Nova direção

Dura na aplicação da lei e discreta no convívio, Rosa assume o comando do TSE

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14 de agosto de 2018, 18h00

É difícil prever para que lado a ministra Rosa Weber decidirá. Mas é seguro apostar que ela será refratária a interpretações muito criativas sobre o que diz o texto da lei — especialmente se a tese restringir a aplicação de leis duras, como a Lei da Ficha Limpa. A ministra assume nesta terça-feira (14/8) a Presidência do Tribunal Superior Eleitoral e carrega com ela grande expectativa, já que comandará as primeiras eleições desde o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em agosto de 2016.

Carlos Moura/SCO/STF
Rosa Weber é conhecida por ser discreta e não dar declarações além do necessário.
Carlos Moura/SCO/STF

Rosa é conhecida por ser discreta e por não dar declarações além do necessário. Integrante do Supremo Tribunal Federal, segue à risca a ordem do Regimento Interno da corte segundo a qual um ministro só pode se pronunciar duas vezes fora de seu voto. Nisso influencia diretamente o ministro Luiz Edson Fachin.

Mas sua discrição não pode ser confundida com introversão ou timidez. “É o que diz a lei” e “esta é a minha leitura da literalidade do texto constitucional” são frases constantemente faladas pela ministra durante os julgamentos, tanto no Supremo quanto no TSE. Em julgamentos de grande expectativa, costuma se ater ao que diz a lei e nada mais. Por exemplo, quando declarou o grupo on-line de militantes políticos MBL ilegítimo para questionar o registro de candidatura de alguém — o grupo pedia que o TSE decretasse Lula inelegível mesmo antes de começar o prazo para impugnações.

E, no entanto, é considerada uma juíza dura. Gosta das teses que ampliam o alcance da Ficha Limpa. Em 2012, quando o Supremo julgou se a lei poderia se aplicar às eleições daquele ano, Rosa votou pela aplicação imediata e retroativa. Disse que a Ficha Limpa “foi gestada no ventre moralizante da sociedade” e precisava entrar em vigor logo. Em março deste ano, votou com a maioria quando o Supremo decidiu que a Ficha Limpa se aplica mesmo aos políticos eleitos antes de ela entrar em vigor.

Incompetentes e desonestos
Outra dessas “interpretações expansivas” foi a usada para autorizar a Justiça Eleitoral a interpretar condenações por improbidade administrativa pela Justiça comum para enquadrar candidatos nas causas de inelegibilidade. A Lei da Ficha Limpa, para tornar um candidato inelegível, exige que o ato de improbidade tenha causado dano ao erário e enriquecimento ilícito.

Em dezembro de 2016, Rosa acompanhou o ministro Herman Benjamin para definir que o acórdão do Tribunal de Justiça não precisa dizer expressamente que houve enriquecimento ilícito se é possível concluir que ele aconteceu a partir dos argumentos dos votos dos desembargadores. No caso concreto, o acórdão local falava em “diferença imotivada”.

O voto da ministra ajudou o TSE a rever entendimento firmado apenas meses antes, quando a corte liberou a candidatura de Paulo Maluf (PP-SP) a deputado federal. Ali, venceu a tese de que a Justiça Eleitoral não pode interpretar os pronunciamentos da Justiça comum.

Mas Rosa também ajudou a barrar tentativa do ministro Herman de reinterpretar a Lei da Ficha Limpa para dizer que, embora a lei exija dano ao erário e enriquecimento ilícito, a Justiça Eleitoral pode substituir “e” por “ou”. Ficariam inelegíveis todos os condenados por improbidade.

Para a ministra, não foi essa a intenção da lei. Ela reconhece que “uma interpretação sistemática e teleológica” da lei autoriza a flexibilização proposta por Herman. Mas afirma que a Lei da Ficha Limpa “não se destina ao administrador inepto, e sim ao desonesto”.

Igualdade de oportunidades
A ministra Rosa também acabou conhecida por transformar em realidade as cotas femininas para partidos. Ela foi relatora da consulta em que o TSE definiu que 30% do fundo eleitoral criado pela minirreforma de 2017 devem ir para candidaturas femininas. A mesma proporção vale para o tempo de rádio e TV da propaganda gratuita.

“A mudança no cenário de sub-representação feminina na política perpassa não apenas pela observância dos percentuais mínimos de candidatura por gênero, legalmente previstos, mas, sobretudo, pela imposição de mecanismos que garantam a efetividade da norma”, disse então.

Ela seguiu orientação do Supremo, com a qual concordou, de entender que o fundo eleitoral deve seguir o mesmo padrão das demais ações afirmativas. Por isso, a distribuição do dinheiro, de 5% a 15%, deveria seguir o padrão da cota para candidaturas femininas, de 30%.

Rosa agora vai ter de responder se esse padrão vale também para as candidaturas a cargos majoritários e se, nessa conta, entram as candidatas a vice e a suplente de senador. Caso Rosa responda “sim” às duas perguntas, a distribuição do dinheiro será mais fácil, já que não há registro de que as candidaturas de mulheres tenham aumentado em relação a 2014, mas o número de candidatas a vice já é pelo menos 40% superior, segundo levantamento divulgado pelo jornal Folha de S.Paulo.

Quando julgou uma ação contra as contas do DEM, condenou o partido e deu um puxão de orelha. Pelo terceiro ano consecutivo, a legenda descumpria a obrigação de destinar 5% do Fundo Partidário a candidaturas femininas. “No Brasil, as leis não são cumpridas”, disse. “É um tema tão caro a todos nós esse incentivo à participação feminina e não há aplicação.”

Fake news
A ministra também já deu contribuição importante sobre a relação entre as eleições e a divulgação de informações com o intuito de prejudicar candidaturas. O presidente que a antecedeu, Luiz Fux, colocou o TSE na proa do que chamou de combate a fake news. Em pelo menos uma decisão, a ministra colocou o pé no freio.

Em junho deste ano, o ministro Sérgio Banhos mandou o Facebook apagar postagens que, segundo ele, eram desinformações divulgadas com o intuito de prejudicar a candidatura da ex-senadora Marina Silva (Rede) à Presidência da República. No entanto, o post remetia a reportagens da Folha sobre uma delação premiada que citava a candidata.

A defesa do candidato Ciro Gomes (PDT) à Presidência, então, foi ao TSE com pedido semelhante. Rosa, relatora, negou. Segundo ela, as informações de que Ciro reclamava, embora prejudiciais, não poderiam ser consideradas falsas — não se tratava de “transgressão comunicativa”, disse.

Ciro reclamava de vídeos publicados no YouTube e de notícias divulgadas pela Folha e pelo portal UOL. O pedido era para que Rosa concedesse liminar para retirar o conteúdo do ar, mas ela entendeu que não era o caso. Segundo a ministra, esse tipo de decisão só pode ser aplicado em casos de divulgação de informação “sabidamente inverídica”, que devem “conter inverdade flagrante que não apresente controvérsia”. Para ela, “sabidamente inverídica é a informação que não demanda investigação, ou seja, deve ser perceptível de plano”.

No contexto das eleições, disse, a Justiça Eleitoral deve “preservar, o tanto quanto possível, a intangibilidade da liberdade de imprensa”. “Essa condição impõe, como consequência, que as autoridades jurisdicionais se abstenham de banalizar decisões que limitem o seu exercício, somente intervindo em casos justificados e excepcionais.”

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