Pleito da advocacia

PL que criminaliza a violação de prerrogativas é intimidatório, diz Noronha

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5 de setembro de 2017, 20h26

O ministro João Otávio de Noronha, Corregedor Nacional de Justiça, criticou o projeto de lei que criminaliza a violação de prerrogativas de advogados e o exercício ilegal da advocacia. Ele classificou a proposta, já aprovada por unanimidade pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, de “antidemocrática”, “absurda”, “intimidatória”, “ruim” e “infame”. Segundo Noronha, o projeto é preocupante porque surge em um momento em que o Judiciário está julgando políticos e poderosos por causa de crimes de corrupção.

Se aprovado definitivamente, o projeto de lei incluirá os artigos 43-A e 43-B no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994). São definidas como violação de prerrogativas, por exemplo, impedir o exercício da profissão e o auxílio da Ordem dos Advogados do Brasil em caso de prisão. O PL fala também em dificultar o acesso de documentos judiciais e impedir a retirada dos autos de processos finalizados por até 10 dias, mesmo sem procuração. Agora, o PLS 141/2015 será analisado pela Câmara dos Deputados.

A OAB, segundo o texto, será a responsável por pedir às autoridades investigação e diligências sobre eventual violação de prerrogativas. A entidade também poderá solicitar junto ao Ministério Público sua admissão como assistente na ação e apresentar ação penal de iniciativa privada. “O juiz estará sujeito a processo porque indeferiu um pedido do advogado. O projeto é intimidatório e constrange a consciência jurídica”, afirmou Noronha, nesta terça-feira (5/9), em conversa com jornalistas para apresentar projeto do Conselho Nacional de Justiça para dar mais transparência a salários de juízes.

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Noronha sugeriu criação de conselho para julgar membros de tribunais superiores e do Supremo
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No encontro, o ministro defendeu um debate público e democrático para discutir uma reforma profunda do Judiciário brasileiro. Para ele, o modelo atual está saturado e é necessário rever, por exemplo, o papel do Supremo Tribunal Federal e das cortes superiores. Para ele, o STJ, o STF e o Tribunal Superior do Trabalho julgam hoje matérias que deveriam ser resolvidas pelas instâncias ordinárias. A consequência disso, de acordo com ele, é a existência de cortes compostas por membros “do mais alto nível”, mas congestionadas por causa de tantos processos.

Ele sugeriu ainda a criação de um conselho superior da magistratura para julgar desvios de membros dos tribunais superiores e do STF. O colegiado, segundo ele, seria composto por ministros do Supremo, do STJ e do TST. “Todos devem estar subordinados a algum controle, inclusive o STF”. Atualmente, suspeitas contra ministros do STF são de responsabilidade do próprio tribunal, da Procuradoria-Geral da República e do Congresso Nacional se o caso for de crime de responsabilidade.

Comentando sobre a proposta de criação de mandatos para membros de tribunais superiores e do STF, Noronha diz que o momento não é bom para se fazer alteração no sistema de vitaliciedade. Apesar disso, caso a regra seja alterada, ele sugere que o mandato seja de no mínimo 10 anos. “Não acredito em mandato com menos de 10 anos porque é preciso pensar na estabilidade da jurisprudência”.

Leia outros comentários do ministro do STJ e corregedor-nacional de Justiça:

Teto constitucional
"O STF precisa votar com urgência a proposta de súmula vinculante 71, sugerida pela PGR em 2014, que diz que os estados não podem conceder aos magistrados verbas remuneratórias que não constam da lei orgânica da magistratura. O tribunal precisa definir logo esse tema para que o teto constitucional de remuneração seja efetivamente respeitado."

Auxílio-moradia
"O desejável é que o magistrado receba por um tempo até que se adapte à cidade para onde foi transferido. O auxílio não deveria ser permanente, eterno, porque é temporário. Também é recomendável que se receba a verba e tenha a despesa efetiva do dinheiro. Eu, João Otávio, vendi a minha propriedade em Belo Horizonte e comprei em Brasília. Deixei de receber a verba porque não tive direito. Só recebi depois por causa da liminar do ministro Luiz Fux, do STF, permitindo esse pagamento. Os senadores e deputados, por exemplo, só recebem durante o mandato. Eles têm ainda apartamento funcional. O desejável é que o Judiciário tivesse também imóveis do tipo."

Carreira do juiz
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Dizem que o juiz ganha muito, mas estamos começando a perder mão de obra para a advocacia e grandes escritórios, onde se paga mais. É bom manter o salário da magistratura atualizado e justo para não termos um grupo de profissionais medíocres. Temos que ter juízes sérios, com a remuneração que não seja exorbitante, mas que não seja miserável. O profissional de hoje mudou, tenho muita preocupação com isso. Se não investirmos pesadamente na formação dos juízes nas escolas da magistratura teremos empregados juízes e não juiz magistrado. O jovem se forma hoje na universidade e quer fazer concurso para ter salário de R$ 5 mil. Estou numa briga enorme com os corregedores para verificar a presença de juiz na comarca. Muitos estão querendo morar peto de aeroporto, tem faltado às sextas-feiras. A ordem é: juiz na comarca de segunda à sexta. A nossa preocupação é que o profissional da magistratura seja vocacionado. Eu digo com toda a clareza. Ninguém vai ser rico sendo juiz ou ministro de tribunal superior. Mas ninguém precisa ser pobre para ser juiz."

Trabalho de corregedor
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Cada vez que converso com um juiz que é investigado, quando termina a conversa eu acho que o CNJ está sendo o órgão mais injusto do mundo. Quando eu vou para o processo vejo que nada do que ele falou é verdade ou não era exatamente do jeito que o magistrado contou. Só a verdade dos autos interessa ao juiz, não se pode condenar por presunção. Uma justiça só pode ser forte quando ela se atém à verdade dos autos e não às notícias estranhas aos autos."

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