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Ministro Barroso quer ampliar lista de legitimados a propor ADPF

1 de agosto de 2018, 19h33

Por Mariana Oliveira

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A proteção dos direitos fundamentais não é menos importante do que a defesa de interesses econômicos ou corporativos, afirma o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal. Por isso ele quer ampliar a lista de legitimados a ajuizar arguições de descumprimento de preceitos fundamentais para permitir que entidades de defesa de direitos fundamentais possam propor esse tipo de ação.

Carlos Moura/SCO/STF
O ministro Luís Roberto Barroso afirma que a jurisprudência do STF deve ser superada para que sejam incluídas instituições de direitos humanos entre as autorizadas para propor arguição de descumprimento de direito constitucional.
Carlos Moura/SCO/STF

Em decisão monocrática desta quarta-feira (1º/8), o ministro admitiu a tramitação de uma ADPF ajuizada pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT).

Hoje a Constituição define, no artigo 103, que podem propor ações de controle concentrado os presidentes do Senado, da Câmara e da República, o procurador-geral da República, governadores e confederações sindicais ou patronais. E a Lei da ADPF diz que quem está legitimado a ajuizar ações de controle pode ajuizar ADPFs.

Em sua decisão, Barroso propõe uma mudança na jurisprudência sobre o tema. Segundo ele, o entendimento vigente até aqui é que somente as entidades representativas de categorias econômicas ou profissionais possam ajuizar ações de controle concentrado de constitucionalidade no Supremo.

Para Barroso, apesar de a ALGBT não ser de classe profissional ou econômica, como exigido pela jurisprudência do STF, “o vínculo que une os associados da ALGBT consiste na busca pela não discriminação com base na orientação sexual ou na identidade de gênero e pelo reconhecimento da sua autonomia e identidade”. Motivo pelo qual a corte deve revisar seu entendimento e permitir que grupos vulneráveis e minoritários possam acessar o controle concentrado da constitucionalidade.

A associação não deixou de preencher os demais requisitos para propor uma ADPF no Supremo: demonstrou possuir caráter nacional e existência de pertinência temática entre os objetivos.

Mudanças de cenário
O ministro lembrou que antes da Constituição, a propositura de ações de constitucionalidades eram limitadas ao Procurador-Geral da República, cargo que fazia parte do ministério do Poder Executivo, o que "permitia que o controle concentrado fosse exercitado com extrema parcimônia e se mantivesse sob o controle do Poder Executivo".

Mesmo depois de 1988, quando o texto aumentou o rol de legitimados para esse tipo de ação, não houve a definição do conceito jurídico indeterminado “classe”, ou da expressão “âmbito nacional”. À época, alguns membros do STF foram contrários à ampliação por temerem um aumento de pedidos que poderia sobrecarregar o tribunal.

O cenário de transição democrática, afirma o ministro, também pesou na resistência da corte. "Os Ministros que proferiram as primeiras decisões à luz da Constituição de 1988 foram investidos em seus cargos durante o período autoritário, de maciça violação a direitos fundamentais."

Agora, disse Barroso, as circunstâncias mudaram ainda mais. "A Constituição está em vigor há trinta anos. Ultrapassou dois impeachments de Presidentes da República, o afastamento de parlamentares, investigações e instaurações de diversas ações penais contra altas autoridades. Não é mais o caso de se atuar com a apreensão de quem busca consolidar um regime recém-estabelecido", disse.

Sobre o medo de que a ação direta de inconstitucionalidade
se tornasse uma nova ação popular, ele afirmou  que "não há qualquer evidência de que a construção de um conceito de classe que permita a abrangência de entidades protetoras de direitos fundamentais possa gerar risco de aumento de ações, a ponto de impactar o funcionamento da Corte, ou que o exercício de tal competência possa comprometer, de algum modo, a estabilidade da Democracia brasileira”.

Direitos na prisão
Ao propor a ação, a Associação tem por objeto a Resolução Conjunta 1/2014 da Presidência da República e do Conselho de Combate à Discriminação, que estabelecem parâmetros sobre o acolhimento de pessoas LGBTs em prisões brasileiras. A entidade pretende discutir o direito de transexuais cumprirem pena no presídio que corresponda à sua percepção de gênero.

Apesar da resolução ser considerada uma conquista para a ABLGT, sua aplicação e interpretação é diversa, afirma. A autora exemplificou o pedido com uma ação proferida pelo juízo da Vara de Execução Penal do Distrito Federal no qual se indeferiu o pedido de transferência de travestis e de mulheres transexuais para presídios femininos (HC 00022531720188070015).

Clique aqui para ler a decisão.
ADPF 527