Opinião

Exposição pública dos ministros do STF produz consequências dramáticas

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4 de abril de 2018, 10h42

Editorial duro saiu no Estado de S. Paulo de domingo (1º/4). Censura a suprema corte por extrapolar seus limites, interferindo no Congresso como se o Judiciário fosse infalível, sendo dispensado, portanto, de qualquer tipo de controle efetivo por parte dos demais Poderes. Afirma-se mais: “Pode-se atribuir parte da crise, portanto, ao desleixo do Congresso, que deixa de fazer sua parte quando permite que as vagas no Supremo sejam preenchidas por candidatos que simplesmente não satisfazem os requisitos mínimos para integrar o principal tribunal do país”.

O texto não aponta qual ou quais seriam os candidatos, hoje entronizados, despidos das qualificações de cultura jurídica diferenciada e antecedentes imaculados. Tocante às entrevistas prévias dos pretendentes ao cargo, diga-se que sempre foram meras formalidades, inexistindo, até agora, reprovação do Congresso. Não é esta, somente, a parte maior da crítica, mas, sim, a demonstração reiterada, advinda da corte, de cinturamento do Legislativo. Deveria haver, segundo o jornal, maneira qualquer de cobrar do Supremo a contensão adequada à respeitabilidade dos demais órgãos atuantes. Mas não há.

A situação atinge proporções dramáticas, pois o Supremo, monocraticamente, autoriza instauração de procedimento investigatório quanto à pessoa do presidente da República. As expressões usadas no editorial referido, quanto a inaptidão, por um ou outro, às funções na corte suprema da República, são nebulosas. O jornal não especifica. Há comentário apenas insidioso. No fim de tudo, o próprio Supremo Tribunal Federal, como um todo, pode sentir profundamente o ferimento, justificando-se, em princípio, pedido de explicações ao órgão de imprensa epigrafado. A suprema corte, coletivizada pela afirmativa indiscriminada, deixaria o dito pelo não dito, fingindo não encaçapar os incômodos doestos.

Ataques agressivos ao Supremo Tribunal Federal eram previstos sem grande dificuldade. Tudo começou na chamada transparência. Foi-se o tempo em que a corte criava barreiras robustas à visitação, encasulada, sim, majestática, sofrendo, embora, durante a ditadura, violento desgaste com a saída forçada de dois eminentíssimos jurisconsultos. A toga, entretanto, continuava sacrossanta aos olhos da população. Um ou outro acidente de percurso acontecia quando eminente ministro, por exemplo, deixava a toga sobre a tribuna, voltando às atividades de origem. Acontecia, também eventualmente, entreato curioso. Por exemplo, Francisco Rezek largou a bata, dedicou-se a outras tarefas e retornou, nomeado outra vez pela Presidência da República. Este, sabe-se, é caso único na história daquele órgão máximo de jurisdição. Não se vá mais longe. Basta dizer que este cronista alcançara 20 anos de profissão quando sustentou oralmente pela primeira vez na suprema corte. A lembrança vem meio esfumaçada. Sentado ao lado, esperando na fila, estava velho e respeitado criminalista, fazendo par, hoje, com Waldir Troncoso Peres, cujo busto está sendo perenizado no Tribunal de Justiça de São Paulo. Experiente, e muito, o advogado mencionado percebeu o nervosismo do neófito: “Você está com febre, rapaz. Também fiquei assim, na primeira vez. Isso passa”.

Passou. Presente se encontra, ainda, a obrigação de o advogado sustentar em pé, com o que o conspícuo tribunal continua humilhando a advocacia brasileira.

Finalize-se. Os ministros da suprema corte, optando pelo reforçamento do fenômeno democrático, pagam preço caro: mostram-se nos debates, sem pejo ou discrição, submetendo-se ao julgamento comunitário. Têm detratores e adeptos fiéis. Descontrolam-se às vezes, pois a santidade não os protege. Desacertos maiores já aconteceram no Senado. Basta lembrar Arnon de Mello. Atirou em desafeto, acertando outro. Matou o homem errado. Foi absolvido. No Japão, Toshikatsu Matsuoka, senador também, matou-se com um tiro na boca porque acusado de corrupção.

A exposição pública dos componentes do Supremo Tribunal Federal produz consequências dramáticas, submetendo-os à censura de diversos órgãos de imprensa. Embaixo, juízes e promotores públicos descem do pretório e vão as ruas reivindicando, cartazes nas mãos, manutenção de garantias profissionais. Note-se bem: há, ali, um enlace entre acusadores públicos e julgadores, bailado esquisito, sim. Em princípio, os praticantes deveriam manter-se, cada qual, em seu lado no salão.

No fim das contas, a chegada da transparência expõe as fraquezas e qualidade do magistrado. Atraem-se pressões muito agressivas, é certo, mas nem mesmo tais manifestações ditas comunheiras devem servir ao acorrentamento ou acovardamento dos ministros. Na verdade, a conduta de magistrados sob ameaça não foge à rotina do comportamento gregário: uns se intimidam, outros reforçam suas convicções, obstinados a tanto, embora compondo minoria. Ver-se-á.

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