Provas mantidas

Supremo recebe denúncia contra senador Aécio Neves por corrupção passiva

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17 de abril de 2018, 17h02

A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal recebeu denúncia contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG) nesta terça-feira (17/4). Ele agora é réu por corrupção passiva e obstrução de investigações sobre organização criminosa. Por quatro votos a um, o colegiado viu indícios de crimes na narração apresentada pela Procuradoria-Geral da República em inquérito instaurado em maio de 2017, com base na delação da JBS.

O senador é acusado de receber R$ 2 milhões dos executivos da J&F e de tentar influenciar a escolha de delegados responsáveis por investigações da operação "lava jato". Ele ainda responde a outros oito inquéritos em trâmite no Supremo.

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1ª Turma do Supremo entendeu que, por mais que delação tenha sido rejeitada, provas produzidas continuam válidas.
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No caso desta terça, além de Aécio, a irmã dele, Andrea Neves, Mendherson Souza Lima e Frederico Pacheco de Medeiros também se tornam réus. O colegiado foi unânime quanto à aceitação da denúncia de corrupção passiva. Na questão da obstrução de investigações, no entanto, o ministro Alexandre de Moraes, presidente da turma, ficou vencido. Para ele, a peça acusatória contém apenas intenções de embaraçamento de justiça, faltando indícios mais fortes de atos executórios.

A discussão nesta terça ficou em torno da legalidade das provas, conseguidas por meio da delação premiada de Joesley Batista, dono da JBS, hoje cancelada. Os advogados dos agora réus defenderam que a gravação da conversa de Aécio com Joesley não pode ser admitida como prova porque o empresário agiu sob orientação de Marcelo Miller, na época procurador da República, mas que deixou o Ministério Público Federal para advogar para a JBS.

O pedido da defesa era para que se aplicasse ao caso a teoria da árvore dos frutos envenenados — se a árvore, a prova, é podre, seus frutos, as acusações, também são. De acordo com o advogado de Aécio, Alberto Toron, disse que a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, já reconheceu que Marcelo Miller agiu em nome dos interesses da J&F, e não da persecução penal. Para Toron, houve "verdadeira ação controlada sem autorização" para que o senador fosse gravado.

Marcelo Leonardo, que defende Andrea Neves, reforçou o argumento. Afirmou que a denúncia se baseia apenas na delação de "uma pessoa que a este momento está absolutamente desmoralizada".

Sem nulidade
Mas o relator, ministro Marco Aurélio, negou o pedido. Para ele, o fato de ter havido orientação para o flagrante pode anular a delação, mas não as provas que resultaram dela, conforme estabelece a Lei das Organizações Criminosas.

"Diferencio flagrante preparado de flagrante esperado", completou o ministro Luiz Fux, ao acompanhar o relator. Rosa Weber também não viu como a atuação de Miller invalidaria as provas. "A participação do então procurador nas tratativas direcionadas para a colaboração premiada não produz o efeito pretendido pela defesa: não implica nulidade. Terá outros efeitos, mas não contamina elementos probatórios trazidos", argumentou. 

O suprocurador-geral da República Carlos Alberto Vilhena Coelho, que falou em nome do MPF na sessão, disse que as provas não poderiam ser rejeitadas porque Miller não poderia ser considerado um membro do MPF. "Ao prestar apoio aos colaboradores, o ex-procurador não agiu em nome e interesse do MPF, foi sempre e nitidamente ordenado por interesses particulares: o de prestar serviços advocatícios do grupo por volumosos honorários", disse. Apesar disso, continuou, não se pode dizer que não houve "voluntariedade" em assinar o acordo de delação, afirmou o procurador, para assinalar um dos requisitos da lei.

O ministro Luís Roberto Barroso votou logo depois do relator e concordou com ele. Segundo Barroso, há indícios mais fortes quanto à denúncia de corrupção passiva, como a forma do recebimento do dinheiro. "No mundo dos atos lícitos, o empréstimo desse valor é materializado o contrato mútuo, em que são estabelecidos os critérios. Aqui, não existiu contrato. Nos dias de hoje, ninguém sai por aí transportando pela estrada mochilas e malas de dinheiro a menos que haja alguma coisa de errada", disse o ministro.

Ainda que com denúncia menos robusta, se mantém relevante, de acordo com ele, o outro ponto da acusação. "Há indícios em que revela-se a interferência de indicação de delegado amigo para cada réu. Penso que claramente houve utilização de cargo de senador para a prática de crime", disse, afirmando ainda que defenderia a suspensão de mandato. Não o fez, no entanto, pelo Plenário já ter analisado a questão em 11 de outubro de 2017. "Em qualquer futurologia de barbaridades jurídicas, este fato deve constar."

Preliminares
O advogado de Mendherson Souza Lima, Antônio Veloso, insistiu pelo desmembramento da ação, que resultaria no envio dos processos dos três réus que não têm prerrogativa de foro à primeira instância. "Quando da edição da ementa na decisão do agravo regimental, se dizia em investigações. Hoje já é ação penal ou não. É outro momento", argumentou, que disse ainda que Mendherson sequer foi lembrado na sustentação oral do MPF ou na réplica da PGR, demonstrando que não tem ele relação com os fatos a serem julgados pelo Supremo. 

Nesse caso, o relator ficou vencido. Marco Aurélio invocou o princípio do juiz natural. Para ele, o caso deveria ser remetido ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Barroso, Fux, Rosa Weber e Alexandre de Moraes votaram por manter o processo no STF. De acordo com eles, as condutas de que tratam a denúncia só produziram o resultado acusado pela conexão dos atores, sendo inviável separar o caso. 

Outra alegação das defesas relativa à distribuição dos pedidos de medidas cautelares distribuídas ao relator dos processos da "lava jato", Edson Fachin. O advogado Marcelo Leonardo, defensor de Andrea Neves afirmou que a distribuição foi dirigida, em desfavor dos acusados. "Houve distribuição dirigida, que não passou pelo sistema do Supremo", reclamou. 

"As alegações de violação do juiz natural não merecem prosperar. A distribuição das cautelares deu-se por motivo de prevenção pela então considerada conexão dos fatos referentes à investigação ao chamado núcleo político da investigação da lava jato. O MPF dirigiu as petições diretamente ao gabinete do ministro Edson Fachin em abril de 2017, sem submetê-las ao protocolo, em razão da necessidade de sigilo máximo, ante a representatividade dos envolvidos e possibilidade de obstrução", observou Marco Aurélio, que foi acompanhado pelos demais.

*Notícia editada às 18h26 para acréscimo de informações.

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