Caso Banco Santos

Título rural só pode ser usado para fomentar produção, diz Nancy Andrighi

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20 de setembro de 2017, 16h27

A lei determina que Cédula de Produto Rural (CPR) serve para fomentar a atividade no campo com a liberação de recursos para a produção agrícola, sendo proibido o desvirtuamento desta finalidade. Esse foi o entendimento da relatora, ministra Nancy Andrighi, ao manter, em julgamento na 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, acórdão que condenou o produtor rural Iboty Ioschpe a responder solidariamente com a massa falida do Banco Santos em relação à fraude na emissão de uma CPR de R$ 2,4 milhões.

O julgamento foi suspenso nesta terça-feira (19/9) após pedido de vista do ministro Villas Bôas Cueva pediu vista.

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Para Nancy, está claro que a cédula
não foi emitida como forma de proteção
ao risco de oscilação de preço no futuro.
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Para Nancy, está claro que a cédula não foi emitida como forma de proteção ao risco de oscilação de preço no futuro, mas para mobilizar recurso no mercado financeiro “em evidente prejuízo à massa falida do banco”. Ela defendeu que os autos do processo indicam que a decisão de segundo grau do Tribunal de Justiça de São Paulo se deu com base em vasto conjunto probatório. Assim como os donos do Banco Santos, Ioschpe também praticou negociações fraudulentas, disse.

O advogado Ricardo Ranzolin, que defendeu o produtor rural no caso, é enfático ao discordar da interpretação da relatora. Ele explica que, na época, Ioschpe foi procurado pelo banco para emitir uma CPR para corretora ligada à própria instituição, e assim o fez, dentro da lei. Isso, segundo ele, aconteceu antes da descoberta de que os donos do banco estavam usando papeis emitidos para dar lastro a operações financeiras que resultaram em remessas ilegais de milhões de dólares ao exterior.

A falência do Banco Santos foi decretada em 2005. 

Segundo Nancy, entretanto, cláusulas no contrato de emissão do título são flagrantemente abusivas, além de haver estipulações alheias à indispensável bilateralidade de obrigações que envolvem essa espécie de negócio jurídico.

“Nota-se que não estamos falando da ação de cobrança da CPR, mas das consequências fraudulentas da sua emissão”, frisou. Ela também afirmou que a comissão de inquérito do Banco Central que investigou a falência do Santos apontou a emissão de cédulas de produto rural como uma das principais causas para a queda do banco. “A cédula não objetivou obtenção de recurso destinada à produção, mas o contrário: com a conivência do produtor rural, foi obtida com pagamento de pequeno valor a título de aluguel para promover sangria criminosa no banco”, considerou.

Segundo Ranzolin, deu-se um sinal de 0,5% do valor total da operação na aquisição da cédula, ficando acordado o pagamento do restante para um ano depois, após a produção de 60 mil sacos de soja. “É uma operação comum no mercado. Nunca se questionou nos autos que ele é um produtor com capacidade para entregar essa quantidade”, critica.

Segundo o advogado, tratava-se de  um título não quitado que não teria motivo para circular no mercado, a não ser se fosse comercializado no preço equivalente ao 0,5% que já havia sido pago.  “Oito dias depois da operação, a corretora ligada ao banco endossou a cédula e, mesmo sem se tratar de título quitado, o banco recebeu cerca de R$ 2,4 milhões, sendo o valor imediatamente desviado para o exterior para conta operada pelos donos do Santos. Esse foi o escândalo. E quem efetuou o desvio foram os controladores do banco, meu cliente, como a maioria envolvida na emissão desses títulos, não sabia disso. O mercado não sabia”, sustenta.

Na tribuna, ele defendeu que a jurisprudência do STJ, e inclusive outro voto da mesma relatora, não impõe como requisito essencial para emissão de uma CPR o prévio pagamento do título. Nancy, porém, rebateu: “Quero dizer que esse processo envolve fraude. Isso não quer dizer que não subscrevo o que já disse no tribunal. Acontece que o caso concreto é diferenciado. Não se pode trazer para discussão processos que só envolvem emissão de cédula para um caso em que o contexto é diferente”, afirmou.

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