Opinião

Problemas de última hora do Imposto de Renda de Pessoa Física

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

28 de abril de 2018, 16h58

“Uma política do bem comum
teria como um de seus principais
objetivos a reconstrução da
infraestrutura da vida cívica.
Em vez de se voltar para a
redistribuição de renda no intuito
de ampliar o acesso ao consumo
privado, ela cobraria impostos aos
mais ricos para reconstruir as
instituições e os serviços públicos,
para que ricos e pobres pudessem
usufruir deles igualmente.” (Michael L. Sandel, "Justiça”, Ed. Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2011, pág.328).

Muitos brasileiros estão neste fim de semana cumprindo o seu dever cívico de preencher e enviar sua declaração de rendimentos para a Receita Federal. Há quem critique nossa mania de deixar tudo para a última hora. Isso seria evitado se servidores do fisco cumprissem seu Código de Ética.

Enquanto não cumprem, meus colegas Advogados e Contabilistas durante todo o mês de abril trabalham feito loucos para atender seus clientes, boa parte dos quais deseja milagres, mas nem sabem onde estão os documentos necessários à declaração.

Esses são os profissionais que mais sofrem com o manicômio judiciário criado pelos nossos legisladores e muito ampliado pelas autoridades fazendárias, que insistem em ignorar a Constituição Federal. Alguns ficaram tão malucos, que a abandonaram e se tornaram pequenos empresários e até mesmo psicólogos.

Pois é justamente nessa hora que aparecem as mais intrigantes perguntas.

A pergunta mais irritante e até certo ponto estranha é quando querem saber se o imposto de renda no Brasil é justo. A resposta é sempre NÃO.

Nossos leitores possuem boas oportunidades de receber informação sobre o assunto. Muitos programas jornalísticos (imprensa, rádio e TV) respondem perguntas a seu público e em muitas faculdades e sindicatos há plantões de atendimento para isso. Aliás, os servidores públicos pagos para esse trabalho estão em greve e suas informações são parciais.

Se na mídia as questões são selecionadas, existem perguntas um pouco mais complexas que merecem atenção especial. Muitas pessoas ainda pensam, com alguma razão, que consultar o fisco pode ser perigoso, pois hoje querem multar todo mundo para justificar os mirabolantes números da sonegação que afirmam existir. Vamos, nesta tarde radiosa de sábado, dar nossa opinião. Não somos donos da verdade, mas, com mais de meio século nesse ramo, já aprendemos algumas coisas importantes.

Tabela de retenção injusta e ilegal
Recentemente a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal apresentou proposta para “a criação de duas novas alíquotas para a tributação dos contribuintes mais ricos”, mencionando que há uma defasagem de 35,10% na tabela de retenção, se considerada a de 2003 para cá. Foram muito modestos os auditores. Se considerarmos a de 1996, a defasagem seria de 88,50%. Ainda assim, estaríamos sendo vítimas da voracidade feroz do ridículo leão.

Sabemos que nossos legisladores, cúmplices dos governantes, cobram tributos em excesso, como já afirmamos em nossa coluna semanal.

Pelo que está no preâmbulo e nos artigos 5º e 6º Constituição (cláusulas pétreas) qualquer cidadão tem direito a saúde, justiça, educação, segurança, moradia etc.

O salário mínimo pretende assegurar a sobrevivência digna de um trabalhador e sua família. Parece improvável que isso se alcance com menos de R$ 3.600,00 por mês. Esse deveria ser o piso da retenção.

Mas levando-se em conta os direitos constitucionais, deveria ser de R$ 6.000,00.

A tabela mais justa está no artigo 1º da lei 4862 de 29/11/1965, com 12 faixas de renda. Inicia-se com 3% e vai até 50%. Na atual o limite máximo é de 27,5%. Eis aí a inversão do princípio de Robin Hood, no século XII.

Normas que deveriam ser adotadas
Os artigo 9º, 44 e 49 da lei 4862 merecem ser lembrados:

“Art 9º O imposto de que trata o art. 79 da Lei nº 3.470, de 28 de novembro de 1958, fica reduzido para 10% (dez por cento).

Parágrafo único. A pessoa física poderá optar pela inclusão, em sua declaração anual de rendimentos dos lucros apurados na venda, em cada ano, de até 3 (três) propriedades imobiliárias, destinadas a fins residenciais, ficando dispensado, nesse caso, do impôsto referido neste artigo, desde que no respectivo instrumento de alienação conste expressamente o fato.

Art 44. Para os efeitos do art. 40 da Lei nº 4.357, de 16 de julho de 1964, equipara-se ao de bacharel em ciências contábeis o diploma de técnico em contabilidade desde que o candidato prove contar mais de 5 (cinco) anos de efetivo exercício na profissão, mediante certidão fornecida pelos Conselhos Regionais de Contabilidade, ou seja aprovado em exame de suficiência na disciplina de Revisão e Perícias Contábeis, prestado perante o Departamento Administrativo do Serviço Público.

Art 49. O art. 58 da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 58. Na emissão de ações, as importâncias recebidas dos subscritores a título de ágio não serão consideradas como rendimento tributável da pessoa jurídica, constituindo obrigatòriamente reserva específica, enquanto não forem incorporadas ao capital da sociedade.

§ 1º Não sofrerão nova tributação na declaração de pessoa física, ou na fonte, os aumentos de capital das pessoas jurídicas mediante a utilização das importâncias recebidas a título de ágio, quando realizados, nos têrmos dêste artigo, por sociedades das quais sejam as referidas pessoas físicas acionistas, bem como as novas ações distribuídas em virtude daqueles aumentos de capital.

§ 2º As quantias relativas aos aumentos de capital das pessoas jurídicas, mediante a utilização de acréscimos do valor do ativo decorrentes de aumentos de capital realizados nos têrmos dêste artigo por sociedades das quais sejam acionistas, não sofrerão nova tributação."

Todos os valores devem ser corrigidos
O governo diz que a inflação está em baixa. Mas ao corrigir pela Taxa Selic a dívida ativa e qualquer débito que o contribuinte pague após o vencimento, reconhece sua existência. Assim, todos os valores que estejam expressos em moeda na legislação, devem ser corrigidos da mesma forma.

Portanto, o chamado “ganho de capital” tem efeito confiscatório, sendo inconstitucionais os incisos II e III do artigo 39 do atual Regulamento do Imposto de Renda (decreto 3000/1999:

“Art. 39. Não entrarão no cômputo do rendimento bruto:

Alienação de Bens de Pequeno Valor

II – o ganho de capital auferido na alienação de bens e direitos de pequeno valor, cujo preço unitário de alienação, no mês em que esta se realizar, seja igual ou inferior a vinte mil reais (Lei nº 9.250, de 1995, art. 22);

Alienação do Único Imóvel

III – o ganho de capital auferido na alienação do único imóvel que o titular possua, cujo valor de alienação seja de até quatrocentos e quarenta mil reais, desde que não tenha sido realizada qualquer outra alienação nos últimos cinco anos (Lei nº 9.250, de 1995, art. 23);”

Esses R$ 400.000,00, corrigidos pelo índice INPC-IBGE para 2017 representam mais de R$ 1.800.000,00.

Não permitindo a correção dos bens que integram o patrimônio do contribuinte, legisladores e governantes infringem o artigo 150, inciso IV da Carta Magna:

“Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

IV – utilizar tributo com efeito de confisco;”

Dedução das despesas com educação
Fixar limite nesse caso é inconstitucional. Veja-se matéria de 17 de janeiro de 2017, publicada pelo nosso editor Felipe Luchete. Está anexa sentença do juiz federal Heraldo Garcia Vita, da 21ª Vara Federal Cível de São Paulo, processo 0021916-79.2015.403.6100.

O limite hoje é ridículo: menos de R$ 300,00 por mês. Quem encontrar escola nesse preço, favor informar. Só não reclamam pessoas que recebem auxílio educação pago com impostos.

Abatimento com dependentes
Ninguém sustenta dependente com menos de R$ 300.00 por mês, valor insuficiente para manter animal de estimação. Nem vale a pena discutir essa bobagem, parecida com tentativa de assassinato.

Despesas médicas

Não se sujeitam a limite, mas o fisco usa a famigerada “malha fina” para prejudicar suas vítimas. Vejam a respeito nossa coluna de 8 de abril de 2013 – clique aqui.

Acréscimo patrimonial
O fisco enviou milhares de intimações pedindo explicações. Se o contribuinte comparecer pessoalmente, sofrerá muito. Repartições fazendárias, inclusive estaduais e municipais exigem agendamento. Mas a informática deles é um desastre e o atendimento deixa a desejar.

Acréscimo patrimonial só existe ante a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica. No caso de imóvel existe uma tabela que só diminui um pouco o prejuízo.

Doação de parte do imposto
O assunto é regulado pelo artigo 87 e seguintes do regulamento. O contribuinte pode usar até 6% do imposto devido para doações a candidatos e partidos políticos, Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente, projetos culturais, incentivo a projetos culturais, audiovisuais, produção cultural em artes cênicas, livros, música, exposições, bibliotecas e museus.

sso explica a generosidade de grandes empresas, redes de TV e principalmente bancos, os verdadeiros donos do país.

Questões mal resolvidas
A regulamento do IR tem mais de 1.000 artigos. Neles há inconsistências, aplicações distorcidas e armadilhas. Uma delas admite (ilegalmente) uso de normas aplicáveis só a pessoas jurídicas para prejudicar as físicas. Assim, não deve o contribuinte atender intimações pessoalmente. Melhor contratar um advogado, possuidor de prerrogativas exclusivas da profissão.

Aproveitem o lindo pôr do sol, enquanto não vem a Justiça Tributária!

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  • é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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