Moral e Direito

Para TJ-SP, penas devem levar em conta opinião da sociedade sobre delito

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2 de setembro de 2017, 17h21

Ao defender mudanças na legislação criminal, o Tribunal de Justiça de São Paulo afirmou que é preciso que as condutas de maior reprovabilidade social tenham penas mais severas. A assertiva está em uma nota publicada neste sábado (2/9), assinada pelo presidente da corte, Paulo Dimas de Bellis Mascaretti.

Nela, o desembargador defende a atuação do juiz José Eugênio do Amaral Souza Neto, responsável por soltar um homem preso em flagrante após ejacular em uma desconhecida dentro de um ônibus, na capital paulista, na última terça-feira (29/8). O juiz atendeu ao pedido da Defensoria Pública, responsável pela defesa do homem, e do Ministério Público, titular da ação penal.

Neste sábado (2/9) o mesmo homem voltou a ser detido, desta vez acusado de ato obsceno também dentro de um ônibus.

Na nota, o Tribunal de Justiça de São Paulo lembra que no mesmo dia em que houve a decisão do juiz Souza Neto, a corte lançou, em parceria com outras 15 instituições, a campanha "Juntos podemos acabar com o abuso sexual nos transportes públicos", que tem como um dos objetivos debater alterações na legislação sobre o tema.

Com a repercussão que a causa ganhou, o TJ-SP afirmou que vai propor alterações na lei que tipifiquem com mais rigor atos dessa natureza. "O Poder Judiciário, em muitas das situações, fica à mercê de leis que beneficiam o autor do abuso e minimizam o sofrimento da vítima", diz a nota.

O Tribunal de Justiça de São Paulo ressalta, ainda, que a decisão de um magistrado não representa sua opinião ou o que seria seu desejo como cidadão, pois, na competência criminal, a aplicação da lei não admite analogias e integrações em desfavor do réu.

Moral e Direito
O jurista e colunista da ConJur Lenio Streck, em comentário no Facebook, lembrou que episódios como esse colocam a comunidade jurídica em teste, fazendo com que muitos atuem como torcedores.

"Ora, se moralmente não concordamos com algum fato, isso não quer dizer que podemos corrigir o Direito utilizando a moral. Moral não corrige o Direito. Moral é um dos perigosos predadores do Direito", afirmou.

Leia a nota do TJ-SP:

O Tribunal de Justiça de São Paulo, após lançar, em parceria com 15 outras instituições, no último dia 29, a campanha Juntos podemos acabar com o abuso sexual nos transportes públicos, vem a público reiterar o objetivo primeiro desse trabalho: incentivar vítimas ou os que presenciam atos dessa natureza a denunciarem, para que ocorram mudanças de mentalidade, sendo necessária alteração legislativa. Isso porque o Poder Judiciário, em muitas das situações, fica à mercê de leis que beneficiam o autor do abuso e minimizam o sofrimento da vítima.

O fato ocorrido no mesmo dia do lançamento da campanha fará com que o Tribunal de Justiça, juntamente com as instituições parceiras nessa empreitada, proponha alterações legislativas que tipifiquem com mais rigor atos dessa natureza, porque o ordenamento jurídico é vasto, repleto de normas, princípios e valores muitas vezes conflitantes que, ainda assim, devem ser conciliados pelo juiz em cada caso concreto. A decisão de um magistrado não representa sua opinião ou o que seria seu desejo como cidadão, pois na competência criminal a aplicação da lei não admite analogias e integrações em desfavor do réu.

Diante da grande repercussão na imprensa e nas redes sociais da decisão proferida em audiência de custódia realizada no dia 30, sobre a prisão de Diego Ferreira de Novais, o TJSP esclarece que o juiz do caso, após ouvir o Ministério Público, concluiu não se tratar de hipótese em que o artigo 313 do Código de Processo Penal – na forma que lhe deu a  Lei nº 12.403/11 – autorizasse a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. Essa decisão, tomada estritamente dentro dos limites da independência assegurada ao juiz como forma de garantir a liberdade pública, está sujeita ao controle recursal previsto na própria lei processual. Seus termos não impedem que o acusado seja denunciado por crime mais grave e que a prisão venha a ser decretada em momento processual subsequente, caso haja elementos para tanto.

Situações desta natureza, que afloraram e tomaram dimensões inigualáveis depois do lançamento da campanha “Juntos podemos acabar com o abuso sexual nos transportes públicos”, mostram claramente que, juntos, temos que refletir sobre os tipos penalmente relevantes, sinalizando as condutas de maior reprovabilidade social, que devam ser apenadas de forma mais severa e apontando para as alterações legislativas que se façam necessárias.

E com esse objetivo, o Tribunal de Justiça realizará, nos próximos dias, encontro para iniciar debate com representantes da sociedade civil e das instituições públicas em prol de mudança legislativa que atenda os desafios do mundo contemporâneo.

 Paulo Dimas de Bellis Mascaretti
Presidente do TJSP

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