contra os municípios, os estados e a União. Os convênios são fundamentais”, discursou o presidente do TJ-SP, Manoel Pereira Calças.

A princípio, o NAT-Jus atuará de forma experimental atendendo da 41ª à 45ª varas cíveis do Fórum João Mendes Junior, em São Paulo. Toda vez que juízes precisarem de subsídios técnicos para decidir, poderão recorrer ao novo núcleo, que conta com dois médicos e dois servidores e direcionarão as demandas a instituições parceiras.

Em caso de pedido de tratamento ou medicamento, o núcleo terá 72 horas. Já para nota técnica, o período é de sete dias úteis. Pareceres técnicos, usados em casos mais complexos, têm 90 dias para ficar prontos. Todo o material produzido vai integrar um banco de dados nacional, coordenado pelo CNJ e que ficará à disposição dos magistrados para futuras consultas.

“É uma área bastante sensível a todos, e o objetivo é sempre levar saúde e preservar a vida, mas com justiça. É uma dificuldade, porque não somos técnicos em medicina. O convênio traz o suporte e elementos técnicos para julgar com segurança, para que a questão seja tratada de forma responsável”, afirmou a presidente do TRF da 3ª Região, Therezinha Cazerta. A corte federal também vai usar os pareceres do NAT-Jus.

Assinaram o convênio nesta quinta-feira representantes do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen); Hospital de Transplante Euryclides de Jesus Verbini; e Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (Unesp). 

Livre convicção
Em panorama que pode ser verificado nas demais cortes brasileiras, o Tribunal de Justiça de São Paulo é profundamente afetado pela judicialização da saúde. Segundo o Anuário da Justiça São Paulo 2018, o estado gasta mais de R$ 1 bilhão por ano com condenações judiciais.

Uma das queixas dos juízes é a falta de fontes médicas e científicas para embasar suas decisões. Realidade que os obriga a ficar restritos à legislação e à jurisprudência, além da solicitação de perícias, que são caras e demoradas. 

 “O que ocorre é que temos três pensamentos: o do gestor, o do médico e o do juiz. Esses pensamentos distintos precisam dialogar. Então o CNJ se preocupou muito e instituiu esses núcleos técnicos para poder auxiliar a viabilizar o sistema de saúde. O juiz não examina a medicina, nem a gestão: examina o direito do cidadão. Mas ele precisa ter os dados”, afirmou Cláudia Longobardi Campana, juíza membro do Comitê Estadual de Saúde.

Representantes dos hospitais também comemoram o convênio. O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (Unesp) de Botucatu, por exemplo, já conta com um Núcleo de Avaliação de Tecnologias em Saúde. A produção agora será também encaminhada para o Judiciário.

“O importante nesses pareceres não é se o medicamento é efetivo ou não, porque muitas vezes ele de fato é. O importante é dizer se é efetivo, se existem medicamentos similares, com mesma eficácia. A gente não pode esquecer que saúde não tem preço, mas ela tem custo: talvez um medicamento similar com custo muito melhor tenha a mesma eficácia e possa ser mais equânime, para distribuir melhor o recurso público”, afirmou José Carlos Souza Trindade Filho, chefe de gabinete da instituição.

Coordenadora do núcleo em Botucatu, Silvana Molina explica que os pareceres seguem diretrizes metodológicas aprovadas pelo Ministério da Saúde, um formato que racionaliza a produção e diminui o viés do parecerista.

Cláudia Longobardi Campana também ressaltou a independência do magistrado em relação ao parecer para tomar a decisão. “Em nenhum momento a convicção do juiz vai ser abalada”, afirmou. “O núcleo vai dar nota técnica, se manifestando sobre quesitos que o juiz pode considerar, sobre a viabilidade. Isso nada tem a ver com a decisão que o médico tomou, de dar o medicamento ao paciente”, complementou.

O núcleo não tem relação com o NAT inaugurado e depois desmembrado pelo TJ-SP em 2015, alvo de críticas por ser composto exclusivamente por representantes das operadoras de saúde. Essa nova versão entra em funcionamento em 3 de setembro com planos de expansão gradual para as demais varas do estado.

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