Opinião

Reforma trabalhista altera caracterização de grupo econômico

Autor

  • Gustavo Filipe Barbosa Garcia

    é livre-docente e doutor pela Faculdade de Direito da USP pós-doutor e especialista em Direito pela Universidad de Sevilla professor advogado e membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e membro pesquisador do IBDSCJ. Foi juiz procurador e auditor fiscal do Trabalho.

9 de setembro de 2017, 18h05

A Lei 13.467, de 13 de julho de 2017, com início de vigência depois de 120 dias de sua publicação oficial (artigo 6º), ocorrida em 14 de julho de 2017, alterou a Consolidação das Leis do Trabalho e as Leis 6.019/1974, 8.036/1990 e 8.212/1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho.

Propõe-se examinar a caracterização do grupo econômico para fins trabalhistas, tendo em vista a nova disciplina legal.

A respeito do tema, conforme o artigo 2º, parágrafo 2º, da CLT, com redação dada pela Lei 13.467/2017:

“Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego”.

No Direito do Trabalho não são exigidos requisitos formais para a configuração do grupo de empresas, que pode decorrer de situação de fato, mesmo porque incide a primazia da realidade[1].

O grupo econômico é formado por duas ou mais empresas, cada uma com personalidade jurídica própria.

Por se tratar de grupo econômico, integrado por empresas, não se admite a sua constituição exclusivamente por entidades que não exerçam atividades econômicas e empresariais.

O grupo econômico pode ser configurado de dois modos alternativos:

1) quando as empresas envolvidas estão sob a direção, controle ou administração de outra; ou

2) quando, mesmo guardando cada uma das empresas a sua autonomia, integrem grupo econômico.

A primeira hipótese refere-se ao grupo econômico hierarquizado ou sob subordinação, em que uma das empresas exerce o poder de dominação em face das demais.

Essa dominação da empresa principal é exercida sob a forma de direção, controle ou administração das empresas subordinadas.

Logo, no grupo econômico hierarquizado, a empresa principal, ao exercer o seu poder de dominação:

a) dirige as empresas subordinadas, determinando o que fazer e como elas devem exercer as suas atividades; ou

b) controla as empresas subordinadas, decidindo a respeito dos rumos a serem tomados ou das diretrizes a serem observadas por elas (como ocorre, por exemplo, quando a empresa controladora detém quantidade de ações suficiente para exercer o controle das empresas controladas); ou

c) administra as empresas subordinadas, gerindo as suas atividades e organizando o modo de atuarem no mercado.

A segunda hipótese diz respeito ao grupo econômico não hierarquizado, ou seja, em que as empresas mantêm relação horizontal, isto é, de coordenação, e não de dominação, inexistindo uma empresa principal e outras a ela subordinadas.

Entretanto, nesse caso, a mera identidade de sócios não caracteriza o grupo econômico, pois são necessários para a configuração do grupo três requisitos, quais sejam: a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes (artigo 2º, parágrafo 3º, da CLT, acrescentado pela Lei 13.467/2017).

No âmbito rural, nos termos do artigo 3º, parágrafo 2º, da Lei 5.889/1973, sempre que uma ou mais empresas, embora tendo cada uma delas personalidade jurídica própria, estiverem sob direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico ou financeiro rural, serão responsáveis solidariamente nas obrigações decorrentes da relação de emprego.

Como se pode notar, na esfera rural também se admite o grupo econômico hierarquizado, ou seja, por dominação, e o grupo econômico em que as empresas mantêm entre si relação de coordenação.

A consequência da existência de grupo econômico é que todas as empresas que o integram são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes da relação de emprego.

Isso significa que tanto a empresa principal como as empresas subordinadas (no grupo econômico hierarquizado) e todas as empresas que mantêm relação de coordenação entre si (no grupo econômico não hierarquizado) são responsáveis solidárias pelos direitos devidos aos empregados do grupo econômico e das empresas que o integrem. Trata-se, no caso, de solidariedade passiva, decorrente de expressa previsão legal.

Logo, o empregado pode exigir os créditos trabalhistas da empresa a quem prestou serviços e (ou) das demais empresas que compõem o grupo econômico. Não se observa benefício de ordem entre as empresas, pois a responsabilidade é solidária, e não subsidiária.

Discute-se, entretanto, se o grupo de empresas é o empregador único. Vale dizer, questiona-se se a relação jurídica do empregado é mantida com a empresa ou com o grupo econômico. Cabe verificar, assim, se o empregador é a empresa que integra o grupo econômico ou este. A questão envolve a temática de saber se no grupo de empresas também há solidariedade ativa, em que cada um dos credores solidários tem direito a exigir do devedor o cumprimento da prestação por inteiro (artigo 267 do Código Civil).

A redação do artigo 2º, parágrafo 2º, da CLT, decorrente da Lei 13.467/2017, parece indicar que a responsabilidade das empresas que integram o grupo econômico é apenas passiva, ao prever que elas “serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego” (destaquei).

Ainda assim, defende-se o entendimento de que essa questão deve ser analisada em cada caso concreto, tendo em vista a incidência do princípio da primazia da realidade.

Há situações em que o poder de direção é exercido pelo grupo econômico como um todo, de modo que o empregado irá prestar serviços de forma subordinada às empresas que o integram. Com isso, o tempo de serviço prestado a uma das empresas é computado (como para fins de férias, 13º salário e indenizações) quando o empregado é transferido e passa a prestar serviços para outra empresa do mesmo grupo econômico. Nesse caso, a relação de emprego existe e se desenvolve entre o empregado e o grupo econômico, o qual figura como o verdadeiro empregador. Ou seja, o contrato de trabalho é mantido entre o empregado e o grupo econômico, como empregador único.

A respeito dessa questão, segundo a Súmula 129 do TST: “Contrato de trabalho. Grupo econômico. A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário”.

Diversamente, há situações em que o empregado é juridicamente subordinado apenas a uma empresa, a qual exerce o poder diretivo e figura como o efetivo empregador. Nessa hipótese, o contrato de trabalho tem como sujeitos o empregado e a empresa. As demais empresas que integram o grupo econômico, entretanto, respondem solidariamente pelos créditos trabalhistas.

Como se pode notar, o tema do grupo de empresas no Direito do Trabalho é da maior relevância, devendo-se acompanhar a interpretação e a aplicação, pela doutrina e pela jurisprudência, das novas previsões legais.

[1] Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 352-353.

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    é livre-docente e doutor pela Faculdade de Direito da USP, pós-doutor e especialista em Direito pela Universidad de Sevilla, professor, advogado e membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e membro pesquisador do IBDSCJ. Foi juiz, procurador e auditor fiscal do Trabalho.

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