Super portaria

Poder de cobrar dívida de procuradores da Fazenda gera debate na classe

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8 de abril de 2018, 14h59

A portaria da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional que passou a permitir o confisco de bem de contribuintes sem decisão judicial vem gerando polêmica. Tanto que na última quinta-feira (5/4) a própria entidade organizou uma audiência pública para debater a norma com o objetivo de aperfeiçoa-la. 

Em pauta estava o novo modelo de cobrança da Dívida Ativa da União, regulamentado pela Portaria PGFN 33/2018. Esta norma foi feita para regularizar as mudanças impostas pelas mudanças nos artigos 20B e 20E da Lei 13.606/2018.

A grande novidade legislativa é que a Fazenda pode averbar em fase de pré-execução os bens de quem tem créditos inscritos na Dívida Ativa da União. Ou seja, o Estado pode confiscar o bem de quem deve imposto mesmo sem ter uma decisão judicial que autorize.

Durante a audiência a dinâmica foi clara. Quando era um procurador no palco, a portaria era elogiada como uma ferramenta dá mais efetividade para a cobrança fiscal. No turno dos advogados, a norma era criticada por atropelar os direitos de defesa dos contribuintes.

Contraditório respeitado
O procurador Marcelino Rodrigues, presidente da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais, disse que a entidade vê com bons olhos a portaria. “Não há desrespeito ao devido processo legal e ao contraditório. Como já vimos outras vezes, pequenas alterações na forma de cobrar os créditos geram aumento de receita de bilhões. E no final das contas isso é de interessa da sociedade”.

Outro elogio veio da magistratura. O desembargador Sérgio Seiji Shimura atuou como representante do presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Manoel Pereira Calças. Calçando esses sapatos, disse o sistema de cobrança fiscal é moroso e ineficiente e que a portaria pode corrigir alguns vícios. “Esse novo formato dá o mínimo de segurança ao contribuinte de autonomia aos procuradores”, afirmou.

Fraude presumida
Do outro lado, Felipe Contreras Novaes, advogado da Fecomercio, afirmou que de saída o novo sistema cobra encargos que podem acrescentar em 20% a dívida fiscal. “O artigo 21 praticamente presume fraude contra o contribuinte”, disse, ao ressaltar que a discussão deveria ser antes da lei ser promulgada.

Uma ação direta de inconstitucionalidade já foi proposta pela Fiesp no Supremo Tribunal Federal. O advogado da entidade, Caio Cesar Braga Ruotolo, foi enfático quanto a desnecessária pressa para aprovar a lei que originou o projeto e profetizou: “Enquanto ela não for declarada inconstitucional, é constitucional”.

A advogada Rachel Delvecchio, do Tauil & Chequer Advogados, fez uma análise do evento. "Como destaque da audiência pública, nossa percepção no foco pela desjudicialização da cobrança da Dívida Ativa Federal tanto quanto possível, o que é louvável em um cenário onde se vive cada vez mais a 'judicialização da vida'. Além disso, a transmissão conjunta por diversos representantes de contribuintes sobre a importância de se garantir a renovação da certidão de regularidade fiscal antes da análise, pela PGFN, sobre o Pedido de Revisão de Dívida Inscrita e/ou da garantia oferecida antecipadamente".

Lei vestida de portaria
Uma exceção do lado dos procuradores foi com Leonardo Carneiro Cunha, presidente da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo. Ele afirmou que a diversos pontos da portaria só poderiam ter sido estipulados por lei. “Tenho medo de ter sido tomado um atalho, uma ida pelo acostamento”.

Sanções inconstitucionais
À ConJur, o tributarista Pedro Lunardelli disse que a portaria tem aspectos positivos e negativos. O advogado explicou que ela tem como princípio fazer com que os procuradores avaliem o crédito antes de tentar executá-lo. Isso irá fazer com que só se gaste recursos e energias tentando cobrar créditos que efetivamente têm chances de serem pagos.

Porém, Lunardelli alerta sobre “seríssimos problemas” da portaria. O principal é estabelecer sanções político-fiscais para os contribuintes que não estiverem regularizados. Esta atitude vai diretamente contra entendimento do Supremo Tribunal Federal, que já estabeleceu que o fisco não pode impor sanções políticas.

Da forma como está, a portaria estabelece que o contribuinte sem regularidade fiscal não pode ter empréstimo público e terá incentivo fiscal cancelado.

“A lei que dá amparo para a portaria não tem estofo para fazer essas determinações. Com certeza diversos aspectos serão considerados inconstitucionais pelo STF”, afirma Lunardelli.

*Notícia alterada às 10h45 do dia 11/4 para acréscimos.

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