Disputa ministerial

"Remuneração justa a membros do MP é investimento feito pela sociedade"

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6 de abril de 2018, 14h10

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Gianpaolo Poggio Smanio afirma que MP-SP continua protagonista de assuntos de relevância no país.
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O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Gianpaolo Poggio Smanio, está hoje afastado da cadeira para concorrer a mais um biênio no comando do Ministério Público estadual. Ele afirma que, se reconduzido, vai incrementar investimentos em tecnologia e inovação, ampliar sedes, implantar promotorias regionais especializadas em segurança pública e “consolidar o MP-SP como referência no atendimento das grandes demandas da sociedade”.

Ele disputa com outros dois candidatos o comando da instituição — também concorrem os procuradores Marcio Sérgio Christino e Valderez Deusdedit Abbud. Cerca de 2 mil promotores e procuradores de Justiça devem indicar o preferido neste sábado (7/4), mas quem definirá um nome da lista tríplice será o novo governador de SP, Márcio França (PSB), que assume o cargo nesta sexta-feira (6/4).

Todos eles foram entrevistados pela ConJur por e-mail, com as mesmas questões.

Smanio afirma que o MP-SP continua protagonista no país, participando de discussões sobre segurança, sugerindo mudanças na Lei Maria da Penha e reforçando o coro contrário à reforma da norma sobre abuso de autoridade. No combate ao crime organizado, aponta como caso de sucesso as investigações de desvios na Prefeitura de Ribeirão Preto, na gestão até 2016.

Questionado sobre o auxílio-moradia, tema controverso no país, ele disse que defende a remuneração justa dos membros do MP, pois “a instituição devolve o investimento feito pela sociedade com sua atuação efetiva”. O procurador afirma ainda ser defensor de uma mudança interna para permitir que promotores participem da cúpula da instituição e também possam disputar vaga na PGJ.

Gianpaolo Smanio é bacharel em Direito pela USP, com mestrado e doutorado em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Natural de Campinas, ingressou no MP em 1988 e atuou como primeiro-tesoureiro e primeiro-vice-presidente da Associação Paulista do Ministério Público.

É um dos vice-presidentes do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG) e integra a comissão de juristas instituída pela Câmara dos Deputados para debater propostas para a área de segurança. Foi secretário-executivo do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) e, com perfil acadêmico, é autor de 23 livros e professor do Mackenzie. Assumiu a chefia do MP-SP em 2016, apoiado pelo então procurador-geral, Márcio Elias Rosa, e com o maior número de votos dos colegas.

ConJur — Quais os principais desafios e entraves atuais do Ministério Público paulista?
Gianpaolo Smanio —
 Uma instituição como o Ministério Público, que acompanha a evolução e o desenvolvimento da sociedade, precisa estar sempre atualizada, tanto do ponto de vista estrutural quanto de ideias. Nossa missão é atuar na defesa dos direitos do cidadão e em esferas tão distintas como segurança, saúde, educação, infância e juventude, idoso, consumidor, meio ambiente, proteção da mulher, proteção às pessoas com necessidades especiais e combate à corrupção, entre outros.

Para cumprir nosso trabalho com êxito, precisamos estar sempre atentos às transformações sociais e às inovações tecnológicas. Por isso, é fundamental que o MP-SP esteja sempre na vanguarda das questões públicas e assimile uma cultura administrativa preparada para mudanças e voltada ao seu desenvolvimento constante. Esses princípios conduziram nossas decisões na primeira gestão e continuarão pautando nosso trabalho no próximo biênio.

ConJur — Quais as suas principais propostas para o próximo biênio, se eleito?
Gianpaolo Smanio —
Nosso trabalho é focado na melhoria das condições de trabalho para todos os integrantes do MP. Com o aumento de 16,5% no orçamento da instituição nos últimos dois anos, investimos em novos equipamentos, na reestruturação dos espaços físicos, na ampliação do número de sedes e em diversos procedimentos para que o MP-SP pudesse produzir mais e com melhor qualidade. A partir de diversas inovações, aumentamos nosso índice de transparência, medido pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), de 70,79% para 94,50%.

Para o próximo biênio, definimos algumas pautas que serão as bases do nosso trabalho:
1. Aumento orçamentário – manter a determinação em busca por novos recursos para ampliar nossa capacidade de investimento e saldar as dívidas com membros e servidores;
2. Defesa das prerrogativas – fortalecer o regime jurídico do MP para resguardar sua independência e o compromisso com a sociedade;
3. Protagonismo institucional – consolidar o MP-SP como referência no atendimento das grandes demandas da sociedade e no encaminhamento de soluções;
4. Tecnologia e inovação – vamos incrementar os investimentos para melhorar a mobilidade, simplificar as rotinas de trabalho e reforçar nossa transparência;
5. Planejamento e infraestrutura administrativa – ampliar as sedes, promover a reformulação e a modernização dos espaços físicos;
6. Democratização interna – efetivar a participação de promotores nos órgãos da administração superior;
7. Reorganização do MP – reduzir o gargalo existente na entrância intermediária para possibilitar maior movimentação dos colegas na carreira e enfrentar a dotação de juízes em comarcas de entrância final;
8. Combate à corrupção e ao crime organizado – fortalecer os mecanismos de prevenção e controle do patrimônio público;
9. Atuação resolutiva – incentivar os promotores e procuradores a atuar de maneira proativa nas causas e soluções das principais demandas sociais;
10. Transparência e comunicação – criar a agência de notícias do MP-SP, para disponibilizar informações institucionais aos órgãos de comunicação e à sociedade.

ConJur — Nas suas visitas pelo estado, quais as principais reclamações e demandas manifestadas por membros do MP?
Gianpaolo Smanio — A receptividade tem sido excelente em todas as cidades. De maneira geral, a opinião dos colegas é semelhante à nossa, coincide com o modelo de gestão adotado até agora e com nossas propostas para o próximo biênio. Existe uma preocupação relacionada à melhoria das condições de trabalho e o aprimoramento de ferramentas como o Sisap (Sistema de Automação de Processos). Essas demandas justificam nossos investimentos na modernização do MP-SP, na reformulação e ampliação da estrutura física e em novas tecnologias.

ConJur — O senhor avalia que o MP-SP tem perdido o protagonismo de grandes investigações?
Gianpaolo Smanio — O MP-SP é protagonista nas questões mais relevantes da sociedade brasileira e da própria categoria. Nos últimos dois anos, estivemos presentes em discussões no Congresso Nacional para produzir alterações na Lei Maria da Penha, no debate em torno do PL sobre abuso de autoridade e na reforma da Previdência, entre outros. Atuamos com sucesso no combate ao crime organizado e à corrupção, revelamos e desmontamos esquemas de fraude que levaram à prisão da ex-prefeita de Ribeirão Preto.

Também participei de audiências com o presidente da República para debater propostas anticorrupção e da comissão especial criada pelo presidente da Câmara dos Deputados para elaborar propostas para a área de segurança. Enfim, atuamos em sintonia com os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário em todos os assuntos de interesse do país e do estado de São Paulo.

ConJur — O MP-SP tem passado por vários atritos com o MPF: o segundo órgão nega acesso a provas de acordos com a Odebrecht; disputa competência para investigar danos a investidores da Petrobras e passou a investigar violência de PMs contra manifestantes, por exemplo. Por que isso tem ocorrido? Falta diálogo? Como resolver o impasse?
Gianpaolo Smanio — O relacionamento com a PGR é excelente. Trabalhamos sempre de maneira integrada, respeitando as atribuições de cada instituição e nos auxiliando mutuamente. Durante o mandato no MP-SP tive reuniões com o ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e com a atual PGR, Raquel Dodge. Divergências pontuais são comuns e saudáveis em qualquer grupo de trabalho. O importante é que as instituições atuam com o mesmo objetivo de defender a democracia e a cidadania. Nosso papel é juntar as informações pertinentes a cada processo e encaminhá-las ao Judiciário.

ConJur — Quais as mudanças legislativas mais necessárias hoje? E as propostas mais perigosas?
Gianpaolo Smanio —
 Considero como mais necessário o plano de segurança, que está sendo elaborado por um grupo de especialistas na comissão especial criada pela Câmara dos Deputados. Faço parte desse grupo e estou levando ao Congresso Nacional as propostas de São Paulo e de todos os Ministérios Públicos do país. 

Segurança é uma demanda urgente da sociedade. Para atender a essa questão com mais agilidade e eficiência, uma das nossas propostas para o próximo biênio é a criação das promotorias regionais de segurança pública no estado de São Paulo. As mais perigosas para o país são as propostas cujo objetivo principal é retaliar o Ministério Público, como o PL sobre abuso de autoridade que tramitou no Senado.

ConJur — A lei atual sobre abuso de autoridade e órgãos de fiscalização (como o CNMP) são suficientes para conter excessos?
Gianpaolo Smanio — 
A Corregedoria local é atuante, a competência originária é presente e não se omite. O CNMP soma-se a essa estrutura que já funciona bem. Questionamentos são parte do processo e dos debates políticos, mas os resultados apresentados pelo MP em todo o Brasil mostram que a instituição funciona com seriedade e competência.

ConJur — Se o senhor reassumir a PGJ, planeja sugerir mudança legislativa para permitir a candidatura de promotores ao cargo?
Gianpaolo Smanio —
Sim, sou defensor histórico dessa mudança institucional. Mas isso precisa acontecer como processo de construção democrática, com o envolvimento e o convencimento de todas as estruturas da administração do MP, sem traumas e sem rupturas. Em nossa gestão, a PGJ manteve o compromisso de trabalhar pela ampliação da participação de promotores de Justiça na direção da instituição. Três anteprojetos de lei nesse sentido estão em discussão no Órgão Especial. Essa reivindicação será alcançada de forma democrática, com diálogo e respeito a todos os órgãos.

ConJur — Qual sua avaliação sobre a concessão indiscriminada de auxílio-moradia e membros do MP e da magistratura?
Gianpaolo Smanio — O que defendo é uma remuneração justa para os membros do MP. A instituição devolve o investimento feito pela sociedade com sua atuação efetiva em favor da cidadania, da Justiça, do combate à corrupção, a todo tipo de crime e de ameaças à Constituição. Podemos citar como exemplo os recursos recuperados nos casos Maluf e Banco Santos, e a operação sevandija, que desmontou um esquema na prefeitura de Ribeirão Preto — responsável por desviar valores estimados em R$ 45 milhões, entre outros.

ConJur — É necessário medir a produtividade de promotores e procuradores de Justiça? Se sim, de que forma isso é/poderia ser feito?
Gianpaolo Smanio — A produtividade do MP não pode ser medida apenas em números. Existe um trabalho social e de fiscalização do poder público que são essenciais para o funcionamento da nossa democracia e não são contabilizadas monetariamente. De maneira bastante objetiva, podemos citar como resultado do nosso trabalho os R$ 1,7 bilhões recuperados no combate à corrupção e ao crime organizado, e os R$ 650 milhões devolvidos aos cofres públicos em ações da Promotoria de Repressão à Sonegação fiscal. Além disso, todos os promotores de Justiça produzem relatórios mensais de atividades que servem para a administração superior conhecer o volume de serviços em cada localidade. Esse recurso é usado, por exemplo, para decidir onde devem ser alocados novos recursos humanos.

ConJur — Na sua opinião, o governador deveria, em regra, escolher o primeiro colocado na votação de lista tríplice?
Gianpaolo Smanio —
A forma de escolha do PGJ é definida pela Constituição. De qualquer forma, tenho a convicção de que a classe saberá definir o candidato com as melhores propostas e mais capacidade para representar a instituição nos próximos dois anos, e que o governador vai respeitar a decisão.

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