Aproveitamento da miséria

Portaria sobre trabalho escravo é inconstitucional, diz André Ramos Tavares

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23 de outubro de 2017, 14h51

A portaria que mudou os conceitos de trabalho escravo no Brasil fica aquém da proteção ao trabalhador que a Constituição exige. Esse é o entendimento de André Ramos Tavares, professor de Direito na USP e na PUC-SP, que elaborou parecer sobre a mudança atendendo a pedido do Partido Democrático Trabalhista (PDT).

Tavares ressalta que, independentemente da restrição de liberdade do trabalhador, o principal método de exploração do trabalho em regime de “neoescravidão” consiste em extrair benefícios máximos e abusivos da condição de miséria de parte da população.

"A Constituição do Brasil impõe ao Estado a proteção de um bem jurídico 'trabalho digno'. A legislação penal criminaliza figuras relativas à escravidão, praticada em formatos 'contemporâneos' de exploração abusiva, atendendo a um chamado constitucional expresso e direto. A portaria fica aquém da proteção constitucionalmente exigida", afirma.

Tavares propõe uma pergunta: poderia um ato administrativo pretender impor um controle menos rigoroso que o próprio controle penal (que afeta, como sabemos, a liberdade) ao manejar o mesmo bem constitucional, quer dizer, a dignidade e o valor do trabalho para a sociedade brasileira? "Certamente a resposta é negativa", afirma.

Regra genérica 
Por outro lado, especialistas como o professor e advogado trabalhista Nelson Mannrich sempre criticaram o conceito genérico para definir o que é o trabalho análogo à escravidão. Por isso, Mannrich vê como positiva a iniciativa do Ministério do Trabalho.

Em sua opinião, a portaria avançou bastante ao abandonar concepções vagas e subjetivas. Ele lembra que o novo conceito segue a linha do Projeto de Lei 3.842/2012, que está parado no Câmara dos Deputados desde 2015.

No Supremo 
Já correm no Supremo Tribunal Federal duas ações questionando as mudanças das normas para definição de trabalho escravo. Uma é da Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL) e a outra do partido Rede, que alega que o ato normativo foi editado para inviabilizar a política de combate ao trabalho escravo no país.

A União Geral dos Trabalhadores (UGT) já pediu para participar do julgamento da ação da CNPL como amiga da corte (amicus curiae). 

Clique aqui para ler o parecer. 

*Texto alterado às 16h05 do dia 23/10 para acréscimo de informações. 

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