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"Por favor, não nos obrigue a ligar para sua mamãe", ameaça advogado da Netflix

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22 de setembro de 2017, 7h34

Faz parte das funções dos advogados americanos enviar cartas a empresas que violam propriedade intelectual (direitos autorais, marcas comerciais, patentes) de seus clientes, antes de tomar qualquer medida judicial. Essas cartas, chamadas de “cease and desist letters” (cartas de cessão e desistência, em tradução livre), soam tão antipáticas quanto cartas de cobrança.

Afinal, elas sempre vêm carregadas com certa dose de ameaça, mesmo que a intenção seja apenas informar, não ameaçar. Há que se informar à outra parte que, se não parar de violar os direitos do cliente, medidas judiciais serão tomadas (segue descrição das consequências).

Isso não ajuda a melhorar a imagem que a população faz dos advogados. O sentimento de medo de qualquer coisa (incluindo da atuação de um advogado) é sempre maior do que o de outros sentimentos, incluindo o de gratidão pelo bem que o advogado pode fazer às pessoas.

E, algumas vezes, resultam em notícias com conteúdo negativo, mesmo que não expresso claramente. E, às vezes, isso prejudica a imagem das empresas que apenas estão defendendo seus direitos.

Mas um advogado da Netflix conseguiu converter essa “tragédia” anunciada – porque a ação era contra um bar pop-up popular, altamente simpático – em um sucesso de relações públicas para a empresa. Bryce Coughlin escreveu uma carta tão simpática, que foi repercutida, com muitas palavras elogiosas, por algumas dezenas de publicações.

Reprodução/Netflix
Em série Stranger Things, personagens transitam em realidade paralela.
Reprodução/Netflix

O conceito de bar pop-up substituiu o de bar da moda. São bares que abrem e fecham as portas com prazo marcado, para aproveitar uma situação favorável, como um grande evento ou outro qualquer. Esse conceito evoluiu para o bar pop-up temático. Exemplos são os bares pup-up de Washingon D.C., que exploram os temas “Super Mario” e “Game of Thrones” (Guerra dos Tronos). É uma forma de atrair fãs, até que a moda passe.

O bar pop-up que violou os direitos intelectuais da Netflix foi o The Upside Down (de cabeça para baixo), que explorou o tema da série “Stranger Things”, muito popular nos EUA. Além da decoração, o bar de Chicago fez sucesso com seus coquetéis temáticos, como o “Eleven’s Eggos”, baseado no personagem Eleven, e o “Demigorgon”, baseado no principal vilão da história.

Tudo, obviamente, sem permissão da Netflix, o que levou a empresa a enviar aos donos do bar a carta exigindo o fim das operações. Mas a Netflix não exigiu o fechamento imediato do bar. Permitiu que funcionasse até o fim de setembro, o prazo final para o funcionamento do bar, já estabelecido pelos próprios donos. Mas informa que, se quiserem prorrogar o prazo de existência do bar, terão de negociar a permissão.

A carta
O advogado Bryce Coughlin não usou, em sua carta, termos próprios de advogados, como “vamos mover uma ação judicial”. Usou termos próprios de professor de escola, na linha de “vou contar para sua mãe” ("I’m going to call your mom”). E aproveitou a oportunidade para “fazer uma média” com os fãs, fazendo alguma propaganda da série. A carta diz:

“Meu walkie talkie está quebrado, de forma que, em vez disso, tive de escrever essa nota. Ouvi dizer que vocês abriram um bar pop-up com o tema 'Stranger Things' na Logan Square. Veja, eu não quero que vocês pensem que eu sou um beberrão e adoro saber o quanto vocês amam o programa (Esperem até vocês verem a 2ª Temporada). Mas, a não ser que eu esteja vivendo no 'Upside Down' [uma dimensão paralela, na série], não acho que fizemos um acordo para esse pop-up. Vocês são realmente tipos criativos, de forma que estou certo de que vocês podem entender que é importante para nós exercer uma influência na forma com que nossos fãs encontram o mundo que criamos."

“Nós não vamos agir com vocês como faria o Dr. Brenner, mas pedimos que vocês, por favor (1) não estendam o funcionamento do bar pop-up além do prazo de seis meses que termina em setembro e (2) entrem em contato conosco para obter uma permissão, se vocês planejam fazer alguma coisa como essa outra vez. Avise-me, tão logo quanto possível, que vocês concordam com esse pedido.”

“Nós amamos nossos fãs mais do que qualquer coisa, mas vocês devem saber que o demigorgon nem sempre perdoa. Assim, por favor, não nos obrigue a ligar para sua mamãe”.

O gerente do bar, Jared Saul, disse ao site DNAInfo que os planos eram realmente de manter o bar aberto por mais tempo, não fosse pela objeção da Netflix. Mas não há ressentimentos contra a empresa. Os jornais, que elogiaram a Netflix, conclamaram os fãs de “Stranger Things” a visitar o bar antes que ele feche.

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